Postagens por Marcador

sábado, 21 de junho de 2025

Wilma Mello Cavalheiro (Pelotas/RS)

1
A festa estava prontinha,
mas tudo às vezes malogra;
pra surpresa da noivinha,
o noivo fugiu com a sogra!
2
"A luz purifica o escuro":
revela a casta Tereza;
e quando o "momento" é impuro,
faz tudo de luz acesa.
3
A minha infância distante
se reflete no meu filho,
por isso, no meu semblante,
o entardecer tem mais brilho.
4
A moça chora num brado
e o padre diz, em voz lenta:
- Pra lavar tanto pecado,
só um tanque de água benta!
5
Anoitece... a paz perdura
no aconchego do galpão;
galopa solta a ternura
em volta do chimarrão.
6
Ante a indecisa galinha,
diz o galo, convincente:
- Não troca o velho, joinha,
por um frango incompetente.
7
Brinquedos da minha infância
que foram meu universo,
hoje, rompendo distância,
são saudades do meu verso.
8
- Chega de versos, de prosa,
diz a garota ao noivinho,
pois tem coisa mais gostosa
pra se fazer no escurinho!
9
Chuta, menina, com jeito,
teu jogo é alegre... peralta.
Depois, apara no peito
porque peito não te falta!
10
Depois do vento ferino,
que me arrancou dos teus braços,
o barco do meu destino
navega roto... em pedaços…
11
Do teu palco iluminado,
ris de mim, sem ter ideia,
do quanto eu sofro calado
na penumbra da plateia.
12
Dulcifico meu sorriso,
louca euforia me invade,
quando chegas, sem aviso,
rompendo o nó da saudade.
13
Ela diz em tom brejeiro:
- Cumpro bem o meu papel.
Quero o amor do marinheiro
e o soldo do coronel.
14
Enfrento o vento malvado,
molhado de chuva e frio,
pois para estar ao teu lado
venço qualquer desafio.
15
Entre dúvidas e medos,
que a distância ocasionou,
fechada, dança em meus dedos
a carta que hoje chegou.
16
Esquece esta vida andeja,
vem tomar um chimarrão,
é cedo, a manhã boceja,
na longa esteira do chão!
17
Esqueço lei, preconceito,
e algum tabu superado,
só para ter o direito
de amanhecer ao teu lado.
18
Esqueço os dias tristonhos,
vou à luta, sem tardança;
ao porto azul dos meus sonhos
regressa a nau da esperança.
19
Esta saudade que é tua
dança no meu pensamento,
como a chuva lá na rua
sob a regência do vento.
20
Este sol fraco, inconstante,
trará luzes de outros sóis,
para amanhã, mais radiante,
te acordar nos meus lençóis.
21
Eu acredito e confesso
que a mais cruel das partidas
é a partida sem regresso,
para o rumo de outras vidas.
22
Feito de fugas e medo,
de regressos e partidas,
nosso amor, mesmo em segredo,
dá mais vida às nossas vidas.
23
Foi preciso muito brio,
quase a coragem faltou,
para enfrentar o vazio
que a tua ausência deixou.
24
Há sempre um rastro de luz
protegendo a caminhada
de quem abriga e conduz
a infância desamparada.
25
Hoje, no ocaso da vida,
tem sabor de eternidade
esta ternura incontida
que floriu na mocidade.
26
Meu chimarrão, tu retratas
meu pampa com perfeição:
por dentro, o verde das matas,
por fora, a cor do meu chão.
27
Minha alma se fortalece,
levo melhor minha cruz,
quando através de uma prece
acho o caminho da luz.
28
“Minuano”, teus intentos
comprovam, em forte estampa,
que és o corsário dos ventos
na imensidão do meu pampa.
29
Na bomba, o beijo deixado,
na entrega, o tremor da mão,
e o meu amor, tão guardado
se traiu no chimarrão!
30
Na lareira um fogo brando
e, entre doses de licor,
nossos corpos desenhando
todas as formas de amor.
31
Não há lei irrevogável,
se amparada na razão;
toda sentença é mutável,
se a luz rasga a escuridão.
32
Não precisa o trovador
ir à lua, ver estrelas,
na noite, em rimas de amor,
ele é capaz de entendê-las.
33
Nesta noite rosicler
a lua, tão feminina,
tem o charme da mulher
e a pureza da menina.
