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quinta-feira, 27 de abril de 2017

Colbert Rangel Coelho (1925 - 1975)


1
Aquela criatura louca,
que é razão do meu desejo,
vive tanto em minha boca,
mas nunca me deu um beijo.
2
A todo mundo insinuas
que não mando no que é teu,
mas tenho saudades tuas
e o dono delas sou eu!
3
A vida, às vezes, resume
contrastes deste teor:
só se morre de ciúme
quando se vive de amor.
4
Bebe-se tanto, meu chapa,
aguardente no Brasil,
que até mesmo o nosso mapa
tem a forma de um funil.
5
Beijei-te e, ardendo em desejos,
disseste (que hipocrisia!)
que era o teu primeiro beijo.
Só se foi naquele dia...
6
Bendigo minhas conquistas,
quando percebo depois
a inveja dos moralistas,
que falam mal de nós dois.
7
Berra a esposa, o filho berra!
E, apesar desse berreiro,
não troco meu lar em guerra
pela paz do mundo inteiro!
8
Chegaste toda elegante,
quando eu pensava ir-me embora.
“Vou ficar mais um instante.”
... E fiquei até agora.
9
Com tanto gringo passeias
e, de fato, nem supões
que a liga das tuas meias
virou Liga das Nações!
10
Corrigindo um velho erro,
aos brotos tecendo loas,
nem mesmo no meu enterro
quero saber de “coroas”.
11
Dando-me tanto trabalho,
sem me poupar um segundo,
o meu filho, esse pirralho,
é o melhor patrão do mundo.
12
Desce o viúvo ao jazigo
e uma voz familiar
repete o sermão antigo:
- Isto é hora de chegar?
13
D. Juan que, volta e meia,
mulher casada procura,
tem um pé na casa alheia
e outro pé na sepultura.
14
Doutor - peço que me ajude
nesta dúvida inclemente:
Se isto é Casa de Saúde,
como pode ter doente?!...
15
Em meio a tanta desdita,
tanta gente estende as mãos,
que a gente nem acredita
que somos todos irmãos.
16
Enquanto o sino da igreja
dobra, tristonho, a finados,
a liberdade rasteja
por entre arames farpados.
17
Entre o homem e a natureza,
há contrastes sem medida:
o pôr-do-sol – que beleza!
Que tristeza o pôr-da-vida...
18
Éramos dois indecisos
que vagávamos sem pressa...
Um sorriso... dois sorrisos...
E uma história que começa!…
19
Eu bendigo a luz da lua
e os passarinhos nos ramos:
brilha mais em nossa rua...
cantam mais quando passamos…
20
Eu não sei se o sol desponta
ou se ainda é madrugada...
Quando estou por tua conta
não dou conta de mais nada.
21
Eu quis, na cara ou coroa,
saber se és minha ou do Zé.
Fiquei na mesma. Esta é boa!
- O níquel caiu em pé!
22
Eu, sentado na beirada,
ela, junto da janela.
- Graças às curvas da estrada,
vou sentindo as curvas dela!
23
Eu sigo na minha rota
vencido, cheio de dor.
Causaram minha derrota
minhas vitórias de amor.
24
Eu sinto, vagando à toa
nos derradeiros degraus,
que a vida seria boa,
se os homens não fossem maus!
25
Meu coração, por despeito,
depois que te conheci,
vai batendo no meu peito,
enquanto apanha de ti.
26
Nas vitrinas de brinquedos,
o meu pranto tem lavado
as marcas de cinco dedos
de um menino abandonado.
27
Neste Salão elegante,
para ficar diferente,
mesmo a mulher inconstante
manda fazer... permanente...
28
Noivado, no mundo inteiro,
foi sempre assim entre os dois:
o noivo espera primeiro;
a noiva espera depois...
29
O amor seria mais brando
e o mundo seria lindo,
se Deus me visse chorando,
se Deus te visse sorrindo.
30
O cego sente desgosto
de não ver o que Deus pinta,
porque nunca viu o rosto
de uma criança faminta.
31
O confessor da capela
foi confessar-se depois...
Os pecados que ouviu dela
eram todos deles dois.
32
O mais doce dos abrigos,
minha casa é uma beleza:
aberta para os amigos,
fechada para a tristeza!
33
Passei a crer nos amigos
e em bondade ainda creio,
depois que vi dois mendigos
repartindo um pão ao meio.
34
"Perca a esperança", - disseste.
Cegamente, obedeci.
E tu mesma me trouxeste
a esperança que perdi.
35
Percebo, na trajetória
de um romance inconsequente,
que, às vezes, a mesma história
tem o enredo diferente.
36
Põe nos olhos uma venda,
se algo queres me ocultar,
porque embora não te entenda,
sempre entendo o teu olhar.
37
Por diabruras e um rebento,
naquele eterno noivado,
a festa do casamento
foi depois do batizado.
38
Por mais longe que passares,
há de ver o mundo inteiro,
que o mais falso dos olhares
é o teu olhar verdadeiro.
39
Por minha vida sem graça
passaste tão de repente...
