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terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Jessé Nascimento (Analecto de Trovas)

A formiga na labuta
nos dá profunda lição;
não se curva ao peso e à luta,
vive em perfeita união.
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Caminhos, jardins e praças,
flores, cores - que beleza!
Deus derrama suas graças
dando graça à natureza!
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Chora o coração sentindo
tristeza, nunca revolta;
os amigos vão partindo
numa viagem sem volta.
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Com meus sonhos mais singelos
embalados na esperança
venho erguendo meus castelos
desde os tempos de criança.
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Corres tanto, mocidade,
és pela vida levada.
Amanhã serás saudade,
serás velhice, mais nada...
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Dos outros não dependamos,
mas cada um erga a voz;
a paz que tanto almejamos
começa dentro de nós.
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Leu "Campanha do Agasalho",
quando por ali passou;
o espertalhão ou paspalho
em vez de deixar, pegou.
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Lindo olhar, belo sorriso,
rosto de tal perfeição,
sugere o traço preciso
do Senhor da criação.
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Na dureza da porfia
para moldar minha história,
Deus me abençoa e me guia
para chegar à vitória.
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Na padaria, o cliente:
- O pão está bem "quentinho?"
Com sorriso, a atendente;
- Veja como está "fresquinho".
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Navegando nas poesias,
nas ondas da inspiração,
iço as velas de alegrias
deixo o rumo ao coração.
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No sonho e imaginação,
vou compondo cada verso;
partindo do coração,
viajo pelo universo.
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Num cenário colorido,
cheio de encanto e alegria,
a vida tem mais sentido:
a primavera extasia!
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O genro sempre é quem dança,
a minha sogra é um porre;
o nome dela é "Esperança"
que é a última que morre.
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Por mais que as regras morais
moldem o bom cidadão,
dia a dia os imorais
na vida melhor se dão.
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Pra acreditar foi um custo;
na primeira gravidez,
levou um tremendo susto:
foram cinco de uma vez!
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Quando a razão não alcança
por mais que pareça incrível,
ter fé é ter esperança,
ter fé é crer no impossível.
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Quantas vezes nós choramos
por tantas coisas banais...
Mas, jamais nos esqueçamos:
há outros que sofrem mais.
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Que a humanidade resista
ao mal que, sagaz, avança
eu sou poeta otimista:
ainda existe esperança!
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Se a tua cruz é pesada
e vives só de lamento,
hás de encontrar pela estrada
outros com mais sofrimento.
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Senhor Deus, misericórdia!
Neste conturbado mundo,
nos corações põe concórdia,
mais perdão e amor profundo.
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Semelhante a um quartel
tem sido assim minha casa;
minha mulher, coronel
e eu sempre patente rasa.
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Tenho ciúme e desgosto
quando, à noite, leve brisa
afaga o teu meigo rosto
e os teus cabelos alisa.
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Teu cego e amargo ciúme
que me desgosta e alucina
tem sido o cortante gume
que ao amor leva a ruína.
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Teu olhar, quanta ternura!
Tuas mãos, quanto carinho!
Teu amor, oh, que ventura
pôs a vida em meu caminho.

Fonte:
Autores diversos da UBT-Angra dos Reis. Sementes poéticas. SP: Daya Ed., 2021.
Livro enviado por Jessé Nascimento.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Alvitres do Prof. Renato Alves – 7 –

51.
0 uso inteligente do Discurso Direto, isto é, de um DIÁLOGO em que se reproduzem as frases exatamente como foram ditas, é um excelente recurso para valorizar a agilidade da comunicação e aumentar o efeito humorístico nas trovas desta modalidade.

Vejamos, nas trovas abaixo, premiadas em Nova Friburgo, como este recurso foi extremamente positivo para o resultado final obtido, ou seja, fazer rir.

- Me empresta cem? - Nem por alto!
- Vinte! - Eu já disse: Não tem!
- PASSE A GRANA: isto é um assalto!
- OK, eu te empresto os cem!

José Ouverney

Ao chegar à grande estreia:
— A senha para ingressar?!
— Não faço a menor ideia!
— Isso mesmo, pode entrar!

Renata Paccola


52.
O ACHADO é aquele "algo diferente", aquela ideia inusitada, aquele recurso linguístico especial que faz com que a trova valha a pena ter sido escrita. 0 ACHADO pode estar, por exemplo, num jogo de palavras, numa abordagem criativa do tema, na forma de colocar as ideias, fugindo do lugar comum

Nesta primorosa trova do mestre Izo Goldman a beleza do achado está na inteligente manipulação das variantes semânticas do vocábulo "pena", formando um jogo de palavras bem interessante.

Que pena que as minhas penas
não te causem pena alguma,
e, sem pena, eu seja apenas,
entre as penas... só mais uma!

Izo Goldman

53.
A finalidade precípua da trova de humor é fazer rir. No entanto, seu conteúdo deve ser trabalhado com o mesmo esmero que dedicamos a qualquer outra modalidade. Assim, um trabalho meticuloso na sintaxe das frases, coloca a trova humorística em pé de igualdade com líricas ou filosóficas.

Reparem como, na construção do 2° verso desta primorosa trova, o emprego da palavra "Amor" como vocativo (entre vírgulas) possibilitou, na flexão verbal de 2a. pessoa, uma rima rica para "primas", ficando também destacado o excelente achado humorístico: "vigia da fechadura", no 3o. verso.

Uma outra curiosidade na construção desta trova é que ela começa liricamente nos dois primeiros versos, mudando o tom para o desfecho humorístico a partir do 3o. verso.

Eu era, na infância dura
Quando, Amor, tudo sublimas,
vigia da fechadura
do quarto das minhas primas.

Sérgio Fonseca


54.
0 que distingue um texto literário de um texto meramente informativo é que o texto literário privilegia o uso da linguagem figurada e imagens cuja finalidade é criar emoção e beleza estética. Nos dois casos as palavras são as mesmas disponíveis no vocabulário comum da língua, mas o seu emprego no texto literário deve ser assim: diferente, inusitado, metafórico.

Uma trova, para ser literária, precisa conter algo novo, criado pela sensibilidade do trovador a partir da imaginação ou da observação da realidade.

Reparem na trova abaixo, como o ruído ritmado de um trem em movimento e o desenho simétrico dos dormentes (como as teclas de um piano) na ferrovia geraram uma belíssima imagem, constituindo um verdadeiro achado poético.

Tu chegavas... e eu ouvia
o trem, em tons comoventes,
tocar canções de alegria
no teclado dos dormentes...

Marina Bruna

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Maria Helena Ururahy Campos da Fonseca (Caderno de Trovas)

 

