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sábado, 26 de outubro de 2024

Jerson Brito (Trovas em Preto & Branco)

 

 1
Aquela vila afastada,
nas brenhas do interior,
parece pobre... Que nada!
É manancial de amor…
2
A riqueza genuína
da tapera ou da mansão
vem do amor que predomina,
não se mede com cifrão.
3
Digo com sinceridade:
É melhor pro coração,
o amargor duma verdade,
do que o mel d’uma ilusão.
4
Esperança assim defino:
rio que corre veloz,
banhando nosso destino
sem chegar à sua foz.
5
- Fui bronze! Missão cumprida!
Disse o sujeito aos parentes,
sem mencionar que a corrida
só tinha três concorrentes.
6
Na crise, eu me fortaleço,
não perco os sonhos de vista;
toda queda é o recomeço
para quem crê na conquista!
7
Na luta, quando entendido
o recado de um tropeço,
qualquer espinho vencido
escreve um fim... e um começo!
8
O fracasso e a vitória
fazem parte do existir.
É normal na trajetória,
de vez em quando cair.
9
Qual cometa incandescente,
a paixão passa e se vai,
deixa no peito da gente
uma dor que nunca sai.
10
Se o fracasso tem dois lados,
vale muito a decisão;
chorar os planos frustrados
ou bendizer a lição.
11
Sobre opiniões e crenças,
a sensatez nos diria
que o respeito às diferenças
tece teias de harmonia.
12
Um cenário me devasta:
a garrafa de champanhe,
duas taças, vela gasta
e ninguém que me acompanhe.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

AS TROVAS DO JERSON EM PRETO E BRANCO
por José Feldman

As trovas de Jerson Brito capturam sentimentos profundos e reflexões sobre a vida, amor, e superação. Cada uma traz uma mensagem única, misturando lirismo e sabedoria.

AS TROVAS UMA A UMA

1. Aquela vila afastada
A abertura destaca um contraste entre a aparência de pobreza e a riqueza emocional. A "vila" simboliza lugares simples que guardam profundos sentimentos de amor. A ideia central é que o amor é um recurso valioso, superando bens materiais.

2. A riqueza genuína
Aqui, Jerson reforça que a verdadeira riqueza é medida pelo amor que existe nas relações e ambientes, não por riquezas financeiras. A "tapera" e a "mansão" são metáforas de que o valor está nas conexões humanas.

3. Digo com sinceridade
Essa trova aborda a importância da verdade, mesmo que dolorosa. O "amargor duma verdade" é preferível ao "mel d’uma ilusão", sugerindo que enfrentar a realidade, por mais difícil que seja, é mais saudável para o coração.

4. Esperança assim defino
A esperança é comparada a um rio que flui, simbolizando continuidade e movimento. A metáfora indica que, embora a esperança seja vital, ela pode nunca chegar a um destino final, refletindo a natureza incerta da vida.

5. Fui bronze! Missão cumprida!
Esta trova utiliza o humor para criticar a superficialidade das conquistas. O sujeito se vangloria de um prêmio em uma competição com poucos concorrentes, destacando a ironia de se sentir realizado em um contexto de baixa competição.

6. Na crise, eu me fortaleço
A resiliência em tempos de crise é o foco aqui. A queda é vista como uma oportunidade de recomeço, e a ideia de que "quem crê na conquista" pode transformar dificuldades em oportunidades é inspiradora.

7. Na luta, quando entendido
Jerson enfatiza a aprendizagem que vem dos tropeços. Cada dificuldade superada traz um novo começo, sugerindo que a vida é um ciclo de desafios e renovações, onde cada fim é uma oportunidade.

8. O fracasso e a vitória
Essa trova reflete a dualidade da vida. Tanto o fracasso quanto a vitória fazem parte da existência humana. A normalidade de cair é uma parte essencial do percurso, ressaltando a importância da experiência.

9. Qual cometa incandescente
Aqui, a paixão é retratada como efêmera, intensa e, por fim, dolorosa. A metáfora do cometa sugere que, embora a paixão possa ser deslumbrante, a dor que fica é uma parte inevitável da experiência amorosa.

10. Se o fracasso tem dois lados
Sugere que a resposta ao fracasso influencia nosso crescimento. A escolha entre lamentar ou aprender com as frustrações é crucial. A "lição" é um ativo valioso que pode ser extraído das experiências difíceis.

11. Sobre opiniões e crenças
A ênfase aqui é no respeito mútuo e na importância das diferenças. A "teia de harmonia" sugere que a convivência pacífica e o entendimento entre diferentes visões de mundo são fundamentais para a sociedade.

12. Um cenário me devasta
Esta trova traz um tom de melancolia. A cena de solidão, com uma garrafa de champanhe e velas gastas, simboliza a busca por conexão e a tristeza de estar sozinho em momentos que deveriam ser comemorativos.

TEMAS ABORDADOS

Amor e Riqueza: 
A verdadeira riqueza não está no material, mas no amor que habita os lugares, sejam eles simples ou grandiosos.

Verdade e Ilusão: 
A sinceridade é mais valiosa do que viver em ilusões; enfrentar a verdade pode ser doloroso, mas é libertador.

Esperança: 
Descrita como um rio que flui incessantemente, a esperança é vital, mesmo que nunca chegue a um fim definitivo.

Superação: 
A resiliência é central nas adversidades; cada queda é uma oportunidade de recomeço e aprendizado.

