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domingo, 18 de dezembro de 2016

Apollo Taborda França (1926 - 2017)




1
A beleza da mulher
tem aura de alacridade…
Como a flor, um bem-me-quer,
inspira a fidelidade!
  2    
 “Água mole em pedra dura”
   – No ditado popular…
  “Tanto bate até que fura”,
  não se tem o que negar!
   3
   A minha trova é silente,
    toda de luz e calor…
 Ponho na rima meu poente,
   meu universo de amor!
    4
  “A moda não incomoda”
 clama incauta a sociedade...
 Enquanto isso corre a roda
   e se esvai a probidade!
   5
    Amor à primeira vista,
   das loucuras a maior…
  Nos abaixa muito a crista
  e nos cega, o que é pior!
6
“Amor com amor se paga”,
 que emotiva sensação…
No coração sempre há vaga,
  pra atender esse refrão!
  7
   A silhueta do Pinheiro
é expressão de elegância…
Tão bela como um cruzeiro,
  se destaca na distância!
  8
A Trova boa, sentida,
fluindo com emoção…
 É como a prece florida
  que brota do coração!
   9
A Trova não morre nunca,
Retempera a humanidade
e vence a tristeza adunca,
 alegrando a mocidade!
  10
  A Trova que tem valor
 é muito simples, singela…
 E diz um mundo de amor,
com tintas de uma aquarela!
11
Aves grandes e pequenas,
  de refulgentes roupagens...
 Cores que vão às centenas,
 celebrizando as plumagens!
 12
Borboletas, aves, flores,
 que bem nutrem os florais...
  Dão contornos às silhuetas
   Dos esbeltos pinheirais!
    13
Cada página da vida,
Faz lembrar um grande amor...
É você, minha querida,
  a que guardo com fervor!
   14
Cai a tarde, fico triste,
pressuroso como o quê...
O coração não resiste
a saudade de você!
      15
   Com garra de trovador,
vou seguindo meus caminhos...
Venturoso e com amor,
  num roseiral sem espinhos!
 16
 Coração que ama não chora
males que afligem a gente;
 exalta e nunca deplora
  a mágoa dura, pungente!
17
Curitiba é chão de amores,
  toda feita de candura…
 O seu perfume é de flores,
 Deus namora lá na Altura!
 18
 Das rosas do meu jardim,
 Maria sempre a mais bela...
perfuma mais que o jasmim,
 que floresce em torno dela!
19
 “Devagar se vai ao longe”,
 mas, não parar é preciso...
Usar a calma de um monge,
  a cautela e o bom juízo!
  20
 Disse adeus à virgindade,
 optou, em seus dilemas...
Quis amar com pouca idade:
 – Está cheia de problemas!
21
  Dizem “espeto de pau”
  para a casa do ferreiro...
Que enriquece o seu mingau,
 tendo “prata” o ano inteiro!
 22
   E no afã da economia,
 “Barato sempre sai caro”...
  Pãodurismo, que mania,
 só nos leva ao desamparo!
23
E “Quem planta vento colhe
   tempestade" pela vida...
  Se aniquila qual um molhe
   que perdeu sua medida!
    24
  Eu sinto as trovas nas veias,
  meu sangue todo alvoroço…
  Verso me envolve nas teias,
   meu coração é de moço!
    25
 Há exceção em toda a regra,
      o sistema é flexível…
Pois, que a vida assim se alegra,
   nada ficando impossível!
    26
 “Mais vale quem Deus ajuda”
   na vertigem da semana...
 “Do que quem cedo madruga”
 sempre queimando a pestana!
 27
Melhor fora não amar,
não ficaria à mercê...
Não seria mais vulgar,
de pensar tanto em você!
   28
    Meu coração é valente,
não chora o mal que me fez...
E diz que bem de repente,
termina a sua altivez!
 29
Minhas trovas são pingentes,
   incrustadas no aranhol…
    São idéias imanentes,
   lindas gemas sob o sol.
    30
   Na limpeza e na saúde,
  os sucessos dessa lida…
   Valorizam certo, amiúde,
    as asperezas da vida!
     31
  Não cantes loas ao Chefe,
  sofrerás qual um proscrito,
    levarás um tal tabefe,
   pois, assim está escrito!
    32
  Nossa marca é o Pinheiro,
  soberano sobre a mata…
   É esbelto, sobranceiro,
  seu murmúrio uma sonata!
  33
  O bem não dura sem fim,
como o mal também não dura…
    Então, vivamos assim,
  na amizade e na brandura!
  34
    O teu sorriso menina
  é feiticeiro demais...
   Tão forte qual vitamina,
 muito alvoroça meus ais!
35
Página triste da vida,
não se guarda na lembrança...
Sim, aquela bem querida,
que nos trouxe a esperança!
 36
    Para fazer boa trova,
  verso puro que se integra,
  cuide a rima, como prova,
   e respeite bem a regra!
    37
   “Para quem ama o feio
     o bonito lhe parece”...
   Por bondade é galanteio,
   com nobreza é uma prece!
  38
  “Para um bom entendedor,
   só meia palavra basta”...
   Para ele um grã-louvor,
por ter compreensão bem vasta!
39
 Poeta diz sempre o que quer,
na verdade ou de impulsão...
 Tenho certeza e assim penso,
com você e sem vaidade!
 40
Por trovador, eu me esmero,
   no rito de bem compor…
 Nas minhas trovas sou mero,
  puro instrumento do amor!
  41
   Pra você vencer na vida,
  ter vitória assim perfeita…
   Leve a sério a sua lida,
   esta é a melhor receita!
    42
Quando a gente ama não sente,
  o mal que fazem prá nós
 Escondemos d' alma silente,
   num secreto albornoz!
     43
“Quem espera sempre alcança”,
   é hoje outra a verdade…
   Quem espera só se cansa
   e perde a oportunidade!
    44
 Quem falou que a trova é dura,
 sem valor, um tanto azeda?…
  Pois que certa ela perdura,
   se consagra de vereda!
    45
 Quem tem estro e tem cultura
    e se inclina à poesia,
   vai na Trova com lisura,
  cheio de graça e estesia!
46
 Que reluz nem sempre é ouro,
 que cai nem sempre balança…
  Por isso, chega de agouro,
  não percamos a confiança!
   47
  Sempre no pequeno frasco
 é que está a grande essência…
   E a Trova traz no casco,
     o rigor dessa exigência!
     48
  Sempre “o santo desconfia
quando a esmola é por demais”...
 Refinada hipocrisia,
    a ilustrar nossos anais!
     49
 Sempre que nos cessa a calma,
    falta-nos a educação…
   A rudeza nos fere a alma,
     martiriza o coração!
       50
    Sete sílabas por cima
com idéia sempre nova,
e cadência, boa rima,
numa quadra…a bela Trova!
  51
    Sou trovador e entendo
   a rima, em forma de flor…
   E tal qual um reverendo,
    só rezo trovas de amor.
52
Sou trovador sem remendo,
   o verso meu é de cor…
 Vou com assombro dizendo
 as minhas trovas de amor!
 53
 Sou trovador, tenho senso
 da importância da poesia:
 Encerra tudo o que penso,
realidade e fantasia.
    54
Sou trovador venturoso,
conheço desse fulgor…
Trovar de modo charmoso
sobre a mulher, com sabor!
55
Trova tem aura dileta,
enebria o pensamento…
É magia do poeta,
arroubo do seu talento!
   56
Trova tem sabedoria,
é tão fértil como a terra…
Bons conceitos ela cria,
pelas verdades que encerra!
57
Trovas são um doce encanto,
delicadas por demais…
Nelas vibro, com espanto,
no calor dos meus florais.
58
Uma Trova de cadência,
conteúdo e expressão…
Precisa de inteligência
e muita reflexão!
    59
Uma Trova…um belo tema,
Pra dizer o que se quer;
Quando o poeta é bom, da gema,
Inspira-se…na mulher!
     60
Você quer boa saúde,
com perfeita digestão?…
Mastigar bem, é virtude,
esta a nossa sugestão!
     61
Vale mais do que um troféu.
é letra favorita,
DECISIVA e dá apogeu;
Valoriza toda escrita.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Hermoclydes S. Franco (1929 - 2012)