A brisa o perfume espalha
na planície em Goytacazes.
Esse odor de cana e palha
és tu, saudade, quem trazes.
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A esperança que norteia
a vida sempre a girar
é a força que semeia
coragem pra caminhar...
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Anoitecer da jornada,
quando desponta o cansaço,
eu me sinto renovada
no calor do teu abraço.
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Antes de morrer na Cruz,
Jesus Cristo, nosso irmão,
mistério de fé e luz,
partilhou conosco o pão.
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Ao cair da tarde fria,
e quando a luz já se evade
eu tenho por companhia
os suspiros da saudade...
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As luzes do alvorecer,
em matiz resplandecente,
apagam-se ao entardecer,
levando os sonhos da gente...
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Com retalhos de lembrança
eu costurei, sem maldade,
meus amores de criança
com suspiros de saudade...
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Em uma gaiola encanta,
lindo pássaro a cantar!
Sem liberdade ele canta,
porque não sabe chorar...
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E procurando ensinar,
a minha vida passei,
pra no final constatar;
aprendi mais que ensinei.
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Estrela, eterna magia,
que traz à mente esquecida
lampejo que contagia
a saudade adormecida.
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Eu relembro a mocidade
sem perjúrio e sem revolta,
mas como dói a saudade
do tempo que não mais volta…
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Menina, que beijo doce!
Gostoso, vadio, arisco.
Teu beijo é como se fosse
saborear um chuvisco.
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Meu peito pulsa saudade,
sem chance, mas sem revolta,
relembrando a mocidade
que já se foi... não tem volta.
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Meu sorriso de beleza
com o tempo se apagou,
desgaste da natureza,
até meu espelho embaçou.
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Na solidão do meu leito,
quando a esperança se evade,
eu pranteio o amor desfeito,
triste missão da saudade.
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Niterói doce lembrança
que nem o tempo destrói.
Volto ao tempo de criança...
E como a saudade dói!
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Na trilha da vida, as flores
encontradas nos caminhos,
às vezes, trazem sabores,
às vezes, trazem espinhos.
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O abraço por gentileza
é bom até, quando dado,
mas bom mesmo, com certeza,
o abraço do ser amado!
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O ciúme é sal da vida,
não sofra à toa, por favor,
quem não o sofre, querida,
é porque não tem amor.
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O recado tão sonhado
que você tanto esperou
ficou sempre resguardado;
o correio não entregou.
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Privado da liberdade
lindo pássaro cantador,
na gaiola, de saudade,
canta triste a sua dor…
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Quando a bruma surge morna
e anuncia o fim do dia,
a saudade então se torna
a mais triste companhia.
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Quando a vida já findando,
vai levando a nossa história,
o passado vai lembrando
que o viver é uma vitória.
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Rosa flor, beleza ingrata,
nuance, perfume, cor!
Teu espinho que maltrata
mistura beleza e dor.
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Tão longe, triste soava
aquele som cristalino...
Era a saudade, chorava,
nas cordas do violino.
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Um dia a nossa amizade
em amor se transformou:
amor sublime, verdade,
que o tempo nunca apagou...
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Maria Helena Ururahy Campos da Fonseca, acadêmica fundadora do Ateneu Angrense de Letras e Artes e da Delegacia da UBT/Angra dos Reis, onde continua participando ativamente.

Presidiu o Ateneu Angrense de Letras e de Artes por dezessete mandatos (dois anos cada), alternadamente. Pertence, ainda, a outras instituições culturais. Integrou o Conselho de Cultura de Angra dos Reis de 1978 a 1991. Em 2007, retornou ao Conselho de Cultura, representando a setorial de Literatura.

Professora efetiva do Estado do Rio de Janeiro e do Município do Rio de Janeiro na área de Língua e Literatura Portuguesa. Exerceu o Magistério durante 47 anos. Durante a trajetória profissional dedicada ao Magistério, participou de cursos de especialização nas áreas pedagógica, linguística, literária e cultural.

Aposentada, participou do Curso de Extensão Cultural da Mulher, no Clube Militar do Rio de Janeiro, interrompido pela pandemia. Reside em Angra dos Reis.


Fonte:
Autores diversos da UBT-Angra dos Reis. Sementes poéticas. SP: Daya Ed., 2021.
Livro enviado por Jessé Nascimento.

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Cláudio de Capua (1945 - 2021)

 

 A derrota não me importa,
cumpro com o meu dever.
Do destino forço a porta,
sempre luto pra valer.
- - - - - -
Ah! Se eu tivesse saber,
se fosse poeta, escritor...
do poente ao alvorecer,
terias versos de amor...
- - - - - -
Ah! Você não vem! Não volta...
Eu, na saudade tropeço,
em noite que me revolta,
esperando o seu regresso.
- - - - - –
A métrica pondo à prova,
quatro versos eu componho
ao fazer mais uma trova
com tinta, papel e sonho!
- - - - - –
Ante a hora da partida,
nossa tensão se agiganta
e a despedida é contida
na voz presa na garganta.
- - - - - –
Ante ao talento me ajoelho…
E o teu talento invulgar,
tanto me serve de espelho
como me serve de altar.
(uma homenagem a Carolina Ramos)
- - - - - –
Ao ensinar Filosofia,
Sócrates, de vida sã,
ao fundar a Academia
fundou um novo amanhã.
- - - - - -
Ao faltar sua presença,
por amar muito você
a saudade cresce intensa
e dói, como não sei quê!
- - - - - –
Avisto do alto da serra
a pujança do sertão
e sinto orgulho da terra
que mora em meu coração!
- - - - - –
Busco a mulher, a beleza,
em meus delírios risonhos
trovador da natureza,
vou navegando em meus sonhos.
- - - - - -
Camafeu, nobreza pura,
seu retrato de perfil
tem no adorno da moldura,
clássico tom juvenil.
- - - - - -
Certo bispo ouve uma “história”
de um padre chamado Hilário
e grava, assim, na memória
um bom “Conto do Vigário”
- - - - - –
Chora a dor dos pinheirais,
no céu a estrela cadente,
são lágrimas siderais,
ante o machado inclemente.
- - - - - –
Com mensagem sempre nova,
transpondo mágoas e dor,
pelos caminhos da trova
planto sementes de amor.
- - - - - -
Da luz quero a beleza,
da lagoa quero o encanto,
das aves delicadeza,
de você, o acalanto.
- - - - - -
De “mau jeito” o Zé Baleia,
pescador de sorte estranha,
noivou com uma sereia,
casou com uma piranha..
- - - - - –
De união a nos dar prova,
cultivando novas flores,
cada dia cresce a trova
no canto dos trovadores!
- - - - - -
Do seu lar fazendo um templo,
menino, velho ou rapaz,
faz da vida um belo exemplo
quem trabalha pela paz!
- - - - - –
Em noite alta... madrugada,
contemplo a lua contrito
- Barca de prata aportada
nos segredos do infinito.
- - - - - -
É neste “Canto que eu Canto”
belezas que a vida tem
que ao meu mundo dão encanto
e tanto me fazem bem!
- - - - - –
Essa vida se resume
para o poeta, trovador
em essência de perfume
quando faz versos de amor.
- - - - - -
És meu aroma, ventura...
E nem sei bem mais o quê!
Só esse perfume em mim dura,
é porque o extrato é você.
- - - - - -
Esta foto é mais um fato,
que nos traz para o presente,
através deste retrato,
lembranças de antigamente.
- - - - - –
Êta... que coisa mais louca,
quero ter explicação:
Por que boca na boca
acelera o coração?!
- - - - - –
Eu cansei de minha andança,
fui banhar meus pés no mar
e voltei a ser criança,
Santos agora é meu lar...
- - - - - –
Eu faço uma descoberta,
sempre que vejo você,
é meu peito porta aberta
eu nem sei bem o porquê.
- - - - - –
Eu fico muito feliz,
quando escrevo a letra V
escrita, a lápis ou a giz,
pois o V... lembra você!
- - - - - -
Eu que te dei muitos beijos,
te fiz até suspirar,
agora sinto desejos
dos beijos que faltou dar!
- - - - - –
Há muitos dias de dor
e bem poucos de alegria:
se a vida não tem amor,
pode ser noite o meu dia.
- - - - - –
Imensidões veneráveis,
que me fazem navegar,
céu e mar, inseparáveis,
na linha do meu olhar.
- - - - - –
Jovem... tenha fé na terra,
seja valente e viril,
suba monte, desça serra,
não desista do Brasil!
- - - - - –
Lembrando minha lembrança,
vou escrevendo meus versos,
buscando alguma esperança
dentro dos meus Universos.
- - - - - -
Maldosa como ninguém,
boa figura na igreja,
acrescenta sempre "Amém"
quando aos outros mal deseja…
- - - - - –
Na angústia das mais estranhas,
estão chorando as cascatas:
são murmúrios das montanhas
refletindo a dor das matas.
- - - - - –
Na lágrima do meu verso,
nesta madrugada calma,
ao contemplar o universo
a brisa me embala a alma.
- - - - - -
Não te sintas ultrajada,
quando te olho tanto... o intuito
é provar que és muito amada
e que eu te desejo muito!
- - - - - -
Naquela ponta de galho,
com luz pura e fulgurante,
uma gotinha de orvalho,
brilha mais que um diamante!
- - - - - –
Nasci em dia abençoado
no charmoso oito de março
da mulher enamorado
meu orgulho não disfarço.
- - - - - -
Natal! E nessa Babel,
em que ninguém mais se entende,
onde está Papai Noel,
se brinquedo só se vende?!
- - - - - -
Nesta ilha tão formosa,
prisioneiro de ti vivo.
E que vida venturosa...
vivo em teus braços cativo!
- - - - - -
Nesta noite prateada
minha sombra, junto à tua,
vai trilhando a mesma estrada,
tendo por cúmplice a lua.
- - - - - –
Nestas trovas nosso aceno,
ao leitor desta revista,
e um ano bem mais sereno,
e muito mais otimista.
- - - - - -
No céu, estrelas e brumas,
alvo luar envolvente.
No mar...reprises de espumas
a embalar sonhos da gente...
- - - - - -
No dia a dia... na lida,
eu sustento a minha fé
na caminhada da vida,
mantenho o ideal de pé.
- - - - - -
Num momento...num segundo...
sob a luz... desse sorriso,
vivo bem longe do mundo,
bem perto do paraíso.
- - - - - -
O delegado Pereira…
Êta Pereira bacana,
- É de pouca brincadeira,
não dá pêra, só da “cana”!…
- - - - - –
O garçom ganha gorjeta,
o político propina.
Nesta terra de mutreta,
só tem ave de rapina.
- - - - - -
O joão-de-barro é um exemplo.
pode não saber gorjear,
Com tão pouco faz um templo,
ao erguer seu próprio lar.
- - - - - –
Olha! A noite é uma criança,
diz o refrão popular -
que sacode e balança
presa às tranças do luar.
- - - - - –
Palhaços de profissão?
Ah, Como é bom, fazem bem.
O triste é ter coração
e ser palhaço de alguém!
- - - - - –
Poeta de sonhos diversos,
vivo momentos tristonhos,
mas, ao escrever meus versos,
entro no mundo dos sonhos.
- - - - - –
Quando cantava o sertão,
nossa Inezita Barroso
encantava o coração
cantando num tom gostoso.
- - - - - -
Quando o amor se tem por lema,
numa trova que se lê,
mais belo fica esse tema,
se a trovadora é você.
- - - - - -
Quando o rei sol estorrica,
tortura, com seu clarão,
mais forte é aquele que fica
e dá valor ao seu chão!
- - - - - –
Quando tão bela, ela passa,
elegante, indiferente,
sua graça é uma desgraça,
tira a paz de muita gente.
- - - - - –
Querendo muito ganhá-la,
vivo para bem-querê-la...
No seu desejo de amá-la
sentindo o prazer de vê-la.
- - - - - -
Reflexo do nosso mundo
meus olhos, de tons instáveis,
guardam amor lá no fundo
de momentos memoráveis.
- - - - - –
República portuguesa,
ao ler a história descubro:
foi grande a tua proeza!
E viva "Cinco de Outubro!”
- - - - - -
Sempre alerta mocidade,
em permanente vigília,
defenda a brasilidade,
ame a Deus, Pátria e Família.
- - - - - –
Sempre feliz, a pulsar,
meu coração é um celeiro,
tem muito amor para doar,
nele cabe o mundo inteiro.
- - - - - –
Servidor da tributária,
bem “Severo”, sem igual,
ergue a saia à secretária,
por ser, de “rendas”, fiscal.
- - - - - –
Sobrevoando terras... mares...
Vinte e três de outubro - França!
Santos Dumont vence os ares
e une povos em aliança.
- - - - - -
Só por descuido é que a Helena
acabou por se casar…
Pois, pensou que Cibalena
fosse a pílula… Que azar!
- - - - - –
Só tem sorte, verdadeira,
o que vence frustrações,
e rompe a própria fronteira
em busca de soluções.
- - - - - –
Sou poeta e trovador,
a inspiração me transporta
às nuvens e, com amor,
nas nuvens minha alma aporta.
- - - - - –
Surpresa está na investida
de cada dobra de esquina,
na caminhada da vida
o destino nos ensina.
- - - - - –
Unindo a seresta ao verso
quero compor na amplidão.
Sou menestrel do universo,
em tardes de solidão.
- - - - - –
Voando entre nuvem...montanha...
sou Poeta e Aviador!
Minha ambição é tamanha,
navego em busca do amor!
- - - - - -
Você, mulher escolhida,
da rosa tem o perfume
e, no palco desta vida,
é minha musa, meu lume.
- - - - - –
Vou plantar, da frente ao fundo,
um belo quintal em flor,
o maior jardim do mundo,
pra perfumar nosso amor.