Amor e Solidão: 
A imagem do cenário solitário com champanhe simboliza a busca por companhia e a tristeza da solidão.

AS TROVAS DE JERSON NA LITERATURA CONTEMPORÂNEA

Temáticas Universais
As trovas podem refletir a busca pela verdade e a complexidade das emoções, semelhantes a temas em "Os Lusíadas" ou na obra de Pessoa, que aborda a melancolia e a identidade.

A valorização do interior e da vida simples nas trovas incorpora elementos da cultura local, refletindo costumes, linguagem e tradições que ressoam com a literatura regionalista, semelhante a autores como Guimarães Rosa e Jorge Amado.

Estilo Lírico
Utiliza uma linguagem poética e acessível, o que é uma característica comum na poesia contemporânea. A simplicidade das palavras, aliada à profundidade dos temas, permite que sua obra atinja um público amplo.

Reflexão sobre a Vida
As reflexões sobre a verdade, a experiência e as relações se alinham com a literatura contemporânea que explora a subjetividade e a busca por significado em um mundo complexo.

Crítica Social
Embora suas trovas sejam frequentemente pessoais, há uma crítica implícita à sociedade e suas expectativas, similar a muitos autores contemporâneos que abordam questões de identidade, classe e cultura. Como na literatura regionalista, há uma crítica subjacente às desigualdades sociais e às dificuldades enfrentadas pelas comunidades do interior, ecoando preocupações de autores como Rachel de Queiroz.

Intertextualidade
As trovas podem ser vistas como parte de um diálogo intertextual com outros poetas e escritores, refletindo influências e referências que são comuns na literatura atual, onde a interconexão entre obras é cada vez mais valorizada.

Exploração da Emoção
A exploração das emoções humanas de maneira honesta e crua é uma preocupação central na literatura contemporânea. Jerson, ao abordar temas como a dor e a alegria, contribui para essa tradição.

Conexão com o Cotidiano
A conexão com o cotidiano e a espiritualidade em suas trovas pode ser comparada à poesia de Adélia Prado, que frequentemente aborda temas de amor e fé em contextos simples e profundos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

As trovas revelam uma sensibilidade profunda às emoções humanas e uma reflexão sobre a vida. Ele aborda temas universais como amor, verdade, resiliência e solidão, convidando o leitor a refletir sobre sua própria experiência.

Suas trovas também refletem influências da literatura regional, incorporando elementos da cultura e do cotidiano do interior, o que estabelece uma conexão com escritores contemporâneos que buscam valorizar suas raízes e identidades locais.

A intertextualidade é evidente nos temas universais que ele aborda, como amor, solidão e superação, que são recorrentes na poesia contemporânea. Isso cria um laço com outras obras que tratam dessas experiências humanas, permitindo uma leitura mais rica. Esta intertextualidade não apenas enriquece sua poesia, mas também a conecta a uma tradição literária mais ampla e ao contexto contemporâneo. Essa rede de referências e diálogos permite uma leitura multifacetada, onde cada trova se torna um ponto de partida para novas interpretações e conexões.

As trovas de Jerson, com sua combinação de lirismo, reflexões profundas e crítica social, se insere bem no contexto da literatura contemporânea. Sua capacidade de tocar em questões universais e a forma como se relaciona com a experiência humana o tornam relevante e ressonante com as tendências atuais.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. vol.1. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Jessé Nascimento (Trovas em Preto & Branco)

 

1
Ah, relógio, meu amigo,
teus ponteiros, como correm!
O tempo voa contigo
e com ele os sonhos morrem…
2
Após tantos desenganos
e conselhos não ouvidos,
chego ao final dos meus anos
sem ter meus dias vividos.
3
Com meus sonhos mais singelos,
embalados na esperança,
venho erguendo meus castelos
desde os tempos de criança.
4
Corres tanto, mocidade,
és pela vida levada:
– amanhã, serás saudade,
serás velhice, mais nada.
5
Dos outros não dependamos,
mas cada um erga a voz;
a paz que tanto almejamos
começa dentro de nós
6
Na dureza da porfia
para moldar minha história,
Deus me abençoa e me guia
para chegar à vitória.
7
Não adormeças teus sonhos,
não os esqueças, jamais;
os dias são mais risonhos
pra aqueles que sonham mais.
8
Não censuro o teu pecado,
não me censures também;
de vidro é o nosso telhado,
pecados... quem não os têm?
9
Navegando nas poesias,
nas ondas da inspiração,
iço as velas de alegrias
deixo o rumo ao coração.
10
Nesta vida, de passagem
sem morada permanente,
numa tão breve viagem,
sou um turista somente.
11
O genro sempre é quem dança,
a minha sogra é um porre;
o nome dela é "Esperança"
que é a última que morre.
12
Sempre fui um sonhador,
sonhos...por que não os ter?
Vivo meus sonhos de amor
porque sonhar é viver.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

AS TROVAS DE JESSÉ NASCIMENTO EM PRETO E BRANCO
por José Feldman

AS TROVAS UMA A UMA

1. Ah, relógio, meu amigo
A metáfora do relógio representa a inevitabilidade do tempo. Os "ponteiros" que correm simbolizam a urgência da vida e a perda de sonhos. A ideia de que "com ele os sonhos morrem" sugere uma reflexão sobre como o tempo pode levar embora as esperanças e aspirações.

2. Após tantos desenganos
Aqui, há um tom de melancolia e arrependimento. O eu lírico reflete sobre as oportunidades perdidas e conselhos não seguidos. A frase "sem ter meus dias vividos" implica uma vida de experiências não aproveitadas, levantando questões sobre a valorização do presente.