Muitas vezes a que passa
é que fica eternamente!
40
Quando a gente perde o tino,
como perdi de repente,
uma mulher sem destino
faz o destino da gente.
41
Senta-te aqui ao meu lado,
ó anjo do meu desejo!
Santifica o meu pecado
com a pureza do teu beijo.
42
Se, ao confessar-se, a Teresa
disse tintim por tintim,
o vigário, com certeza,
sentiu inveja de mim.
43
Se de fato não me amaste,
de tudo o que me fizeste,
o beijo que me negaste
foi o melhor que me deste.
44
Se esta existência me cansa
é porque, na minha dor,
não me sobra em esperança
o que te falta em amor.
45
Se pudesse calcular
o transtorno que me deu,
Deus que fez o teu olhar
não teria feito o meu.
46
Sinto a maior das revoltas,
talvez você não presuma,
ao ver o mundo dar voltas
e nós não darmos nenhuma.
47
Sonho – punhado de areia
que a gente aperta na mão,
sem perceber a mão cheia
vazando de grão em grão.
48
Surpreendido de mansinho,
sem a fibra dos heróis,
naqueles lençóis de linho
eu me vi em maus lençóis.
49
Tão grande é minha saudade,
que voltarias, não minto,
se sentisses a metade
desta saudade que sinto.
50
Tenho dó do linguarudo
que, por gosto ou por maldade,
de nós dois já disse tudo
- e não sabe da metade.
51
Tenho tudo aqui na terra,
e tenho, apenas, o que?
- uma casinha na serra,
minha viola e você!
52
Vejo, após anos passados
de uma história que morreu,
que, entre sorrisos trocados,
acabei perdendo o meu.
53
Velho, nas minhas andanças,
já calejado de insultos,
tenho pena das crianças
num mundo cheio de adultos.
54
Vingativo, por maldade,
rogo-te pragas, meu bem:
que sintas esta saudade
multiplicada por cem.
55
Vivendo nos estribilhos
das colunas sociais,
muitos pais dão a seus filhos
noção de filhos sem pais.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Aloísio Alves da Costa (Umari/CE, 1935 - 2010, Fortaleza/CE)

1
Agora que tu partiste
e a saudade está chegando,
desculpe o meu verso triste,
minha musa está chorando!...
2
Amarela é a cor mais bela
e é fácil de soletrar:
- é bastante unir com "Ela",
as letras do verbo "Amar"!...
3
Ante o medo que angustia,
talvez a grande mensagem,
fosse a que Deus nos diria ...
- Coragem, filho, coragem ...
4
Ao se pesar, a Constança,
que é gorda e não pesa pouco,
comenta, sobre a balança:
- Esse ponteiro está louco!...
5
Aos sonhos nunca se apegue,
que eles se vão de repente...
e sonho que se persegue
é o que mais foge da gente!...
6
As musas, não posso vê-las...
vivem num mundo distante...
mas posso além das estrelas
ouvi-las a todo instante
7
Bonança e paz sobre a terra
é tudo que peço a Deus,
para que as armas de guerra
virem peças de museus.
8
Buscando instantes felizes
pelos caminhos tristonhos,
foram tantos meus deslizes
que tropecei nos meus sonhos!...
9
Castigado desde cedo,
tanto apanhei do destino,
que nunca tendo um brinquedo,
nem lembro que fui menino.
10
Chegada bem mais feliz,
bem mais alegre, suponho,
é a de quem faz o que eu fiz:
- cheguei trazendo o meu sonho!...
11
Creio em Deus, unicamente
não ando rezando à-toa...
- tenho uma alma que sente
e um coração que perdoa!
12
Dando na alma embevecida,
laços de amor e amizade,
fui, na jangada da vida
um pescador de saudade!...
13
Dentro da noite inclemente
De frio intenso e garoa,
o agrado de um beijo quente
garante que a noite é boa!...
14
Dói a saudade em meu peito
e eu canto, não silencio...
Quanto mais pedras no leito
mais alto o canto do rio!
15
Dos ideais o maior
é viver, lutar, e, após,
deixar um mundo melhor
aos que vêm depois de nós.
16
Dos jogos o mais nocivo,
até hoje, em meu caminho,
tem sido o rebolativo
da mulher do meu vizinho!
17
Enquanto o Zé Liberato
sai em busca da gatinha,
pela janela entra um gato
que janta a sua sardinha!
18
Era uma vez uma dona
que andava a pé, sem ninguém;
e tanto pediu carona,
que ganhou carro também! ...
19
Esta saudade infinita
do amor que a gente viveu,
é a mensagem mais bonita
que o meu passado viveu!...
20
Feito de essência divina
e fluidos de eternidade,
um grande amor não termina,
mas se transforma em saudade!
21
Feliz é quem, pela vida,
envelhecendo sem fugas,
alegre e de fronte erguida,
zomba do espelho e das rugas.
22
Já diz o velho ditado,
que lenha verde e viúva,
com paciência e cuidado
pegam fogo até na chuva!...