Fontes:
Revista Santos Arte e Cultura
Cláudio de Cápua. Retalhos de Imprensa. São Paulo: EditorAção, 2020.
http://www.de-capua.com/publicacoes.html (desativado)
Carolina Ramos (coord. e redação) A Trova: Raízes e florescimento - UBT. Santos: 3D Estúdio Editoração Gráfica, 2013.

domingo, 24 de outubro de 2021

Prof. Garcia (Caderno de Trovas) 2

 
Com meu cinzel afiado,
e o martelo do desgosto,
esculpi, amargurado,
a solidão do meu rosto!
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Da sorte, nunca lamente.
Ame a vida com seus ais,
que a sorte de muita gente
cresce em falsos pedestais!
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Dizem que a justiça é cega.
Não creio, é falsa premissa;
cega, àquele que se apega,
aos infiéis da justiça!
= = = = = = = = = = =

Em meio às indiferenças,
dar bons exemplos preciso,
jogando fora as ofensas
dentro da fonte do riso!
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Em silêncio, a tua rede,
com saudade, chora tanto,
que, do armador da parede,
respingam gotas de pranto!
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Enquanto, tu buscas rindo,
a paz do azul desse mar...
Eu busco esse abismo infindo
do verde do teu olhar!
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Eu amo as gotas serenas
do orvalho que beija a flor,
porque sei que são apenas
serenas gotas de amor!
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Eu ouço em tuas demoras,
vozes de outros rituais...
Na ressonância das horas
do martelar dos meus ais!
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Meu sertão não tem floresta,
é pobre o pó deste chão...
Mas esta paz que me empresta
me faz amar meu sertão!
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Não reclamo ante os escolhos,
nas trevas, mantenho a calma...
Quem tirou-me a luz dos olhos,
pôs luz e brilho em minha alma!
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Nesse casebre sem dono.
tive uma infância tão boa;
mãe, foi rainha sem trono,
papai, um rei sem coroa!
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No amor, há tanta afeição,
na família, há tanto bem...
Que os filhos dos filhos, são
netos, e filhos também!
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No mosteiro abandonado,
na solidão da clausura,
o silêncio é tão calado
que à solidão se mistura!
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Nos momentos mais tristonhos,
das ilusões mal sonhadas...
Sou tropeiro dos meus sonhos
tangidos nas madrugadas!
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Nosso amor teve a mistura
na dose certa, e depois...
Fomos viver, na ternura,
do eterno amor de nós dois!
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O mundo inteiro se arrasta,
sofre, lamenta e padece;
mas a crise não se afasta,
e em todo canto ela cresce.
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Pobreza dói mas não mata,
não faz vergonha a ninguém;
pobre, é quem tem ouro e prata,
mas quer ter mais do que tem!
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Por cicatrizes, marcado,
teu rosto guarda a virtude,
de um riso, lindo, poupado,
do tempo da juventude!
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Por longa que seja a espera,
calma, que tudo se alcança!
Enquanto houver primavera
não morre a flor da esperança!
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Quando acenaste, à distância,
vi, no teu gesto tristonho,
que um sonho de nossa infância
foi simplesmente, outro sonho!
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Se a avareza te angustia,
e a humildade te seduz...
Neste Natal que te guia,
tu serás luz de outra Luz!
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Sê feliz na caminhada,
esquece o bem que te fiz...
Nem sempre o fim de uma estrada
é o fim de quem foi feliz!
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Sei que a velhice me alcança;
e, entre uns sins e outros senões...
Enquanto houver esperança
vou cultivando ilusões!
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Toda Trova é linda flor,
flor que perfuma e inebria,
se a Trova é rosa de amor,
sou canteiro de poesia!