3. Com meus sonhos mais singelos
Esta trova fala sobre a simplicidade dos sonhos infantis e a construção de "castelos" na imaginação. A conexão entre a infância e a esperança sugere que manter a inocência e a capacidade de sonhar é essencial para a felicidade.

4. Corres tanto, mocidade
A juventude é apresentada como efêmera, um período que rapidamente se transforma em saudade. A ideia de que a mocidade "serás velhice, mais nada" ressalta a transitoriedade da vida e a necessidade de aproveitar cada momento.

5. Dos outros não dependamos
Esta enfatiza a importância da autonomia e da responsabilidade pessoal. A paz interna é vista como um pré-requisito para a paz coletiva, sugerindo que a mudança começa dentro de cada indivíduo.

6. Na dureza da porfia
O esforço e a luta para moldar a própria história são reconhecidos. A presença de Deus como guia indica uma busca por força espiritual e moral para superar desafios, culminando em um desejo de vitória.

7. Não adormeças teus sonhos
Um forte apelo à persistência e à valorização dos sonhos. A ideia de que "os dias são mais risonhos" para aqueles que sonham sugere que a esperança e a ambição trazem alegria à vida.

8. Não censuro o teu pecado
Esta estrofe reflete a aceitação da imperfeição humana. O "telhado de vidro" simboliza a fragilidade das relações e a vulnerabilidade de cada um, reconhecendo que todos têm suas falhas.

9. Navegando nas poesias
A poesia é vista como um meio de libertação e alegria. O ato de içar as velas representa a disposição de seguir o coração e aproveitar a inspiração, sugerindo que a arte é uma forma de navegar pela vida.

10. Nesta vida, de passagem
A metáfora do "turista" implica que a vida é temporária e que devemos valorizar cada experiência. A ideia de "morada permanente" reflete a incerteza e a natureza efêmera da existência humana.

11. O genro sempre é quem dança
Aqui, o humor é utilizado para abordar as dinâmicas familiares. A sogra como "Esperança" sugere que, mesmo em meio a desafios, a esperança permanece, destacando uma visão otimista.

12. Sempre fui um sonhador
Esta trova reafirma a identidade do eu lírico como sonhador. A afirmação de que "sonhar é viver" encapsula a mensagem central das trovas: a importância dos sonhos para uma vida plena e significativa.

TEMAS ABORDADOS E SUAS RELAÇÕES COM OUTROS POETAS

As "Trovas de Jessé Nascimento" capturam a essência do tempo, dos sonhos e da vida com profundidade e sensibilidade.

Transitoriedade do Tempo
Em "O Tempo", Fernando Pessoa reflete sobre a passagem do tempo e a inevitabilidade da morte, semelhante à preocupação de Jessé com a efemeridade dos sonhos e a juventude que rapidamente se transformam em memória, assim como Marcelino Freire que explora a passagem do tempo e a efemeridade das experiências, refletindo sobre a vida de maneira intensa.

Esperança e Sonhos
Em seus poemas, Cecília Meireles fala sobre a importância da esperança e dos sonhos, ecoando a mensagem positiva de Jessé sobre a a importância de manter a esperança e sonhar, enfatizando que a vida é mais rica para aqueles que sonham.

Reflexão e Autoconhecimento
Em obras como "Sentimento do Mundo", Carlos Drummond de Andrade explora a introspecção e o autoconhecimento, temas que também permeiam as trovas acima, uma busca por compreender as próprias experiências, arrependimentos e a necessidade de aproveitar o presente. A poesia de Alice Ruiz é marcada por uma busca íntima e reflexões sobre a vida e o amor, dialogando com a introspecção presente nas trovas.

Individualidade e Coletividade
Em suas poesias, Adélia Prado e Rafael Cortez discutem a relação entre o eu e o outro, similar à necessidade de Jessé de encontrar a própria voz e contribuir para a paz interna e externa destacando a relação entre o indivíduo e a sociedade.

Aceitação da Imperfeição Humana
Com um tom leve e humorístico, Mário Quintana aborda a fragilidade humana em muitos de seus poemas, semelhante às trovas de Jessé que enfatizam a aceitação dos erros e falhas pessoais, reconhecendo a fragilidade das relações e a universalidade do pecado, assim como Thiago de Mello, conhecido por sua visão humanista.

A Vida como Viagem
Vinicius de Moraes reflete sobre a vida como uma jornada, um tema que ressoa com a visão na trova de Jessé, por intermédio da metáfora da vida como uma passagem ou viagem que sugere a importância de valorizar cada experiência, assim como Bruna Beber, que frequentemente utiliza metáforas de viagem e passagem, refletindo sobre a jornada da vida de maneira lírica e introspectiva.

Relações e Dinâmicas Familiares
O humor e a complexidade nas relações familiares são explorados, especialmente em relação à figura da sogra, como Juliana Leite aborda estas relações e complexidades, trazendo um olhar contemporâneo que ressoa com o humor e a leveza de Jessé.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A temática das trovas de Jessé Nascimento revela uma rica tapeçaria de reflexões sobre a condição humana, onde a transitoriedade da vida, a importância da esperança e a busca por autoconhecimento se entrelaçam de maneira profunda. Aborda a passagem do tempo com uma sensibilidade que ressoa em muitos leitores, convidando-os a contemplar a efemeridade dos sonhos e a inevitabilidade das mudanças.