34
O barco da minha infância
cruzou mares... velejou...
chorou saudades... distância...
mas nunca mais regressou.
35
O destino arma ciladas
que só coragem e a fé,
conseguirão, se irmanadas,
manter-nos vivos, de pé.
36
Outrora, a paz benfazeja,
noites de amor sob a lua,
hoje, na noite viceja
o crime, solto, na rua.
37
Peço ao sol, em oração,
e à lua, em seu branco véu,
que não falte um chimarrão
na grande estância do céu!
38
Por tantos textos errados,
somos hoje, sem favor,
dois atores fracassados
no grande palco do amor.
39
Quando a paixão se agiganta,
tão feiticeira e felina,
cala-se a voz na garganta
e só o prazer nos domina.
40
Quando em serena cadência,
na dança que o amor requer,
desnudo sem resistência
meus anseios de mulher.
41
Quando minha alma mentiu,
ao jurar que te esqueceu,
o meu orgulho aplaudiu
a grande atriz que fui eu.
42
Quanto tempo posto fora,
numa procura sem jeito,
sem ver as luzes da aurora,
porque era noite em meu peito.
43
- Que fazias no escurinho,
junto àquele rapagão?
- Não penses mal, papaizinho,
fazia meditação!
44
Quero o torpor, a leveza,
que o licor me propicia,
para acalmar a tristeza
da minha vida vazia.
45
Regressa... tudo te espera...
os teus discos, teu licor,
e uma doce primavera
desfeita em beijos de amor.
46
Roda, criança querida,
teu carrinho... teu pião...
Enquanto a roda da vida
não levar tua ilusão…
47
São brinquedos fulgurantes,
que brilham soltos...ao léu...
as estrelas cintilantes
que a lua joga no céu.
48
Se a Lei Divina se encerra
na paz, no amor, no perdão,
por que rolam pela terra
crianças que não têm pão?
49
Se é feitiço ou se é magia,
não sei, nem quero saber,
só sei que virou mania
este amor que é o meu viver.
50
Sem coragem, dividida,
entre a paixão e a razão,
minha alma é folha caída,
num vendaval de emoção.
51
Sem guerrilha... sem debate...
rola o manto da cobiça,
quando a espada do combate
verga-se à Lei da Justiça!
52
Sem temor e sem ressábios
hoje enfrento o mar fremente,
para no cais dos teus lábios
aportar meu beijo ardente.
53
Se queres manter-te em pé,
ter mais luz em tua andança,
acende o incenso da fé
no castiçal da esperança.
54
Se sofro não perco a calma,
a fé meus passos conduz;
a força que guardo na alma
se renova e acende a luz.
55
Se te esqueceste do texto,
se foste péssimo ator,
não busques nenhum pretexto
para os teus erros no amor.
56
Seu chute ninguém olvida,
atleta bom e sarado,
por isso a “gata” o convida
pra jogar no seu gramado…
57
Tem tanta preguiça, tanta,
e modos tão indolentes,
que quando almoça, não janta,
pra não dar trabalho aos dentes.
58
Tentei fugir de mansinho,
devagar romper os laços;
desisti, qualquer caminho
sempre me leva aos teus braços.
59
Teus cílios, negra cortina,
escondem dos olhos meus,
toda a magia divina
que dança nos olhos teus.
60
Tu és, amor, a alegria,
o meu vinho, o meu licor,
ao raiar de um novo dia,
abrindo as portas do amor.
61
Voltei feliz para vê-la.
Frustração. Não me quis mais.
Somente os olhos da estrela
me viram chorar no cais.

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Elbea Priscila de Souza e Silva (Piquete/SP, 1942 – 2023, Caçapava/SP)

1
A banda toca um dobrado
e a multidão se eletriza,
mas mantém o olhar colado
no “shortinho” da baliza !
2
Adeus! A sentença triste
minha vida desalinha,
e a saudade, dedo em riste,
vem dizer que a culpa é minha!
3
A distância bem que tenta
retardar minha chegada,
e parece que acrescenta
mais quilômetros na estrada...
4
A escolha do par perfeito,
farei nesta... em qualquer vida,
ao resgatar de outro peito,
minha metade perdida!
5
Agitado ou não, valente,
radiante, às vezes sombrio,
tens por meta o sonho à frente:
- Coração... teu nome é rio!
6
A Humanidade atracada
ao seu orgulho e avareza
agride o meio e degrada
sua própria natureza...