Fontes:
Francisco Garcia de Araújo. Cantigas do meu cantar. Natal/RN: CJA Edições, 2017.
Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livros enviados pelo trovador.

terça-feira, 28 de setembro de 2021

Argentina de Mello e Silva (Jardim de Trovas) 5


A fé é um fruto tão doce
que se Deus não existira,
se só mentira Ele fosse
seria o mundo mentira!
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A honra não é vaidade
nem mera conveniência.
É a nossa dignidade
num drama de consciência.
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Alma sedenta que peca
sem nada ao céu implorar,
é água turva que seca
e nem chega, nunca, ao mar.
= = = = = = = = = = =

Aos moços já não importa
a nossa compreensão,
que da sua à nossa porta
há léguas de solidão.
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A renúncia é a droga exata
para um amor que tortura.
Ela é o remédio que mata,
ela é o veneno que cura.
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Duas palavras no fundo
têm sempre o mesmo endereço;
se o amor é a vida do mundo
é o ódio o amor pelo avesso.
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Esperar o amor é triste.
Viver sem ele é sofrer.
Mas a dor maior que existe
é achá-lo e depois perder!
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Esperei-te tanto, tanto
felicidade — e nem vi
que o tempo passava, e enquanto
te esperava — envelheci!
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Há um abismo intransponível
entre a ambição desmedida,
e a medida do possível
na limitação da vida.
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Mistér na vida se faz
que a paz se anteponha à guerra.
Se o mundo tivesse paz
o céu seria na terra.
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Na grande metamorfose
dos atuais tempos seus,
o homem é uma simbiose;
serve ao diabo e ama a Deus!
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Na morte o sábio sorri
sorvendo a gota de fel;
deixando aos outros, de si,
a taça cheia de mel!
= = = = = = = = = = =

Não herdei ouro ou brasão,
nem ambiciono jamais
a não ser a tradição
de vossa honra, meus Pais !
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Nesta existência fugace,
águas do rio em descida
em cada folha que nasce
há uma vitória da vida.
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Ninguém foge, por mais forte,
de uma angústia dolorida,
ou pelo pavor da morte
ou medo da própria vida!
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O homem sofisma e erra
chamando a outro de "cão".
O cão não fomenta guerra
nem mata por ambição.
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Olho a luz do sol e o mar,
vejo a flor no chão nascer.
Que mais podes, Deus, me dar
pela glória de viver?
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Ó tu, rosa presumida,
que te alteias, ouve bem:
– A raiz vive escondida
e é dela que a flor provém!
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Por feliz eu tenho alguém,
que sem ter maior cuidado,
nunca invejando ninguém
por ninguém foi invejado!
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Por mais que o mundo te aclame
e glórias te oferte a esmo...
Não há ninguém que te ame
mais, no mundo, que tu mesmo!
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Quando a vida enfim se embebe
de uma paz bem merecida,
é que a gente se apercebe
que já está no fim da vida.
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Quando a vida me é pesada
e o céu um manto tristonho,
da triste angústia do nada
eu faço o tudo de um sonho
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Quando me acode à lembrança
a morte no seu segredo,
eu faço como a criança
que canta pra não ter medo.
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Quantas verdades o sábio,
— sendo sábio, não alcança.
E as põe Deus à flor do lábio
de uma inocente criança!
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Se a velhice é um desencanto
uma angústia, uma saudade...
por que se deplora tanto
quem morre na mocidade?
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Se razão não tens contigo
teu inimigo te diz;
que o coração de um amigo
é sempre o pior juiz!
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Trovas de amor eu não faço;
não sei fazê-las, não sei.
O amor é o mundo que abraço,
é a vida a quem tudo eu dei!

Fonte:
Argentina de Mello e Silva. Trovas dispersas. Curitiba/PR: Centro Paranaense Feminino de Cultura, 1984.

domingo, 26 de setembro de 2021

Professor Garcia (Poemas do Meu Cantar) Trovas – 11–


A cruz, por velha que seja,
no mais tristonho abandono...
Nem pensa quem te apedreja,
que, és a dor do eterno sono!
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Adeus, palavra tão breve,
dois fonemas; e, ademais...
se já dói em quem escreve,
em quem diz, dói muito mais!
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Ante os rumores de guerra
e em meio a tantos deslizes...
Ouço os murmúrios da terra
no clamor dos infelizes!
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A saudade, cor de arminho,
toda tarde se distrai;
chega e se arrancha em meu ninho
e do meu ninho não sai!
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De volta ao meu chão, sozinho,
a saudade se completa,
na voz de um redemoinho
com minha alma de poeta!
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Distante do filho ausente,
meu olhar, perdendo o brilho,
sinto a dor que o cego sente
por não poder ver o filho!
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Em meio a sobras e orgias,
a ganância continua,
e esquece as almas vazias
pedindo sobras na rua!
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Enquanto o ocaso sepulta
a cor rubra do poente,
o manto da noite oculta
o fim da tarde da gente!
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Enquanto o sol, não se acalma,
e, antes que a luz se desfaça;
parece até que tem alma
no sol de minha vidraça!
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Fiz essa ponte na infância
unindo nascente e foz,
para encurtar a distância
dessa distância entre nós!
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Meu olhar se for preciso,
querendo se desculpar...
Pede a esmola de um sorriso
que há no teu jeito de olhar!
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Nosso amor, não foi em vão;
vive ainda bem guardado,
na aliança em minha mão,
unindo o nosso passado!
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Num mundo carente e pobre,
para afastar tanta dor,
Deus pôs o sabor mais nobre,
na massa do pão do amor!
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Num velho rancho de palha
a vida não passa em vão;
sobra de amor se agasalha
numa esteira pelo chão!
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Nunca me causa empecilho
manter sempre um livro aberto;
mesmo fechado, meu filho,
mostra a luz com passo certo!
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O amor, que tudo conquista,
que afasta a cegueira e a dor,
faz com que cego de vista
enxergue a chama do amor!
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O encanto do teu sorriso,
e a minha dor, por enquanto...
Mostram-me a fonte do riso
ninando a fonte do pranto!
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Ouço o velho coração,
dizer segundo a segundo:
– Poupe o piso deste chão
que é terra de todo mundo!
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Pai, não herdei nada em vão;
e, ainda sinto, por suposto...
Em minha mão, tua mão
e o teu suor no meu rosto!
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Percebo, por teus deslizes,
que entre nós, algo incomum,
quer fazer dois infelizes,
sem haver motivo algum!
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Percebo que as mãos divinas,
logo após o entardecer,
fecham no céu, as cortinas
para a noite adormecer!
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Por vivermos tão distantes,
disfarço a minha alegria,
porque nem mesmo os amantes
são felizes todo dia!
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Quando a luz do sol declina,
a saudade se revela,
no choro da chuva fina
batendo em minha janela!
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Quando a trova não me acalma,
depressa a torno mais bela
pondo um pouco de minha alma
no corpo dos versos dela!
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Quando a voz, atrapalhada,
chega à fronte embranquecida;
são sinais da longa estrada
por todos nós, percorrida!
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Revendo a cartilha antiga
junto à velha tabuada...
Não sei qual foi mais amiga
nem sei qual foi mais amada!
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São tantas as evidências
em decisões desiguais...
Que o choro das indecências
põe nódoas nos tribunais!
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Se em meio a tantas ciladas,
há lamentos, pranto e dor;
que em vez de balas trocadas,
haja intercâmbios de amor!
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Sinto no infinito brilho,
da aurora, cor de maçã
que, a luz dos olhos do Filho,
brilha no Sol da manhã!

Fonte:
Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livro enviado pelo autor.