A simplicidade de sua linguagem e a musicalidade de suas trovas tornam suas mensagens acessíveis, permitindo que temas universais, como amor, perda e as complexidades das relações humanas, sejam explorados de forma íntima e profunda. O uso de humor e ironia, especialmente em contextos familiares, oferece uma leveza que contrabalança a seriedade de suas reflexões, destacando a dualidade da experiência humana.

Além disso, o trovador enfatiza a importância da individualidade dentro de um contexto coletivo, sugerindo que a paz pessoal é fundamental para a harmonia social. Essa ideia ressoa fortemente em um mundo contemporâneo repleto de desafios, onde a busca por significado e conexão se torna cada vez mais urgente.

Enfim, as trovas de Jessé Nascimento não apenas capturam a essência da vida cotidiana, mas também oferecem um convite à introspecção e à valorização dos momentos simples. Sua obra se estabelece como um farol de esperança e reflexão, incentivando os leitores a sonhar, a viver plenamente e a encontrar beleza mesmo nas incertezas da vida.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco.  vol.1. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Vanda Fagundes Queiroz (Trovas em Preto & Branco)

 

1
A minha alma adolescente,
de braços dados com a vida,
parece nem ser parente
desta face envelhecida.
2
A primavera, suponho,
que tendo sonhos de amor,
faz, sim, com que cada sonho
nasça em forma de uma flor.
3
Chuva a molhar nosso riso,
riso feliz e molhado…
qualquer tempo é paraíso,
quando o amor é partilhado.
4
– Corte o texto!… Longo assim,
A ideia até se desdoura.
– Pois não, mestre, corto sim,
vou procurar a tesoura…
5
Entro em casa e, no consolo
de ter, no lar, proteção,
piso o primeiro tijolo…
e sinto o céu, no meu chão!
6
Fez plástica no nariz
e comprou peruca loura…
Pirracenta, a outra diz:
- Falta montar na vassoura…
7
Maior prêmio, no decurso
da vida de um trovador,
bem mais que ganhar concurso,
é erguer o troféu do amor!
8
Não basta apenas sonhar,
a vida requer firmeza
de agir, para transformar
uma esperança em certeza.
9
Neste mundo tão mesquinho,
é um prazer ouvir a voz
de quem faz o bem sozinho,
mas usa o pronome “Nós”.
10
Para um garoto, os quintais
eram reinos de magia,
guardando tesouros reais
nos mapas de fantasia…
11
Por mais que o progresso iluda,
deturpe e inverta valor,
o que Deus fez ninguém muda:
o amor será sempre amor!
12
Que imenso mundo se esconde
na pena de intenso brilho
que torna em sábio Visconde
um sabuguinho de milho…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

AS TROVAS DE VANDA EM PRETO E BRANCO
por José Feldman

AS TROVAS UMA A UMA

1. A minha alma adolescente
A poetisa reflete sobre a dualidade entre a juventude e o envelhecimento. A "alma adolescente" representa a vitalidade e a esperança, enquanto a "face envelhecida" sugere a experiência e os desafios da vida. Essa tensão entre o ser interior e a aparência externa provoca uma reflexão sobre a identidade e a passagem do tempo.

2. A primavera, suponho
Aqui, a primavera simboliza renovação e novos começos. Os "sonhos de amor" florescem, representando a capacidade de transformar aspirações em realidade. A imagem da flor é poderosa, sugerindo beleza, fragilidade e a natureza efêmera dos sentimentos.

3. Chuva a molhar nosso riso
A chuva é uma metáfora para a alegria compartilhada. Mesmo em tempos difíceis, o amor pode criar um "paraíso". Essa trova destaca a importância da conexão emocional e da partilha nas relações, sugerindo que a felicidade é, em grande parte, uma construção conjunta.

4. – Corte o texto!… Longo assim
Esta trova revela uma crítica à superficialidade na arte. De uma forma humorística, o "mestre" representa a voz da razão que busca simplificação, enquanto a resposta do eu lírico demonstra a disposição em questionar essa autoridade. A tesoura torna-se um símbolo da necessidade de edição e clareza na expressão artística.

5. Entro em casa e, no consolo
A casa é retratada como um santuário, um lugar de proteção e conforto. O "primeiro tijolo" simboliza a construção de um lar e de raízes. A expressão "sinto o céu, no meu chão" sugere uma conexão profunda entre o mundano e o espiritual, enfatizando a paz que se encontra em um ambiente seguro.

6. Fez plástica no nariz
Essa trova aborda a obsessão pela aparência e as pressões sociais que levam à transformação física. A crítica à superficialidade é evidente, com uma personagem que se transforma, mas ainda é alvo de zombarias. Isso provoca uma reflexão sobre a autenticidade e o valor interior versus exterior.

7. Maior prêmio, no decurso
O amor é exaltado como a verdadeira recompensa na vida de um trovador. Essa trova sugere que, embora o reconhecimento externo seja valioso, o amor é a realização mais significativa, ressaltando a importância das conexões afetivas.

8. Não basta apenas sonhar
Aqui, a poetisa destaca a necessidade de ação. Sonhar sem agir é insuficiente; a transformação de esperanças em certezas requer determinação. Essa mensagem é um chamado à proatividade e à responsabilidade na busca por objetivos.

9. Neste mundo tão mesquinho
A voz que faz o bem "sozinho" e usa "nós" sugere uma crítica ao individualismo. A coletividade e a solidariedade são valorizadas, destacando que ações altruístas são mais impactantes quando vistas como esforços conjuntos, reforçando a ideia de comunidade.