7
Alegre, meiga, estouvada,
em constante movimento,
tão inconseqüente e amada,
a brisa é a infância do vento...
8
Ao redor deles se agrupam
o mundo, risos e achaques,
porém... relógios se ocupam
apenas de tique-taques...
9
Aquela amiga, a saudade,
ah, quantas vezes descarto,
pois, cheia de intimidade,
só quer dormir no meu quarto...
10
Aquele tomate ousado
diz à alface bem amada:
- Nosso encontro está marcado
às seis... na mesma salada!
11
Às suas falas dispense
o respeito mais profundo,
que o silêncio nos pertence
mas a palavra é do mundo.
12
A tristeza, sim, me arrasa...
expulsá-la de que jeito,
se é marca de ferro em brasa,
indelével no meu peito!?
13
Bem aqui na banda esquerda
do meu peito há uma inscrição:
"Cansado de tanta perda
foi-se embora um coração".
14
Com as palavras esgrima,
me estoca e brada: Touché!...
Astúcia é a matéria-prima
da qual emergiu você!
15
Com extrema sutileza,
vertendo mel nas amarras,
a sedução faz a presa
se aprazer em suas garras.
16
De assombração tenho medo,
da morte, então, quem não tem?
Vou te contar um segredo:
quando era vivo... eu, também!
17
Dispenso festas, mantenho
com elas pouca amizade,
pois quem tem o amor que eu tenho
só pensa em privacidade...
18
Do peito tranco o portão
por sofrer e em desagravo
penduro nele a inscrição:
- Cuidado! Coração bravo!!!
19
Ela passa se sorrio,
se choro vai, nem me vê:
desconfio que este rio
tem muito a ver com você!
20
Embora dela me esquive,
a saudade, tão ladina,
tem manhas de detetive
e me espreita em cada esquina...
21
Em meu peito, sorrateira,
a saudade se detém,
fincando a sua bandeira,
já que a terra é de ninguém !
22
É o trabalho um aliado
no caminho para a luz:
encare-o como um cajado,
jamais o transforme em cruz!
23
- Esta pimenta é de cheiro?
Pergunta com azedume,
e o garçom fala ligeiro:
- Se não é... boto perfume!!!
24
– Eu era um burro, doutor,
que pesadelo medonho!
E o médico, gozador:
- Tens certeza que era um sonho?...
25
Frio, cruel e arrogante,
O mal na discórdia aposta
e o mundo beligerante
Está "como o diabo gosta".
26
Gostosa! – diz, leviano.
- Ela é minha filha Ester…
- Perdão, é a outra, que engano!
- A outra é minha mulher.
27
- Homem que é homem dá duro,
procure um trabalho, diacho!
- Procurar até procuro,
mas, graças a Deus… não acho!
28
Já tive família e nome,
posição...luxo também,
mas, de mim fiz um pronome
indefinido: ninguém!
29
– Meu genro prêmios conquista
em nossa Feira Anual.
- Ele é grande pecuarista?
Não... um perfeito animal!
30
Minha angústia, aprisionada,
num grito agudo se solta
e um eco, só por caçoada,
traz-me esse grito de volta!
31
Minhas mágoas disciplino
com a força da oração:
tenho um médico divino
que jamais deixa o plantão!
32
Moleque feliz, sadio,
nadando em tua água fria,
acreditei, velho rio,
que eu nunca envelheceria...
33
Morre a sogra do Herculano,
e o mesmo, por prevenção,
para que não haja engano,
põe cadeado no caixão!
34
Na mais franca intimidade,
desta volúpia à mercê,
perdemos a identidade:
quem sou eu, quem é você?
35
Não me bastasse a poeirenta
e dura trilha que faço,
vem a saudade e acrescenta
mais um fardo em meu cansaço...
36
No meu Natal é rotina
deixar tudo no "capricho":
no peito faço faxina
e jogo as mágoas no lixo!
37
Nossa antiga foto presa
na moldura sem verniz
hoje é a única certeza
de que um dia eu fui feliz!
38
Numa visita diária
a um coração em carência,
a saudade solidária
tenta suprir tua ausência...
39
Num desabafo insincero,
chorando em teu ombro amigo,
digo coisas que não quero,
quero coisas que não digo…
40
Num minúsculo vestido,
samba e a galera faz festa
e Cornélio, seu marido
“dança” enquanto coça a testa!