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Apollo Taborda França (A Trova e O Trovador)

A TROVA


A minha TROVA é silente,
toda de luz e calor...
Ponho na rima meu poente,
meu universo de amor!
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A TROVA boa, sentida,
fluindo com emoção...
é como a prece florida
que brota do coração!
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A TROVA etérea, maviosa,
Desperta suave emoção...
Quando fluente e ardorosa,
Fala-nos ao coração!
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A TROVA, graça divina,
de inspiração é repleta…
Surge da verve mais fina
e valoriza o poeta!
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A TROVA, graça suprema,
sintetiza e muito ensina...
Tem a luz de pura gema,
nos envolve e nos fascina!
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A TROVA não morre nunca,
retempera a humanidade...
e vence a tristeza adunca,
alegrando a mocidade!
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A TROVA que tem valor,
é muito simples, singela...
e diz um mundo de amor,
com tintas de uma aquarela!
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Cinco letras... Viva a TROVA!
Quatro linhas... de verdade;
Poesia se renova
e ganha longevidade!
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De TROVAS uma revoada,
pra alegrar o nosso ambiente…
O verso é muito, é nada,
mas, deixa-nos bem contente!
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Para fazer boa TROVA,
verso puro que se integra,
cuide a rima, como prova,
e respeite bem a regra!
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Poesia?... Salve a TROVA,
Quatro versos de estatura.
O poeta põe á prova,
com o denodo e cultura!
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Quem falou que a TROVA é dura,
sem valor, um tanto azeda?...
Pois que certa ela perdura,
se consagra de vereda!
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Quem tem estro e tem cultura
e se inclina à poesia,
vai na TROVA com lisura,
cheio de graça e estesia!
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Recrudesce a bela TROVA,
para a glória da Cultura;
Poesia põe à prova
o bom senso, em miniatura!
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Sempre no pequeno frasco
é que está a grande essência…
e a TROVA traz no casco,
o rigor dessa exigência!
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Sete sílabas por cima
e ideia sempre nova,
com cadência e boa rima,
numa quadra... bela TROVA!
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TROVA tem aura dileta,
enebria o pensamento.
É magia do poeta,
arroubo do seu talento!
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TROVA tem sabedoria,
é tão fértil como a terra…
Bons conceitos ela cria,
pelas verdades que encerra!
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Uma TROVA de cadência,
conteúdo e expressão.
Precisa de inteligência
e muita reflexão!
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Uma TROVA pra ser boa,
expressiva, universal…
na mensagem que apregoa
mostra cultura e moral!
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Uma TROVA... um belo tema,
pra dizer o que se quer;
sendo um poeta da gema,
inspira-se... na mulher!
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Você tem tristeza n'alma?
Esqueça! Não se apoquente...
Tente a TROVA, que ela acalma,
retempera a nossa mente!
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O TROVADOR

Eu sinto as trovas nas veias,
meu sangue todo alvoroço...
Verso me envolve nas teias.
meu coração é de moço!
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Por trovador eu me esmero,
no rito de bem compor...
Nas minhas trovas sou mero,
puro instrumento do amor!
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Ser trovador, uma graça,
é bênção que cai do céu...
Nas rimas ele bem traça,
de sua glória o troféu!
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Sou trovador e entendo
a rima, em forma de flor...
e tal qual um reverendo,
só rezo trovas de amor.
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Sou trovador sem remendo,
O verso meu é de cor...
Vou com assombro dizendo
as minhas trovas de amor!
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Sou trovador, tenho senso
da importância da poesia...
Encerra tudo o que penso,
realidade e fantasia!
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Sou trovador venturoso,
amo a vida por demais...
Da infância lembro meu gozo.
Da juventude meus ais!
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Sou trovador venturoso,
conheço desse fulgor...
Trovar de modo charmoso
sobre a mulher, com sabor!
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Trovador que demais ama,
passa momentos terríveis...
Trova loucuras na cama
e sonha coisas incríveis!
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Trovo porque me dou bem,
no ritmo, rima e cesura...
Meus versos como requiém,
rebrilham lá pela altura!

Fonte:
Apollo Taborda França. Trovas maravilhosas.
Curitiba/PR: O Formigueiro, 1986.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Argentina de Mello e Silva (Jardim de Trovas) 4


Amor! Relíquia tão rara,
ao relógio se aparenta:
com pouca corda ele para,
com muita corda... arrebenta!
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Aprende, amigo, a fingir
com quem não te sabe amar.
Não faças ninguém sorrir
com a dor que te faz chorar.
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Democrata ou social
— qualquer um que os povos tomem,
sempre o regime ideal
é o valor real do homem!
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É mais pobre do que o pobre
que disso tem sentimento,
o rico quando "descobre",
que o é por merecimento.
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Eu me sinto alienada
dos bens que a vida contém.
O tudo no mundo é nada,
e o nada é tudo também!
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Folha que segue a torrente
à sorte desconhecida.. .
É assim a vida da gente
e há tanto orgulho na vida!
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Há muita verdade omissa
na justiça que anda aí.
Em nome dessa justiça
quanta injustiça eu já vi!
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Hoje que o mundo é um deserto
de moral, de paz, de fé...
a gente procura o certo
mas já nem sabe o que é!
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Liberdade ! Os que propalam
o teu valor que constrói,
são os mesmos que se calam
quando a força te destrói.
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Mais ostentas teu orgulho
mais de ti eu tenho dó.
És como um dourado embrulho
por dentro cheio de pó.
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Menina feia, chorosa,
alegra teu coração.
Nem sempre a mais linda rosa
foi o mais lindo botão.
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Na hecatombe da montanha
tem o mundo o seu retrato;
tanto grito, tanta sanha,
"e a montanha expele um rato".
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Não esqueça um só segundo
de honrar a vida que tem.
Só o viver neste mundo
não enaltece ninguém!
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Neste mundo quem quiser
ter amor — precisa amar!
Mas o amor como Deus quer,
quem, no mundo, pode dar ?
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No mundo não esqueçamos
que os bens encontrados cá,
bem pouco tempo os guardamos:
a vida empresta — não dá !
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O homem — esse vagabundo
que é um gigante e um pigmeu,
busca mundos, e o seu mundo
ele jamais entendeu!
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Os males que não se espera
sorrateiros advêm.
E a gente se desespera
por outros que nunca vêm !
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Ostente com sobriedade
o muito que você tem.
Que também é caridade
não humilhar a ninguém.
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Para que o homem pudesse
sublimar sua alma nua,
foi mister que Deus lhe desse
a mesma Cruz que foi Sua !
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Para ser grande, serena,
um bom conselho segui;
fui me fazendo pequena,
quanto menor — mais cresci!
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Seja sempre enaltecida
a caridade de quem,
tendo bem pouco na vida,
divide o pouco que tem.
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Se na reta do teu mundo
qualquer nuvem te ameaça...
não recues um segundo:
para... olha... escuta e.. passa!
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Sofrimentos todos têm.
A paz nem sempre se alcança.
Mas, nunca se viu ninguém
vivendo sem esperança!
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Uma caridade há
que de vaidade se embebe.
Exalta àquele que dá,
humilha quem a recebe.

Fonte:
Argentina de Mello e Silva. Trovas dispersas. Curitiba/PR: Centro Paranaense Feminino de Cultura, 1984.