10. Para um garoto, os quintais
A evocação da infância e dos quintais como "reinos de magia" simboliza a imaginação e a descoberta. Os "mapas de fantasia" refletem a inocência e a capacidade de ver o mundo como um lugar cheio de possibilidades, evocando saudade e nostalgia.

11. Por mais que o progresso iluda
A poetisa critica a forma como o progresso pode distorcer valores. O amor, como uma essência divina, permanece imutável, destacando a importância de preservar o que é verdadeiro e significativo em meio às mudanças da sociedade.

12. Que imenso mundo se esconde
A metáfora do "sabuguinho de milho" transformado em "sábio Visconde" sugere que há um potencial oculto em tudo e todos. Essa ideia de transformação e descoberta da sabedoria interna reflete um otimismo sobre o crescimento humano e as possibilidades de mudança.

RELAÇÕES DA TEMÁTICA DAS TROVAS DE VANDA COM OUTROS POETAS

As trovas de Vanda F. Queiróz dialogam com diversos poetas, tanto antigos quanto contemporâneos, em vários aspectos. Vejamos:

1. Amor e Natureza
Em tempos de incertezas e crises emocionais, a ênfase de Vanda no amor como uma força transformadora destaca a sua relevância. O amor, em suas diversas formas, é um antídoto contra a alienação e a solidão, promovendo laços que fortalecem a comunidade.

Camões e Bocage frequentemente exploram o amor em conexão com a natureza. Camões, em particular, usa a natureza como um reflexo das emoções humanas. Adélia Prado e Maria Bethânia também utilizam a natureza para evocar sentimentos amorosos, similar ao que se vê nas trovas de Vanda.

2. Juventude e Envelhecimento
A tensão entre juventude e envelhecimento que permeia suas trovas convida à introspecção sobre a identidade pessoal em meio às pressões sociais. Essa reflexão é essencial em uma era em que a imagem e a aparência muitas vezes superam o valor interior.

Fernando Pessoa, especialmente em suas reflexões sobre a passagem do tempo em "Mensagem", aborda a dualidade entre o eu jovem e o eu maduro. Mário Quintana fala sobre o tempo e a nostalgia, ecoando as preocupações de Vanda com a alma jovem em um corpo envelhecido.

3. Solidariedade e Coletividade
A valorização do "nós" em suas obras se alinha com a crescente necessidade de ações coletivas para enfrentar desafios globais, como desigualdade social e crises ambientais. Vanda nos lembra da importância de agir em conjunto, promovendo um senso de comunidade.

Olavo Bilac, em sua obra, valoriza a união e a coletividade, refletindo sobre a importância do "nós". Cecília Meireles também destaca a importância das relações humanas e da coletividade em suas poesias.

4. Autenticidade e Aparência
A crítica à superficialidade e à obsessão por aparências é mais pertinente do que nunca. Em um ambiente saturado de redes sociais e comparações, suas trovas nos incentivam a buscar a autenticidade e a verdadeira essência do ser.

Gregório de Matos critica a hipocrisia social e a superficialidade em suas poesias, semelhante ao olhar crítico de Vanda. Chico Buarque, em suas letras, aborda questões de identidade e aparência, refletindo sobre a autenticidade.

5. Nostalgia e Inocência
A nostalgia e a inocência nas trovas de Vanda F. Queiróz não apenas evocam um sentimento de saudade, mas também funcionam como um chamado à redescoberta das qualidades essenciais da vida. Elas nos lembram da importância de manter viva a capacidade de sonhar, de valorizar as conexões emocionais e de encontrar beleza nas experiências cotidianas. Em um mundo que frequentemente prioriza o material e o efêmero, as trovas de Vanda oferecem um refúgio que valoriza o que é verdadeiramente significativo e duradouro.

Gonçalves Dias, em "Canção do Exílio", evoca a saudade e a nostalgia pela infância e pela terra natal. Marília Mendonça, em suas letras, traz uma forte carga emocional ligada à memória e à inocência perdida.

6. Ação e Transformação
A mensagem de que sonhar sem agir é insuficiente ressoa em um momento em que muitos buscam mudança, tanto em suas vidas pessoais quanto na sociedade. A necessidade de transformar esperanças em realidades é um chamado à ação que pode inspirar gerações atuais e futuras.

Machado de Assis frequentemente enfatiza a necessidade de ação e mudança social em suas obras. Hilda Hilst também fala sobre a importância de agir para transformar a realidade, alinhando-se com a mensagem de Vanda.

7. Mudanças e Permanência
A relação entre mudanças e permanência nas trovas de Vanda F. Queiróz cria um espaço para reflexão sobre a dualidade da experiência humana. Enquanto as mudanças são inevitáveis e muitas vezes desafiadoras, a poetisa nos lembra que certos elementos, como o amor e os valores fundamentais, oferecem estabilidade e significado. Essa interação entre o efêmero e o duradouro é um convite para encontrar beleza e profundidade nas transições da vida, celebrando o que realmente importa em meio às incertezas.

Vinicius de Moraes explora a permanência do amor em meio às mudanças da vida, uma temática que ressoa nas trovas de Vanda. Ruth Rocha também aborda a ideia de que, apesar das mudanças, o amor e as relações humanas permanecem centrais.