41
O beijo da chuva fria
no chão, ressequido e ardente,
num milagre, propicia
o germinar da semente.
42
Pertenço a um tempo em que flores,       
donas de próprias linguagens,
apadrinhavam amores
com perfumadas mensagens...
43
Prantos, lamentos, gemidos...
ecos que vêm até nós...
são gritos dos excluídos
de que a dor é porta-voz!
44
Quando a natureza, insano,
degrada a seu bel-prazer,
o chamado ser humano
humano deixa de ser!
45
Quando a saudade aguilhoa
meu peito, a voz da razão
diz, baixinho: - Vai... perdoa...
Mas a altivez grita: -Não!
46
Quem criou a Natureza,
obra-prima de arte pura,
deixou que a mão da beleza
lhe forjasse a assinatura...
47
Quem da criança o labor
explora pela ganância
mistura amargo sabor
ao doce sabor da infância…
48
- Quem de astúcia é mais capaz?
Num concurso singular,
vence a mulher, Satanás
fica em segundo lugar!
49
Quem tem o regaço terno
de uma amizade sincera,
consegue sentir no inverno
ternuras de primavera…
50
Quero agarrar o presente,
mantê-lo à força, ao meu lado...
E ele se esvai... De repente,
presente já é passado!
51
Se a guerra foi declarada
e é poderoso o oponente,
faze da astúcia aliada,
que astúcia é força da mente!
52
Só tu, penumbra que invades
meu quarto, sem cerimônia,
sabes de quantas saudades
se compõe a minha insônia!
53
Tão comuns em nossa esfera
que aos tropeços se conduz,
trevas são salas de espera
onde aguardamos a luz!
54
Teu prato esfria na mesa,
olho o relógio, me apresso;
na varanda a luz acesa
espera, em vão, teu regresso...
55
Uma caixa de surpresas,
baú de contradições,
meu coração tem certezas
cercadas de indecisões
56
Vencido... todo humilhado,
meu coração se destranca
e entregando-se à saudade,
desfralda a bandeira branca!
57
Xeque-mate, sem saída,
me entrego, todo humildade,
se o tabuleiro é o da vida,
se o contendor é a saudade...

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Maria Madalena Ferreira (Magé/RJ)

1
A gente não dá valor...
E a vida cobra, em verdade,
por um instante de amor,
muitas horas de saudade...
2
Algumas gotas de orvalho
e o sol da manhã radiosa
fazem de um simples cascalho
uma pedra preciosa!
3
A mais bela profecia
- o mistério mais profundo! -
se cumpriu, quando Maria
deu à luz a "luz do mundo"!
4
Após a noite chuvosa,
chora, triste, o Beija-flor,
ao contemplar sua Rosa...
–  despetalada e sem cor!...
5
Cansado, triste e carente,
meu coração é um mendigo,
buscando uma alma indulgente
que lhe conceda um abrigo.
6
- Cartas de amor! - andorinhas
riscando os céus, em vai-vem...
cruzando as saudades minhas
com as saudades de alguém!...
7
Chega ao fim a serenata...
E a Lua, mesmo cansada,
recolhe as taças de prata
das mesas da madrugada!
8
Da morte? - Sim, tenho medo,
mas temo mais pelo além...
- Esse insondável segredo
não revelado a ninguém!...
9
Da seiva da "Flor do Lácio',
tirou Caminha o matiz
com que escreveu o prefácio
da História deste País!
10
Desculpe, Amor, se me atraso
na volta ao lar... Acontece
que eu me perco, olhando o ocaso,
enquanto o sol adormece!!!
11
Desde já, meu filho, aprenda
que a vida é feito as aranhas:
disfarça em teias de renda
seus intentos e artimanhas!
12
Deus, em matéria singela,
ou seja: o barro do chão,
deu forma e vida à mais bela
das obras da Criação!
13
Dos amores infelizes
não guardo mágoa. - Em verdade,
se deixaram cicatrizes...
também deixaram saudade.
14
Eis o que resta, hoje em dia,
do que eu fui (triste verdade...):
um "fusquinha" de alegria
e um 'caminhão" de saudade!
15
Embora o dia me açoite
com seus barulhos brutais,
lá no silêncio da noite...
a solidão bate mais!...
16
É tanto, tanto, o chamego
da Maria Salomé,
que endoidece qualquer "nego"
com um simples cafuné!