sábado, 17 de julho de 2021

Cônego Benedito Vieira Telles


 1
A esperança também gera
o mal que a saudade tem,
quando a gente vive à espera
do sonho que nunca vem.
2
Amigo, qual tenra planta,
tem de ser bem cultivado.
Se outro valor se levanta,
você pode ser trocado...
3
A neve nos pinheirais,
nestas paragens do Sul,
forma brincos de cristais
na terra da gralha azul.
4
À sua mesa haja o pão,
partilhe-o com quem não tem.
Reparta-o com o irmão,
que não o falte a ninguém.
5
Às vezes, no entardecer,
prateia a lua as ramagens.
Velha árvore a fenecer...
Com ela, as frescas aragens!
6
A trova, menor poesia,
síntese da inspiração.
São sete pés de maestria,
que medram no coração!
7
A trova não envelhece,
assim é toda a poesia.
É perene como a prece,
imortal a cada dia!
8
A vida é dura, renhida,
porém tem muita poesia.
Faço parte da torcida
da esperança a cada dia.
9
Cidade do coração,
tens meio milhão de amores,
tu és a ‘Cidade Canção’,
Maringá, urbe das flores!
10
Coração de mãe é grande,
infinito como o amor.
Sua ternura se expande
como o perfume da flor!
11
Em vez de bombas, canhões,
fome, miséria, orfandade,
que se unam os corações
na paz da fraternidade!
12
Frondosa árvore, bendita,
que antepassados plantaram.
Árvore alegre, bonita,
de ti saudades ficaram!
13
Há festa no céu, na Terra,
foi a maior deste Mundo,
nos mares, rios e serras...
Natal, mistério profundo!
14
O domingo é do Senhor,
dia pascal do cristão.
Vamos ao altar do Amor
enriquecer-nos do irmão.
15
O homem foi feito perfeito,
à semelhança de Deus;
às vezes, fico sem jeito
de não ser igual aos meus.
16
Ontem falara às estrelas,
e sussurros seus ouvia.
Foi difícil entendê-las!...
Novo dia em cantoria.
17
Ouvir e ver as estrelas,
sonhara, enfim, o profeta.
Se Bilac falou com elas,
vale a pena ser poeta!
18
O vento farfalha a copa,
da árvore, folhas e flores,
e a ave o ninho envelopa
para abrigar seus amores.
19
Pode entrar. A casa é sua,
sempre me traz alegria.
Ao sair, esta é a rua...
se puder, volte. Bom dia!
20
Por que não curtir saudade,
que é parte do nosso ser?
– Saudade não tem idade,
fica em nosso entardecer.
21
Pra que possa haver perdão,
estenda a mão o ofensor
ao ofendido – e do irmão
cure a dor com muito amor.
22
Quanto mais a idade avança,
no longo tempo a correr,
eu tenho mais esperança
e mais prazer em viver...
23
Quisera ter coisas novas
escritas, mas tudo em vão.
Só encontrei algumas trovas
no escrínio do coração.
24
Quisera ter tantas vidas
pra levar a Paz e o Bem.
Lancei sementes nas lidas...
agradeço a Deus. Amém!
25
Receba, de coração,
o que posso repartir:
à mesa, um pouco de pão,
e a alegria de sorrir.
26
Rústico curral bovino,
maternidade do Amor.
– No corpo de um Deus-Menino,
nasceu-nos o Salvador.
27
Sai o hábil semeador
e lança a boa semente.
Chamado pelo Senhor,
planta-a na alma da gente.
28
Senhor, neste amanhecer,
louvo a tua criação:
da aurora ao entardecer,
eu te encontro em meu irmão.
29
Sigo minha trajetória
pelos caminhos, cantando.
No coração, trago a história
desde que O segui, sonhando.
30
Traz-me a árvore lembrança
dos verdes anos, agora.
Como foi bom ser criança,
com meus sonhos desde a aurora.
31
Tudo o que é criado passa,
porque tudo é contingente.
Deus sempre, com sua graça,
renova a vida da gente.
32
Uma prece eleve a Deus,
com fé peça hoje a cura
para alguém junto dos seus
e cure essa criatura.
==============================
Cônego Benedito Vieira Telles nasceu no Distrito de Campo Místico, hoje, cidade e comarca de Bueno Brandão/ MG, em 1928. Filho de pais católicos praticantes, Luiz Vieira Telles e Maria da Conceição Telles. Eram doze irmãos. Aos domingos, íam à Missa na Matriz de São Bom Jesus da Pedra Fria, igreja em que foi batizado, crismado, fez Primeira Comunhão. Nesta matriz rezou a Primeira Missa solene, em 1960, em Ação de Graças pelo chamado ao sacerdócio.
 
Em 1945, entrou no Seminário dos padres da Congregação Salesiana, em Lorena – SP. Concluídos os estudos de Filosofia e Teologia no Seminário Maior São José, Rio de Janeiro – DF, foi ordenado sacerdote por dom Jaime Luiz Coelho, em 1960, na primeira catedral de madeira, cujo bispo de Maringá ordenava-lhe o primeiro padre da diocese.

Foi nomeado vigário coadjutor da catedral, Secretário do Bispado, Chanceler da Cúria Diocesana. Implantou pastorais na catedral: catequese paroquial e nas escolas, Obras das Vocações Sacerdotais, cujas vocações floriram. Ia mensalmente às capelas dos distritos de Maringá, zonas rurais, para dar-lhes assistência espiritual. Fundou o Movimento Familiar Cristão e outros. Foi nomeado Cura da Catedral de Maringá. Pároco por quase nove anos. Foi transferido para a paróquia de Inajá. Depois, pároco em Guairaçá, Atalaia, comunidades desta arquidiocese. Exerceu o magistério de Direito na Universidade Estadual de Maringá até a aposentadoria e Unicesumar.

Colaborou na Folha do Norte do Paraná, imprensa diocesana e outras obras, que constam em Livros Tombos das paroquiais que administrou.


Fontes:
Trovas obtidas nos Boletins de Trovas "Trovia", de A. A. de Assis.
Biografia adaptada obtida da Arquidiocese de Maringá, em 2016.
http://arquidiocesedemaringa.org.br/noticias/695/60-anos-da-arquidiocese-de-maringa-conheca-a-historia-do-conego-benedito-vieira-telles

sexta-feira, 16 de julho de 2021

Professor Garcia (Jardim de Trovas) - 1 -

 

Amor! Quem no amor se esmera
faz da existência sofrida,
um riso de primavera
e esquece as mágoas da vida!
= = = = = = = = = = =
 
Ante os seus atos incertos,
Pilatos, viu ante a cruz...
Jesus, de braços abertos,
enchendo o mundo de luz!
= = = = = = = = = = =
 
Ao longe, escuto o cicio
de um canto triste e plangente;
é a voz cansada de um rio
chorando as dores que sente!
= = = = = = = = = = =
 
A saudade se resume
no sisudo ritual,
desse silêncio sem lume
da solidão outonal!
= = = = = = = = = = =
 
De volta à igrejinha antiga,
vi minha infância tão bela...
Cantando a ancestral cantiga
no altar da mesma capela!
= = = = = = = = = = =
 
Dou meu conselho ao mais velho
num breve e simples resumo:
Segue a estrela do evangelho
que a luz da treva é sem rumo!
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Enquanto a lua se arruma
abre a janela e se alteia...
A onda escreve de espuma
hieróglifos na areia!
= = = = = = = = = = =
 
Eu começo a perceber
que a saudade se completa,
nas horas do entardecer
do coração de um poeta!
= = = = = = = = = = =
 
Eu guardo os sons e os afetos,
com os quais, mamãe me embalava;
e hoje, eu embalo os meus netos
com as canções que ela cantava!
= = = = = = = = = = =
 
Mãe! O amor com que me aqueces,
e acende a luz que me guia,
se eu fosse pagá-lo em preces
seriam cem mil por dia!
= = = = = = = = = = =
 
Mãe - três letrinhas, só três,
e em qualquer outro alfabeto,
gênio nenhum, nunca fez
palavra com tanto afeto!
= = = = = = = = = = =
 
Meus versos, entre os aflitos,
se escondem da lua cheia;
porque versos mais bonitos
a espuma escreve na areia!
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Na infância, a gente nem sente,
quanto o tempo nos desgasta;
mas como desgasta a gente,
depois que a infância se afasta!
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Na infância, essa tez bonita!
Na velhice, não há fuga;
nem se escondendo, se evita
a mão da primeira ruga!
= = = = = = = = = = =
 
Não precisa pressa alguma,
para a vida mais ditosa;
o sol, sem pressa nenhuma,
pinta a tarde cor de rosa!
= = = = = = = = = = =
 
Num ranchinho abandonado,
no insensível desengano,
vive um sonho do passado
na bonequinha de pano!
= = = = = = = = = = =
 
O rio, arrastando o entulho,
sem reclamar do que sente,
mostra a violência do orgulho
que entulha o peito da gente!
= = = = = = = = = = =
 
Ó, sonho de amor de outrora,
te procuro tanto em vão,
que nem sei mais por quem chora
esse velho coração!
= = = = = = = = = = =
 
Parte a jangada!... E, ante a bruma,
entrega os sonhos plebeus,
aos braços do mar de espuma
e aos remos das mãos de Deus!
= = = = = = = = = = =
 
Por mais que não me respondas,
te pergunto, ó velho mar:
– Se não pões almas nas ondas,
quem faz a onda chorar?
= = = = = = = = = = =
 
Prendi meus olhos, naqueles
olhos verdes, tão risonhos;
nem pensei que o riso deles
fosse a prisão dos meus sonhos!
= = = = = = = = = = =
 
Quando a jangada se lança
aos sopros dos vendavais,
enfrenta o mar, na esperança,
de sempre voltar ao cais!
= = = = = = = = = = =
 
Quem luta e crê não se cansa,
por mais que a vida se oponha;
que a crença, é a própria esperança
da paciência de quem sonha!
= = = = = = = = = = =
 
Se a velhice nos impede
dos sonhos da mocidade...
Essa distância se mede
pelos passos da saudade!
= = = = = = = = = = =
 
Sinto em velhas madrugadas,
que entre nós dois sempre a sós,
conversamos de mãos dadas
e há solidão entre nós!
= = = = = = = = = = =
 
Só depois que o sol desmaia,
deixando o céu mais aflito,
a orquestra da tarde ensaia
seus arranjos no infinito!
= = = = = = = = = = =
 
Tempo, por que me envelheces,..
Não vês que a melancolia
é a mais sofrida das preces
que se reza ao fim do dia?!...
= = = = = = = = = = =
 
Velhos sonhos andarilhos!...
Hoje, cercados de afetos...
Vivem presos aos meus filhos
e aos carinhos de meus netos!