Essas relações mostram como Vanda F. Queiróz se insere em um rico diálogo literário, abordando temas universais que atravessam o tempo e ressoam em diferentes vozes poéticas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A temática das trovas de Vanda F. Queiróz, com sua rica exploração de amor, juventude, autenticidade e solidariedade, ressoa profundamente no contexto contemporâneo.

As trovas de Vanda não são apenas um testemunho da beleza poética, mas também um convite à reflexão sobre temas que continuam a ser relevantes em um mundo marcado por rápidas mudanças. Suas trovas servem como um farol, guiando-nos em meio às complexidades da vida moderna, reafirmando a importância do amor, da autenticidade e da solidariedade em um mundo que muitas vezes parece desumanizado. Ao resgatar esses valores, Vanda contribui para a construção de uma sociedade mais empática e conectada, essencial para o futuro que desejamos.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. vol.1. Maringá/PR: IA Poe Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Gerson César Souza (Trovas em Preto & Branco)

 

1
A justiça, rica em falhas,
corrompida por esquemas,
enche de glória e medalhas
mãos que merecem algemas!
2
Ator, arisco ao cabresto,
rebelde, se for preciso,
a vida escreve o meu texto
e eu teimo e sempre improviso!
3
Dizem que eu sonho em excesso...
Mas insisto em voos altos!
E as pedras nas quais tropeço
impulsionam novos saltos!!!
4
Espera é aquele momento
em que a saudade dispara
e o relógio fica lento,
fica lento e quase para...
5
Foi com pregos de desgosto
que a saudade, do seu jeito,
pôs retratos do teu rosto
nas paredes do meu peito...
6
Não julgue alguém pela imagem,
pois muitos fazem de tudo
para esconder na “embalagem”
a falta de conteúdo.
7
Nas horas de despedida
sem querer a gente chora
e uma lágrima perdida
quer seguir quem vai embora...
8
Nas mãos de Deus tudo entrego
fazendo um pedido assim:
que estes sonhos que carrego
não morram antes de mim!
9
O perdão, embora escasso,
é a cola mais indicada
para unir cada pedaço
de uma promessa quebrada.
10
Quando a esperança se cansa
o amigo é quem, prontamente,
empresta a sua esperança
para amparar a da gente.
11
Siga os mais velhos e creia
na experiência que eles têm:
quem reflete a luz alheia
ganha luz própria também!
12
Vejo a fé sem fundamento
dos que, olhando o céu em vão,
buscam Deus no firmamento
mas não O enxergam no irmão...

AS TROVAS DE GERSON CÉSAR SOUZA EM PRETO & BRANCO
por José Feldman

As trovas de Gerson César Souza não apenas revelam a complexidade das emoções humanas, mas também se conectam a um rico legado poético, tanto no Brasil quanto no exterior. Essa intertextualidade enriquece a compreensão de suas trovas e destaca a universalidade dos temas abordados.

AS TROVAS UMA A UMA, SUAS TEMÁTICAS E RELAÇÃO COM POEMAS DE UM UNIVERSO DE POETAS

Trova 1. 
Temática: Justiça e Corrupção
A crítica à hipocrisia da justiça expõe a fragilidade das instituições que deveriam proteger a sociedade. Reflete um descontentamento profundo com a impunidade e a moralidade distorcida. Essa busca por justiça ressoa com realidades contemporâneas, onde a corrupção é um tema recorrente.

Bertolt Brecht (embora alemão, sua obra ressoou no Brasil): critica a moralidade da sociedade, similar à crítica da trova à justiça falha.

T.S. Eliot (EUA/Inglaterra): em "A Terra Desolada", a desilusão com a sociedade e suas instituições é um tema central, ecoando a frustração da trova com a justiça.

Pablo Neruda (Chile): "O Canto da Liberdade" também aborda a injustiça, revelando como os poderosos muitas vezes se esquivam das consequências de seus atos.

Trova 2. 
Temática: Autenticidade e Rebeldia
A busca pela autenticidade expressa uma resistência às normas sociais. Gerson enfatiza a importância de viver de maneira verdadeira, mesmo diante de pressões externas. Essa rebeldia é uma afirmação da individualidade e da liberdade pessoal, fundamentais na construção da identidade.

Cecília Meireles: "A Vida é Sonho" explora a ideia de viver a vida de forma autêntica, semelhante à rebeldia e improvisação de Gerson.

Adélia Prado: "Oração de um Amor", fala sobre a sinceridade e a necessidade de ser verdadeiro consigo mesmo.

Walt Whitman (EUA): "Leaves of Grass" celebra a individualidade e a expressão pessoal, ressoando com a teimosia do trovador em seguir seu próprio caminho.

Trova 3. 
Temática: Sonhos e Obstáculos
A perseverança diante das adversidades é central nesta trova. Fala sobre como os desafios moldam nossos sonhos e fortalecem nosso caráter. A ideia de que obstáculos podem ser trampolins para o sucesso reflete uma visão otimista da vida.

Vinicius de Moraes: "Soneto de Separação" fala sobre a superação da dor, espelhando a ideia de que as dificuldades podem impulsionar novos saltos.

Emily Dickinson (EUA): em muitos de seus poemas, a luta entre esperança e desilusão é comum, refletindo a jornada de Gerson.

Langston Hughes (EUA): "I Dream a World" fala sobre a luta por um mundo melhor, onde os obstáculos são parte do caminho para a realização dos sonhos.

Trova 4. 
Temática: Saudade e Tempo
A relação entre saudade e a percepção do tempo revela uma melancolia intrínseca. O trovador captura a essência da nostalgia, mostrando como as memórias podem tanto confortar quanto trazer dor. O tempo, nesse contexto, é um protagonista que transforma a experiência emocional.