17
Eu não quero despedidas
no momento em que eu morrer!
- Vou em busca de outras vidas,
onde eu possa renascer!
18
Faço tudo direitinho!
Sou “faxineira” das boas”
- Até – sobrando um tempinho...
– “limpo” as “pratas” das patroas…
19
Falassem os arvoredos...
e o mundo iria corar
ante os milhões de segredos
que o vento deixa, ao passar!...
20
Felicidade! – Eu te estudo
e não decifro a “charada”:
– Uns – infelizes com tudo…
– Outros – felizes sem nada!!!
21
Fito o espelho... e o que constato?
– Rugas... tristezas... enfim,
o verdadeiro retrato
do que a vida fez de mim!
22
Fugindo ao rol das “coroas”,
finjo ser “balzaquiana”...
- “MÁSCARA”... ENGANA AS PESSOAS!
Só que... o Tempo... não engana…
23
Moro sozinha... porém,
solidão não é castigo!
-- Se não falo com ninguém...
meu rádio fala comigo.
24
Mostrar-me um rumo é louvável,
porém, meus passos não tolhas!
Eu quero ser responsável
por minhas próprias escolhas!
25
Na caneca... o bom "verdinho"!
Caldo verde... sobre a mesa!
Pão à farta! E o meu ranchinho
é uma "casa portuguesa"!
26
Não fales mal da ilusão!
Mede as palavras que dizes!
- As ilusões são o pão
das almas dos infelizes!
27
Meu barco – velho e sem lastro –
 não sobe nem mansos rios!...
- Murcha a vela... entorta o mastro...
 (E eu, na rede... “a ver navios”...)
28
Na rebeldia da infância
não basta agir com rigor:
precisa haver tolerância,
bom exemplo e... muito amor!
29
Nenhum ourives se atreve
a imitar - nem de arremedo -
as filigranas de neve
dos galhos nus do arvoredo!
30
No meu peito há tanta mágoa
que não seria surpresa
se uma simples gota d’água
eclodisse em correnteza!
31
Olho a praça abandonada
e me ponho a imaginar
uma saudade sentada
sem ter com quem conversar!...
32
Para este amor, que a nós dois
tomou – assim de improviso –,
não houve “antes” nem “depois”;
houve o “momento preciso”!
33
Perco a conta das pegadas
dos sonhos que vão passando,
nas eternas madrugadas
em que fico te esperando!
34
Portugal, jamais me escondas
qualquer chance – por mais rara –
de eu tentar rasgar as ondas
deste mar que nos separa!
35
Portugal, reafirma os laços
do teu amor mais profundo:
toma o Brasil em teus braços
e mostra teu filho ao mundo!
36
Pressenti, desde o começo,
- insensatez de te amar -
que esta saudade era o preço
que eu teria que pagar!...
37
Qual foi a forma?! – Define-a!,
pois, mesmo sem transfusão,
pela corrente sanguínea
entraste em meu coração!
38
Quem quiser ter livre acesso
ao peito de um sonhador
basta trazer como ingresso
um bilhetinho de amor!
39
Que eu sou pobre... ninguém diz!
Passo alegre os dias meus!
- Não tenho “bens de raiz”,
mas... tenho as bênçãos de Deus!!!
40
Quisera ser um mecenas,
Mas, sem dinheiro ou valia,
serei "defensor", apenas,
dos Amantes da Poesia!…
41
Razão de minha altivez;
meu orgulho mais profundo:
- Ouvir falar "português"
nos quatro cantos do mundo!
42
Recebo a idade com calma,
para evitar que o desgosto
ponha rugas em minha alma,
como já pôs no meu rosto!
43
São: - minha face enrugada
e a cabeça embranquecida,
máscara velha... – surrada
pelas “folias’ da Vida!…
44
Sou culpada, sim senhor!
Porém não peço perdão!
Porque... pecados de amor...
não merecem punição!
45
Sou "mãe branca" de uma vida,
por um milagre, entre mil,
da Senhora Aparecida!
- A Mãe Preta do Brasil!
46
Sou seresteiro perfeito!
Pois, até meu coração
se amoldou, dentro do peito,
à forma de um violão!
47
Sou um "bígamo" perfeito!
Mas... não me inveje! Em verdade,
são parceiras no meu leito
a solidão e a saudade!...