Fonte:
Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livro enviado pelo autor.

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Luiz Damo (As Faces da Trova) - 2 -


A flor, quando desabrocha,
quase deixa de ser flor,
pra se transformar em tocha
aspergindo aroma e cor.
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A morte exige passagem
para à vida subtrair
o colorido da imagem
e a esperança do porvir.
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A vida pede socorro
nas estradas da existência,
contra a falta de decoro
e excesso de prepotência.
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De volta para o passado
movido pela saudade,
vemos o homem, apressado,
perder sua identidade.
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Dos bons momentos vividos
raramente alguém esquece,
dos maus e dos mais doídos
qualquer alma se entristece.
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Entre o anil do firmamento,
aonde o sol, fulgente, impera,
da nudez do chão cinzento
brota a vida e prolifera.
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Frente à tumba do passado
prostrado chora o descrente,
por ver sendo sepultado
um pouco do seu presente.
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Hoje, o ser humano investe,
na aparência, com excesso,
como se o que come e veste
fossem fontes de sucesso.
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Não permita que a vaidade
se sobreponha à virtude,
ambas crescem com a idade
mas conflitam amiúde.
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Não te iludas com as flores
que encontrares nos caminhos,
por trás das vistosas cores
podem esconder espinhos.
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Na vida tens dois caminhos,
num deles deves optar
e o que tem menos espinhos
escolhe pra caminhar.
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No altar onde há tradição,
cultivá-la, pode ser,
muito mais que obrigação
um santo e nobre dever.
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Numa taça de água fria
não deprecia quem dá,
mas refresca de alegria
alguém que com sede está.
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Nunca faças de um fracasso
do sucesso, a sepultura,
porque o teu próximo passo
pode ser o da ventura.
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O presente nos revela,
uma vida, igual façanha,
mais a imagem que foi dela
e aquela da sua entranha.
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O presente planejado
não se assusta do futuro,
povo que não tem passado
imerge em porvir escuro.
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Ouvindo o choro do vento
minha alma se contorcia,
não via, mas seu lamento,
era igual ao que eu sentia.
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Pelas frinchas da janela
aonde refulge a manhã,
a estrela numa olhadela
entra em forma de espiã.
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Pode haver alguém que diga
com toda a sinceridade,
na maldade, quem se liga,
não terá a felicidade.
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Que jamais o ser humano,
venha um dia ser lesado,
por vingança ou por engano
muito menos desprezado.
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Que tem vida após a morte,
diz a fé, ela existe, sim!
Quem na vida tem um norte
não deve temer o fim.
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Se a pedra o caminho veda
e até lhe faz sucumbir,
por que não fazer da queda
um degrau para subir?
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Se à regra tens a exceção
e adotá-la, até te alegra,
não faças dela uma ação,
nem da exceção tua regra.
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Sempre, à noite, quando deito,
sonho em poder despertar,
com o arquétipo refeito
no entusiasmo de lutar.
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Sempre que nuvens espessas
sob o firmamento abundam,
fazem jorrar às avessas
águas que as terras fecundam,
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Se nos jardins se acastelam
flores que exalam perfumes,
juntas brindam, mas revelam,
nos espinhos, seus ciúmes.
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Sonhamos que o bem retorne
a nós sempre que o perdemos,
colhemos frutos, conforme,
as plantações que fizemos.
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Tem muita gente que faz
de um simples ventilador
um tornado forte e audaz
com poder destruidor...
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Tudo na vida são fases
com diferentes matizes,
algumas mais eficazes
e outras bem menos felizes.
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Tudo passa nesta vida,
se não fosse, perde a graça!
Quando a paz lhe for tolhida,
cresce a dor que nunca passa.

Fonte:
Luiz Damo. As faces da trova. Caxias do Sul/RS: Ed. Do Autor, 2021.
Livro enviado pelo autor.

segunda-feira, 12 de julho de 2021

Luiz Damo (As Faces da Trova) - 1 -

A amizade é joia rara,
nem sempre tem sido assim,
para quem nunca zelara
só resta chorar seu fim.
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À força que o vento tem
tudo agita, treme ou cai.
Ninguém sabe donde vem
tampouco para aonde vai.
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Antigamente, à partilha,
mais valor era agregado,
o amor que unia a família
hoje, está quase apagado.
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À paz, caminhas sorrindo,
sempre buscando a igualdade,
enquanto vais, Deus vem vindo,
pra abraçar a humanidade.
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Basta uma oportunidade
para o talento aflorar,
misto de audácia e vontade
faz o sonhador vibrar.
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Cada passo dado à frente
não tenha dois pra voltar,
melhor andar lentamente
que correr e não chegar.
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Com a noite não se iluda,
se nela a luz não permeia,
à noite a lua não muda
a não ser, de nova à cheia.
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Desce a noite e cobre a tarde
espalhando a nostalgia,
igual a um braseiro que arde
na última brasa do dia.
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Deus mantenha sempre unido
todo o grupo familiar,
filhos, esposa e marido,
num aconchegante lar.
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Do silêncio mais profundo
que alguém deseja provar,
seja o silencioso mundo
do seu ser a questionar.
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Dos projetos mais serenos
que acalentas em teu ser,
sejam grandes ou pequenos
são frutos do teu viver.
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Em constantes mutações
o mundo, hoje, se apresenta,
fruto das "revoluções",
ou das pedras que ele enfrenta.
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Frente à flor despetalada
o beija-flor nem lastima,
Diz: – Volto noutra florada,
pra buscar matéria prima.
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Lá, na torre, o sino toca,
pra oração da Ave Maria,
frente à noite nos coloca
no final de mais um dia.
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Mesmo que a morte cessasse
de o medo, no homem crescer,
fá-lo advir desde que nasce,
se estendendo até morrer.
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Não basta olhar-se de frente
movidos pela emoção,
olhe o casal, firmemente,
sempre à mesma direção.
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Não deixe as trevas crescerem
em tamanho e intensidade,
tampouco, a vida envolverem,
no lençol da obscuridade.
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No tilintar do badalo
o estrondo quase estremece,
cresce à medida que o estalo
retumba e depois fenece.
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Num campo todo florido
vejo mais que o seu fulgor,
sinto o mundo renascido
e um futuro promissor.
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Nunca falte o pão na mesa
nem a vontade de obtê-lo,
tendo a fonte à natureza
quem o obtém possa comê-lo.
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Nunca seja acomodado.
nem desafie o perigo,
pois, caminhando ao seu lado,
pode estar um inimigo.
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O elevador sobe e desce
sem a menor distinção.
Pede que ele te obedece
sem reclamar da missão.
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O filho nunca envelhece
face os seus diletos pais,
sempre um bebê lhes parece,
quando envelhece, jamais.
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Os mais sublimes valores
sempre deves cultivar,
para não colher horrores
nas lavouras do teu lar.
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O sol, com seus raios fartos,
brilhando de dia, atua,
o homem pra dormir, tem quartos,
diferentes dos da lua.
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Quem não come o que apetece
come mal ou passa fome,
não comendo o ser padece
e o corpo assim se consome.
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Saudade, fruta colhida,
nos pomares do passado,
seu sabor, espelha a vida,
refletida ao nosso lado.
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Saudade, se torna o fruto,
quase nunca adocicado,
guardado em estado bruto
no celeiro do passado.
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Se a dor se tornar aguda
difícil de suportar,
peça a Deus a Sua ajuda
para o dilema enfrentar.
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Teimosia e intransigência,
o embrião da petulância,
semelhantes pela essência,
berço eterno da arrogância.
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Verdes lençóis estendidos
na forma de parreirais,
fonte de vinhos, servidos,
em nobres cerimoniais.