Adélia Prado: "Poema à Mãe" fala sobre o tempo e a saudade de maneira íntima, semelhante à reflexão temporal na trova.

Vinicius de Moraes: "Soneto de Separação" expressa a dor da saudade e como ela distorce o tempo.

Marcel Proust (França): "Em Busca do Tempo Perdido" enfatiza a memória e o tempo, capturando a essência da saudade que Souza expressa.

T.S. Eliot (EUA/Inglaterra): novamente, em "A Terra Desolada", aborda a passagem do tempo e a saudade de um passado perdido, criando um sentimento de melancolia.

Trova 5. 
Temática: Memórias e Desgosto
A fixação em memórias dolorosas aborda a luta interna entre o passado e o presente. A trova nos convida a refletir sobre como as lembranças moldam nossas emoções e decisões, enfatizando que o passado pode ser um fardo, mas também uma fonte de aprendizado.

Carlos Drummond de Andrade: "No Meio do Caminho" trata da dor e das marcas que permanecem, refletindo a fixação de Gerson em memórias.

Sylvia Plath (EUA): em seus poemas, a relação com a dor e a memória é central, ecoando a intensidade da saudade do trovador.

Trova 6. 
Temática: Aparências e Conteúdo
A crítica à superficialidade das aparências desafia as convenções sociais. Destaca a importância de olhar além do que se vê, questionando a autenticidade das interações e das relações humanas. Essa reflexão é um convite à profundidade e à sinceridade.

Fernando Pessoa: "O Livro do Desassossego" reflete sobre a dualidade entre aparência e essência, semelhante à crítica contida na trova.

Robert Frost (EUA): "The Road Not Taken" explora a escolha e as aparências enganadoras da vida, ressoando com a mensagem de Gerson.

Trova 7. 
Temática: Despedida e Emoção
A dor da despedida é uma experiência universal que Gerson aborda com sensibilidade, explorando a fragilidade das relações e a inevitabilidade da perda, enfatizando que cada despedida traz consigo um leque de emoções que precisam ser reconhecidas e processadas.

Mário Quintana: "Despedida" fala sobre a tristeza da separação, ecoando a lágrima perdida de Gerson.

Pablo Neruda (Chile): em "Soneto XVII" a intensidade emocional diante da perda é um tema recorrente, refletindo a fragilidade da despedida.

John Keats (Inglaterra): "La Belle Dame sans Merci" retrata a dor da perda e a tristeza que acompanha uma despedida.

Trova 8. 
Temática: Sonhos e Destino
A súplica para que os sonhos não se percam reflete uma esperança profunda. O trovador nos lembra da fragilidade dos sonhos e da importância de lutar por eles, mesmo em face das dificuldades, sugerindo que o destino é algo que podemos moldar com nossas ações.

Manuel Bandeira: "Vou-me embora pra Pasárgada" fala sobre a busca de um lugar ideal, semelhante à esperança de Gerson pelos seus sonhos.

Alphonsus de Guimaraens: "A Fala do Sonho" fala da fragilidade dos sonhos e da necessidade de preservá-los.

Langston Hughes (EUA): "I Dream a World" expressa a esperança e o desejo por um futuro melhor, alinhando-se à súplica na trova.

Trova 9. 
Temática: Perdão e Relações
O perdão como um elemento de reparação destaca a complexidade das relações humanas. Sugere que o ato de perdoar é essencial para a cura e o entendimento mútuo, mostrando que a empatia e a compreensão são fundamentais na construção de vínculos saudáveis.

Guilherme de Almeida: "Perdão" aborda a importância do perdão nas relações humanas.

Khalil Gibran (Líbano): "O Profeta", fala sobre amor e perdão, ressoando com a ideia de Gerson sobre unir promessas quebradas.

Trova 10. 
Temática: Amizade e Esperança
A importância do amigo em momentos difíceis é uma celebração da solidariedade. Enfatiza que a amizade é um pilar de esperança, essencial para enfrentar os desafios da vida. Essa conexão entre indivíduos é vital para a resiliência emocional.

Chico Buarque em suas letras, a amizade é um tema recorrente, refletindo a solidariedade que o trovador valoriza.

Cecília Meireles: "Amizade", destaca a importância da amizade como um pilar de esperança e apoio.

Emily Dickinson (EUA): em seus poemas, frequentemente menciona a solidez da amizade como um alicerce em tempos de tristeza.

William Wordsworth (Inglaterra): "I Wandered Lonely as a Cloud" estabelece que uma conexão com a natureza e os amigos traz esperança, semelhante à troca de esperanças em Gerson.

Trova 11. 
Temática: Sabedoria e Experiência
A valorização da experiência dos mais velhos reflete um respeito pela história e pelas lições aprendidas. A trova sugere que a sabedoria é um legado que deve ser transmitido, enfatizando a importância da escuta e da reflexão sobre nossas vivências.

William Wordsworth (Inglaterra): "The Prelude" valoriza a sabedoria adquirida com a experiência e a reflexão sobre a vida.

Rainer Maria Rilke (Áustria): "Cartas a um Jovem Poeta", fala sobre a empatia e a sabedoria que podemos aprender com os mais velhos.

Trova 12. 
Temática: Fé e Empatia
A crítica à fé que não se traduz em ações concretas destaca a necessidade de ação em prol do próximo, e uma reflexão sobre a autenticidade da nossa fé e a importância de agir com empatia, sugerindo que a verdadeira espiritualidade se manifesta em atitudes.