23
Mensagem que se recebe
e nos enche de quimeras,
é aquela em que se percebe
que as palavras são sinceras
24
Meu sonho em mágoa desfeito,
tão grande fez meu desgosto,
que não cabendo em meu peito
se fez pranto no meu rosto!...
25
Minha irmã conta as topadas,
que já deu pelos caminhos,
pelas pedras arrancadas...
- E eu conto, pelos sobrinhos!...
26
- Na carta que ela me fez,
nas reticências sem fim,
a incerteza de um "talvez"
dá-me esperanças de um "sim"...
27
Na farmácia, ao ver o busto
da balconista, hesitante,
em vez de xarope, o Augusto
pediu mesmo foi calmante!...
28
Na linha desta saudade,
que é tua e também é minha,
nós somos nós de verdade
nas duas pontas da linha!
29
Na luta contra a cobiça,
mantendo na alma a esperança,
meu desejo de justiça
é maior que o de vingança!
30
Não busques falso tesouro
se bens duráveis garimpas...
Nem sempre as mãos que têm ouro
e pedras raras, são limpas...
31
Não condeno o revoltado
que defende seu direito...
– revolta de injustiçado,
merece todo respeito!
32
Não preciso, mãe, no templo,
rezar tanto de joelhos...
- Minha luz é o teu exemplo,
minha prece os teus conselhos!...
33
Na tua ausência, ao meu lado
em cima da nossa mesa,
o candelabro apagado
mantém a saudade acesa.
34
Na tumba da falecida,
o esposo ciumento, à porta,
murmura: - Volta, querida.
E ela responde: - Nem morta!
35
Nem ouro, nem pedra rara,
nada que vem do garimpo,
vale um fio de água clara
no leito de um rio limpo...
36
No momento doce e breve
que a inspiração nos invade,
dos versos que a gente escreve,
a musa escreve metade!...
37
Num armário sem conforto,
do qual não guardo saudade,
guardado, me fiz de morto,
pra não morrer de verdade...
38
O meu cansaço é tamanho,
que, na mesma caminhada,
eu quase não acompanho
minha sombra na calçada!
39
Partiste, chorando tanto,
no teu rumo oposto ao meu,
que, solidário ao teu pranto,
o céu fechou-se... e choveu...
40
Partiste, cigana errante,
e de uma noite em teu leito,
restou-me um sonho distante
e esta saudade em meu peito!...
41
Peço a Deus que o tempo corra,
e corra a nosso favor,
para que este amor não morra
antes que eu morra de amor!…
42
- Pelas ruas da lembrança,
nas cirandas das calçadas,
saudade, sonho e esperança,
brincam juntos de mãos dadas!
43
Pelos motivo da guerra
e pela falta de pão,
não culpo quem fez a terra,
mas quem fez a divisão.
44
Quando a lei se faz omissa
e a impunidade se solta,
do silêncio da justiça
surgem gritos de revolta...
45
Quando a noiva viu a cama
que a esperava pra dormir,
mandou sustar o proclama
e desistiu do faquir!...
46
Quando a vida se complica
nas horas de solidão,
amigo é aquele que fica
depois que os outros se vão.
47
Quando a voz de um pai ressoa
e a de um filho abaixa o tom,
conselho é semente boa,
plantada em terreno bom!
48
Quando instantes de carinho,
trazem saudades depois,
lembrança é viver sozinho
de um sonho vivido a dois.
49
Quando não vens, na ansiedade
desses momentos perversos,
vem a musa da saudade
pôr mais saudade em meus versos.
50
- Quando o amor se faz lembrança
e a solidão nos invade,
ou se vive de esperança
ou se morre de saudade...
51
Quem não aprende em menino,
tem que aprender na velhice,
que ter pai pobre é destino,
mas sogro pobre é burrice!…
52
Sambando quase pelada,
no 'No bloco do vai sem medo",
Paulete foi mais cantada
que o refrão do samba enredo..
53
Sempre que a vida me nega
segurança nos meus passos,
minha esperança me pega
e me carrega nos braços!
54
Sendo orador de alta escala,
é tão profundo e erudito,
que a gente, quando ele fala,
só entende o... "tenho dito".
55
Se o telefone falasse
o que nele a gente fala,
duvido que alguém deixasse
o telefone na sala!...
56
Somente um bem acontece
quando a gente cai doente:
doente é que se conhece
quem é amigo da gente.
57
Sou de onde o vento trabalha,
lá onde a brisa fagueira
embala de leve a palha,
beijando a carnaubeira! ...
58
Teimei no amor... e errei tanto
na teimosia de amar,
que eu mesmo não sei mais quanto
errei tentando acertar!...
59
Teu olhar... a voz macia...
tuas promessas de amor...
- são notas de fantasia
na pauta da minha dor.
60
Vencendo o tempo e a distância,
mensagens da mocidade,
sempre nos trazem da infância,
saudade ... muita saudade...
61
Volátil, discreta e doce,
no instante certo, presente,
a musa é como se fosse
o anjo-da-guarda da gente…

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...