48
Triste e só, no meu fadário,
amargando a tua ausência,
sou um banco solitário
numa praça em decadência!...
49
Vives só me provocando!
Depois eu é que me enrasco!
- Vou mesmo acabar virando...
“espeto” do teu churrasco!
50
Volta o barco... e o pescador
- após a noite em vigília -
exibe, em gestos de amor,
o sustento da família!
51
Zune o vento – na janela...
Zumbe a abelha – no jardim...
Zarpa a nau – rumo à procela...
- Zomba a saudade... de mim!...

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Ercy Maria Marques de Faria (Bauru/SP)

1
A apatia que hoje vês
neste semblante cansado,
é vestígio dos “porquês”
sem respostas do passado!!!
2
Agora o peso da idade
me obriga a encurtar meus passos
e acelera os da saudade
para acolher-me em seus braços...
3
A insônia que vai além
das horas da madrugada,
por teimosia mantém
minha saudade acordada...
4
Amo tanto esse meu povo
e essa terra onde nasci,
que, se acaso eu nascer de novo,
peço a Deus que seja aqui
5
A onda toda vez quando
na praia vem deslizar,
parece o pranto rolando
dos olhos tristes do mar…
6
Apesar desta certeza
de que somos tão iguais,
alma gêmea, que tristeza,
chegaste tarde demais!...
7
Aplausos a quem merece!…
Um brinde à velha esperança
que no peito permanece
mesmo enquanto a idade avança!
8
A saudade vem e liga
o velho rádio do peito
e ao som de uma valsa antiga
chora o meu sonho desfeito...
9
As dúvidas elimina
e repara os erros seus,
quem crê na ajuda Divina
e ouve o conselho de Deus!
10
A varanda, hoje
de algazarra das crianças,
se transforma, dia a dia,
num castelo de lembranças!...
11
Barrei a tua saída
após ouvir-te afirmar
que entraste na minha vida
na certeza de ficar!
12
Bendito é aquele que crê
e com fé, sempre maior,
dobra os joelhos e vê
adiante um mundo melhor!!!
13
Bilhetes... esta quadrinha...
te escrevi, andando ao léu...
- Como enviar-te, mãezinha?
Não há Correios no Céu!...
14
Busquei tanto a liberdade
e ao transpor milhões de abrolhos,
encerrei minha ansiedade
na prisão desses teus olhos
15
Cada manhã que desponta
encantando a mocidade,
por certo é mais uma conta
no rosário da saudade…
16
Cigano, da tua andança
por esse mundo sem fim,
traz-me um pouco da esperança
que a sorte roubou de mim…
17
Com muito humor, o gabola
insiste numa cantada,
mas hoje tanto se enrola,
que apenas canta... e mais nada!!!
18
Da varanda eu olho a rua
que eu dizia que era “minha”...
E a saudade continua
a brincar de “amarelinha”…
19
Desta emoção incontida
não faço nenhum alarde...
E culpo demais a vida,
por te encontrar muito tarde.
20
Diria a bruxa atual:
- Espelho, vê se não manca
e me responda, afinal,
quem tem a pior carranca?
21
Dizendo "adeus", foste embora,
levando em tua bagagem
meu coração, que até agora
não regressou da viagem!
22
Diz o caipira ao chegar
“de fogo”, à mulher que o xinga:
-“Houve engano lá no bar...
eu disse “Mé”... deram “pinga”!!!
23
Dois olhares se cruzaram...
Duas almas se entenderam...
Mas, em silêncio ocultaram
o sonho que não viveram...
24
Dosando amor e energia
ele cumpriu seu destino;
Oh meu pai! como eu queria
ser novamente um menino!
25
Em ligeiras pinceladas
eis um retrato da vida:
– Às vezes, certas chegadas
têm sabor de despedida…
26
É na sua deficiência,
que o cego, na escuridão,
acende a luz da paciência
no altar do seu coração…
27
É nos instantes de dor,
ante o Teu porte sereno,
que um homem "Grande", Senhor,
se torna um homem "pequeno"!...
28
Essa lágrima sentida
que nos teus olhos aflora,
é uma prova enternecida
de que um homem também chora!
29
Esse teu jeito tão mudo...
esse modo de encarar...
A gente, às vezes, diz tudo
na carícia de um olhar!
30
Eu e você .. que tristeza!
Duas perdidas metades...