Hilda Hilst: "A Obscena Senhora D" questiona a espiritualidade e a prática, ecoando a crítica do trovador.

Claudio Manuel da Costa: "Oração a Deus" aborda a relação entre fé e ação, enfatizando a importância da empatia.

Maya Angelou (EUA): "Still I Rise" mostra como a fé e a determinação se manifestam em ações de resistência e solidariedade.

Albert Camus (Argélia/França): no "O Mito de Sísifo" a busca por sentido e a crítica à fé abstrata são temas que estão alinhados com a mensagem de Gerson.

A SAUDADE E O TEMPO NAS TROVAS DE GERSON CÉSAR SOUZA

A saudade, em muitas das trovas de Gerson, é apresentada como um sentimento que está intrinsecamente ligado ao passado. Ela não é apenas uma lembrança nostálgica, mas uma vivência que distorce a percepção do tempo. O presente é muitas vezes ofuscado pela intensidade das memórias, criando um espaço onde o passado se torna mais presente do que o próprio agora.

Ele sugere que as memórias moldam a forma como vivemos o tempo. A saudade pode fazer com que momentos felizes do passado pareçam mais significativos, levando a uma idealização do que foi. Essa reinterpretação pode causar uma dor aguda, pois a comparação entre o que foi e o que é gera um sentimento de perda.

As trovas também abordam a saudade em relação aos ciclos da vida. À medida que as pessoas passam por diferentes fases, a saudade se torna uma constante. Eventos como despedidas e mudanças de vida intensificam esse sentimento, evidenciando como o tempo traz transformações que podem ser tanto dolorosas quanto enriquecedoras.

A melancolia é um tema forte na relação entre saudade e tempo. A saudade muitas vezes carrega um tom de tristeza, uma consciência da transitoriedade da vida. O tempo, ao avançar, leva consigo momentos que não podem ser recuperados, e isso gera um lamento por aquilo que já se foi.

A saudade também desempenha um papel na formação da identidade. As experiências passadas moldam quem somos, e a saudade é um lembrete constante de nossas vivências. O poeta sugere que, ao refletir sobre o tempo e a saudade, somos convidados a entender nossa trajetória e reconhecer como ela influencia nosso presente.

A relação entre saudade e tempo na obra de Gerson César Souza provoca uma reflexão profunda sobre como vivemos nossas experiências e como elas nos afetam emocionalmente. A saudade, ao se entrelaçar com o tempo, transforma-se em um elemento central na busca por significado e compreensão da própria existência.

CONCLUSÃO

As trovas de Gerson César Souza oferecem um rico panorama das emoções humanas, abordando temas universais como justiça, saudade, autenticidade, perdão e amizade. Cada uma dessas temáticas não apenas ressoa com a experiência individual, mas também estabelece diálogos profundos com a obra de poetas brasileiros e estrangeiros, ampliando a compreensão da condição humana.

A crítica à corrupção e à hipocrisia da justiça, por exemplo, reflete a insatisfação contemporânea com instituições falhas, um sentimento que ecoa nas obras de poetas como Bertolt Brecht e Pablo Neruda. Este contexto social é crucial, pois revela a necessidade de uma literatura engajada que questione e desafie as estruturas de poder, algo que continua a ser relevante em um mundo marcado por desigualdades.

A busca pela autenticidade e a resistência às normas sociais, presente nas trovas, dialoga com a obra de poetas como Walt Whitman e Cecília Meireles. Essa luta pela individualidade é vital em uma época em que as pressões sociais e culturais muitas vezes levam à conformidade. Essa busca por identidade e expressão pessoal se torna ainda mais importante para as futuras gerações, que habitam um mundo digital em constante transformação.

A relação entre saudade e tempo, um tema central nas trovas de Gerson, revela a complexidade das emoções humanas frente à transitoriedade da vida. Poetas como Vinicius de Moraes e T.S. Eliot também exploram essa melancolia, demonstrando que a reflexão sobre o passado é fundamental para a construção da identidade no presente. Compreender essa relação é essencial para lidar com as perdas e a nostalgia que permeiam a experiência humana.

Além disso, a ênfase no perdão e na amizade ressalta a importância das relações interpessoais, fundamentais para a saúde emocional e a construção de comunidades solidárias. A ideia de que o perdão é uma forma de reparação é um ensinamento crucial, especialmente em tempos de polarização e conflito. Em um mundo onde as divisões são cada vez mais evidentes, essa mensagem ressoa fortemente.

Por fim, a valorização da sabedoria e da experiência dos mais velhos, presente nas trovas, sugere uma continuidade entre gerações que é vital para a construção de sociedades mais justas e empáticas. A capacidade de aprender com o passado e respeitar aqueles que vieram antes de nós é um legado que deve ser cuidadosamente preservado e transmitido.

Em suma, as trovas de Gerson César Souza não apenas capturam a essência da experiência humana, mas também servem como um convite à reflexão crítica sobre a sociedade contemporânea e as relações que a definem. Ao dialogar com grandes poetas do passado e do presente, ele reafirma a relevância da poesia como um meio de explorar, entender e transformar a realidade. Para as futuras gerações, suas palavras oferecem um caminho de introspecção e esperança, ressaltando a importância de sonhar, amar e lutar por um mundo mais justo e verdadeiro.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. vol.1. Maringá/PR: IA Poe Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...