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sábado, 13 de março de 2021

Alvitres do Professor Renato Alves - 6 -


25.

Na mesma linha camoniana do “fogo que arde e não se vê  /  ferida que dói e não se sente”, eis,  na trova ao lado,  uma bela aplicação da  “antítese”,  figura de linguagem tão adequada para definir a natureza contraditória do amor.
 
O amor é sorriso... ou pranto.
O amor é nuvem... ou sol.
O amor é lágrima... ou canto.
O amor é treva... ou farol.
Maria Thereza Cavalheiro

 
26.

Além do escorreito português dos verbos em 2ª pessoa do plural (rireis, saberdes, pousais), esta trova apresenta um interessante emprego da palavra “verde” com carga semântica dupla: verde = cor e verde = jovem, em oposição aos maduros olhos do poeta.
    
Rireis talvez ao saberdes
como eu me sinto em apuros
se pousais os olhos verdes
nos meus olhos já maduros!
José Fabiano

 
27.
Na literatura, o efêmero, o passageiro, o transitório sempre esteve representado pela metáfora do “nome escrito na areia” que o mar vem e logo apaga. Veja que belo aproveitamento desta imagem na trova ao lado.
    
Malgrado a graça suprema
que o nosso olhar incendeia,
a juventude é poema
que a vida escreve na areia.
Élen de Novaes Félix
 
28.

Está no jogo de palavras, na inteligente manipulação das variantes semânticas do vocábulo “pena”, a beleza do achado desta primorosa trova do mestre  Izo Goldman.
 
Que pena que as minhas penas
não te causem pena alguma,
e, sem pena, eu seja apenas,
entre as penas... só mais uma!
Izo Goldman

29.

A maioria dos concursos exige a menção da palavra-tema na trova. Muito já se discutiu sobre tal obrigatoriedade e as opiniões são bem divergentes. Mas veja  aqui uma bela trova, premiada em Nova Friburgo em que  a ausência da palavra não prejudicou em nada a ideia de “Presença”, o tema proposto
    
O livro, o cigarro ao lado,
o rádio, o abajur antigo...
Eu deixo tudo arrumado
fingindo que estás comigo...
Maria Tereza Noronha

domingo, 7 de março de 2021

Cantinho do Assis (Pausa para Reflexão)


Os concursos têm sido muito úteis ao trovismo. Há mais de quarenta anos eles vêm prestando bons serviços: estimulam a intensa produção de trovas; contribuem para o fortalecimento da amizade entre trovadores de todo o Brasil e de Portugal; possibilitam a revelação de novos valores. No entanto, é preciso ter cuidado a fim de que os efeitos não se invertam.

Não se pode permitir de forma alguma o estabelecimento de um divisor de águas – de um lado os ganhadores habituais de concursos e de outro os que jamais (ou raramente) são premiados. Mesmo porque concurso não é a única maneira (e talvez nem seja a mais eficiente) de avaliar poesia ou lá o que seja. Há muitos trovadores que dificilmente aparecem no pódio dos premiados, mas que têm rico acervo de boas trovas. Além disso, a principal característica do trovismo foi sempre a fraternidade, razão pela qual não tem sentido colocar em primeiro plano a disputa de prêmios.

Agrada saber que fulano ou sicrana já receberam dezenas ou centenas de troféus, porém muito mais agrada saber que fulano e sicrana amam a trova tanto quanto nós amamos, e que tal afinidade nos faz irmãos. Se, portanto, algum dia notarmos que os concursos começam a prejudicar a fraternidade, talvez seja melhor acabar com eles, criando novas formas de motivação.

Recordemos as sábias palavras do mestre Reinaldo Moreira de Aguiar: "A trova é um modo franciscano de ser poeta.” Parece que isso resume tudo.

Fonte:
Editorial do Trovia de fevereiro / 2002

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...