Dois corações com certeza,
chorando as mesmas saudades!…
31
Lembrança.. retorno ousado
que se faz às escondidas,
pelos porões do passado,
buscando ilusões perdidas!
32
Lembrando o que tu dizias
do amor que tinhas por mim,
eu vi, enquanto partias,
quanto o infinito... tem fim!
33
Minhas velhas esperanças...
Os sonhos da mocidade...
Que imensidão de lembranças
no meu baú de saudade…
34
Na conquista deste amor
me empenhei... não fui covarde!...
E só não fui vencedor
porque cheguei muito tarde!
35
Na Medicina e Poesia
foste um Mestre!!! As nossas palmas
pelo trato, a cada dia,
do ser humano... e das almas!!!
(Homenagem a Miguel Russowsky)
36
Não há luxo... desde a porta...
o amor lá dentro é tão belo!...
Nele sou rei... pouco importa...
O meu lar... é o meu castelo!!!
37
Não te desvies da estrada,
buscando atalhos bisonhos.
A vida não vale nada,
se sufocares teus sonhos…
38
Na pressa descontrolada
da multidão,há, contudo,
rostos que não dizem nada...
e rostos que dizem tudo!!!
39
Nesta troca de homenagem
com outro País amigo,
meu Samba segue viagem
e o Tango...fica comigo!!!
40
No jogo da vida é assim:
tem encrenca e desacato,
e, quando ele chega ao fim,
a mãe de alguém paga o pato…
41
Ó estrela-do-mar, faz presa,
e sepulta em mar profundo,
por favor, toda tristeza
e desamor que há no mundo!...
42
Olho a tapera habitada
e em minha fé me concentro:
– Feita de restos de “nada”!...
e quanta paz tem por dentro!!!
43
O meu coração se agita,
Toda a alegria extravasa,
quando ao chegar, o amor grita,
querendo entrar:-“Ó de casa???”
44
O meu mundo é mais bonito!
Tem dois sóis com muito brilho:
– Um, no seio do infinito…
– Outro, em meu seio: Meu filho!…
45
O mundo será melhor
e atingirá rumos novos,
quando se fizer maior
o entendimento entre os povos…
46
Por ser "soft" e "pra frente",
o Carneiro, aborrecido,
por um nome diferente
ficou muito conhecido!…
47
Por teu feitiço ou magia,
mesmo sabendo quem és,
troquei a minha alforria
e fui escravo a teus pés…
48
Qualquer onda eu desafio,
sou surfista destemida
neste imenso mar bravio
que nós chamamos de Vida!
49
Quando a ilusão o convida,
não apresse a caminhada...
certos atalhos na vida
não nos conduzem a nada…
50
Quando a luz se faz escassa,
não renego os sonhos meus;
abraço a treva que passa
e pego na mão de Deus…
51
Quase um dilúvio parece,
a forte chuva lá fora,
unida ao pranto que desce
nesta saudade que chora!
52
Que as chaves da educação
possam abrir com sucesso,
as portas desta nação
para a cultura e o progresso!
53
Que o dom da Sabedoria,
dádiva do Criador,
seja usado a cada dia,
cobrindo o Mundo de amor!
54
Quis vingar “olho por olho”
e também “dente por dente”...
Mas como, se era caolho
e a sogra só tinha um dente?!
55
Renúncia – uma ponte estreita,
onde, das extremidades,
pode-se ouvir, sempre à espreita,
chorando duas saudades!...
56
Saudade é um velho barquinho
que vence o tempo e a distância
e recolhe, no caminho,
os pedacinhos da infância …
57
Se é mentira ou se é verdade,
pouco importa, não reclamo…
A maior felicidade
é ouvir-te dizer: – “Eu te amo!”
58
Seja ao índio assegurado,
como bem manda a razão,
o seu direito sagrado
por um pedaço de chão!
59
Sempre que a lágrima desce
e insiste em molhar-me a face,
eu uso o lenço da prece...
E é como se eu não chorasse…
60
Toda união é perfeita,
se, congregando emoções,
além das mãos que ela estreita,
une também corações...
61
Uma flor descolorida...
Um bilhete amarelado...
São capítulos da vida
nos registros do passado...
62
Velha ponte do caminho
nossa história é parecida:
- Suportamos de mansinho
tantas pisadas na vida!!!
63
Velho mar, o seu bailado
das ondas nos vem provar,
que nada existe de errado
às vezes em recuar…

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...