Fonte:
Luiz Damo. As faces da trova. Caxias do Sul/RS: Ed. Do Autor, 2021.
Livro enviado pelo autor.

domingo, 11 de julho de 2021

Argentina de Mello e Silva (Canteiro de Trovas) 1


Amor! RelÍquia tão rara,
ao relógio se aparenta:
com pouca corda ele para,
com muita corda... arrebenta!
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Aprende, amigo, a fingir
com quem não te sabe amar.
Não faças ninguém sorrir
com a dor que te faz chorar.
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Democrata ou social
— qualquer um que os povos tomem,
sempre o regime ideal
é o valor real do homem!
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É mais pobre do que o pobre
que disso tem sentimento,
o rico quando "descobre",
que o é por merecimento.
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Eu me sinto alienada
dos bens que a vida contém.
O tudo no mundo é nada,
e o nada é tudo também!
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Folha que segue a torrente
à sorte desconhecida.. .
É assim a vida da gente
e há tanto orgulho na vida!
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Há muita verdade omissa
na justiça que anda aí.
Em nome dessa justiça
quanta injustiça eu já vi!
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Hoje que o mundo é um deserto
de moral, de paz, de fé...
a gente procura o certo
mas já nem sabe o que é!
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Liberdade ! Os que propalam
o teu valor que constrói,
são os mesmos que se calam
quando a força te destrói.
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Mais ostentas teu orgulho
mais de ti eu tenho dó.
És como um dourado embrulho
por dentro cheio de pó.
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Menina feia, chorosa,
alegra teu coração.
Nem sempre a mais linda rosa
foi o mais lindo botão.
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Na hecatombe da montanha
tem o mundo o seu retrato;
tanto grito, tanta sanha,
"e a montanha expele um rato".
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Não esqueça um só segundo
de honrar a vida que tem.
Só o viver neste mundo
não enaltece ninguém!
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Neste mundo quem quiser
ter amor — precisa amar!
Mas o amor como Deus quer,
quem, no mundo, pode dar ?
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No mundo não esqueçamos
que os bens encontrados cá,
bem pouco tempo os guardamos:
a vida empresta — não dá !
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O homem — esse vagabundo
que é um gigante e um pigmeu,
busca mundos, e o seu mundo
ele jamais entendeu!
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Os males que não se espera
sorrateiros advêm.
E a gente se desespera
por outros que nunca vêm !
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Ostente com sobriedade
o muito que você tem.
Que também é caridade
não humilhar a ninguém.
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Para que o homem pudesse
sublimar sua alma nua,
foi mister que Deus lhe desse
a mesma Cruz que foi Sua !
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Para ser grande, serena,
um bom conselho segui;
fui me fazendo pequena,
quanto menor — mais cresci!
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Seja sempre enaltecida
a caridade de quem,
tendo bem pouco na vida,
divide o pouco que tem.
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Se na reta do teu mundo
qualquer nuvem te ameaça...
não recues um segundo:
para... olha... escuta e.. passa!
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Sofrimentos todos têm.
A paz nem sempre se alcança.
Mas, nunca se viu ninguém
vivendo sem esperança!
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Uma caridade há
que de vaidade se embebe.
Exalta àquele que dá,
humilha quem a recebe.

Fonte:
Argentina de Mello e Silva. Trovas dispersas. Curitiba/PR: Centro Paranaense Feminino de Cultura, 1984.

quarta-feira, 30 de junho de 2021

Luiz Gonzaga da Silva (Trova e Cidadania) Fome e Miséria


Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. 
Quando pergunto por que eles são pobres, me chamam de comunista 
[Dom Helder Câmara).

A fome aniquila o ser humano, alucina consciências, gera desespero. A fome rouba a honra e a altivez do homem, que sem forças para a luta entrega-se à languidez e assim é acusado de preguiça. Josué de Castro em seu livro Geografia da fome mostra bem este indesejável fenômeno.

A geografia da fome
mostra a distância traçada
entre quem tudo consome
e quem não consome nada.
Gonzaga da Silva - RN

Eu sei de uma negra cruz,
de tão negra não tem nome:
essa que o pobre conduz
pelo calvário da fome.
Sebastião Soares - RN

A tristeza me consome
diante desta crueldade!
A violência da fome
dizimando a humanidade.
Reinaldo Aguiar - RN

A miséria por capricho
sai bem cedo vasculhando...
Mexe mil latas de lixo
volta de mãos abanando.
Minervino Wanderley - RN

É o abuso da riqueza
e o desprezo à educação
que põe sobre a nossa mesa
a fome, em lugar do pão.
Sônia Sobreira da Silva - RJ

Poderosa, ela se ajeita
e entre o bem e o mal permeia
a infame fortuna feita
à custa da fome alheia...
Divenei Boseli - SP

Quando a miséria se ajeita,
na ausência d'água e de pão,
faminta a fome se deita
na esteira que forra o chão!
Prof. Garcia - RN

A miséria devora os seres humanos. A miséria crônica é uma patologia social que poderia e deveria ser evitada. Mas como evitar a fome se os Estados preferem gastar com armamentos? Não podemos deixar de lembrar o título completo do livro de Josué de Castro: Geografia da fome: o dilema brasileiro - pão ou aço. Parece que o mundo prefere mesmo o aço.

A fome que o mundo assola
tem raízes na injustiça:
o pobre vive de esmola
sob o jugo da cobiça!
Angélica Villela Santos - SP

A arma mais poderosa
que o homem já inventou
foi esta fome horrorosa
que a tantos já dizimou.
Gonzaga da Silva - RN

O triste da caminhada,
na longa estrada da vida,
é ver a fome estampada
em tanta gente excluída!
Hermoclydes Siqueira Franco - RJ

Não pode haver raciocínio
quando a miséria, sem nome,
invade qualquer domínio
e o domina pela FOME!...
Hermoclydes Siqueira Franco - RJ

Se o teu riso é de grandeza,
vaidade que te consome,
- olha bem para a tristeza
do pranto de quem tem fome.
Fernando Câncio - CE

Sentir fome e não comer
porque não tem condição
pode mesmo comover
quem tem duro coração.
Aracy da Silveira Cavalcante - CE

Mas como se comover se em geral a fome em sua forma mais terrível está longe dos nossos olhos? Nossos amigos não passam fome, nossos vizinhos não passam fome, no meio social que frequentamos não vemos ninguém passando fome... Os meios de comunicação não mostram os bolsões de fome, preferem mostrar o "progresso" das vitrines... É como diz o provérbio: O que os olhos não veem o coração não sente! Só mesmo uma convulsão social drástica para alertar o mundo.

As revoltas não têm fim
e explodem cada vez mais,
que a fome acende o estopim
das convulsões sociais!
João Freire Filho - RJ

Treme o mundo e se consome
ao som de um terrível brado:
- o grito que sai com fome
da boca do ínjustiçado!
A. A. de Assis - PR

Metade da humanidade
infelizmente não come;
e não dorme a outra metade,
temendo os que passam fome,
Geraldo Amâncio - CE

Há mil gritos e protestos
na fila ingente da fome,
onde a migalha dos restos
não chega pra quem não come!
Delcy Canalles - RS

Hoje a fome encontra abrigo
nos campos de plantação...
Violência é plantar o trigo
e não ter direito ao pão,
Arlindo Tagen - MG

Quando os muros da opressão
enfim forem derrubados,
o mundo terá mais pão
e menos injustiçados.
Gonzaga da Silva - RN

Fonte:
Luiz Gonzaga da Silva (org.). Trova e Cidadania. 
Natal/RN, abril de 2019.

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...