1
A bengala cor da paz,
que o homem cego conduz,
tem um mistério que faz
o som transformar-se em luz!
2
Abraça o tempo que corre,
na rapidez em que avança,
que um bom momento não morre,
acaba sempre em lembrança!
3
A emoção é bailarina,
num palco azul de ilusões...
Se Deus a fez feminina,
tinha lá Suas razões.
4
A fraqueza é um artifício
que leva alguém, sem escalas,
a abrir as portas do vício
e não saber mais fechá-las!...
5
A inspiração é uma fada,
com varinha de condão...
Quando toca a musa, amada,
há poesia em profusão!...
6
Ante a maçã do pecado
na dúvida, vou sofrendo:
- Se como... sou castigado;
se não como... me arrependo!
7
A sereia que amanhece
lá na praia, solitária,
faz lembrar, ao que parece,
nossa musa imaginária!...
8
Às vezes, troféus de glória
e incensos de aduladores
podem fazer da vitória
o ocaso dos vencedores!...
9
A verdade que redime
não viveria de luto
se a mentira fosse crime,
e, enfim, pagasse tributo!…
10
A vida é a fada-madrinha
que, ao ver nosso intenso flerte,
deu-me, em toque de varinha,
o prazer de conhecer-te!
11
A vida é dura batalha
que não aceita um "talvez"
e nem outorga medalha
aos filhos da timidez!
12
"Cantar na Chuva" eu quisera
aquela canção bonita
que em performance sincera
Gene Kelly nos incita!..."
13
Carregado de esperanças
e atropelando a saudade,
lá vai meu “trem de lembranças”
buscando a felicidade!...
14
Cigano de olheiras fundas,
pele morena, crestada,
quantas tristezas profundas
já deixaste pela estrada?
15
Com efeitos especiais,
meus sonhos mostram, em tela,
os teus encantos reais
na mais bonita aquarela!...
16
Com talhadeira e martelo,
finas madeiras entalho...
E esse trabalho é tão belo
que já nem sei se é trabalho!...
17
Das emoções a mais grata,
que vale por um tesouro,
é ver coroada em prata
trajetória escrita em ouro!...
18
Deixaste, pai, um vazio
que nem preciso explicar
pois que foste sempre um rio
correndo para o meu mar!…
19
De Noel Rosa a lembrança
sempre traz grande emoção:
– Saudade que vive mansa,
com “Feitio de Oração”!... 
20
De subidas e descidas
a vida, esse desencontro,
nos faz viver várias vidas
na emoção de cada encontro.
21
Dizem que todo baixinho
tem mania de grandeza...
Por isso é que o meu vizinho
só chama a mulher... de “alteza”!…
22
Em busca do bom Santiago
caminho, enfrento a neblina,
e me sinto, assim, bem pago
em minha fé peregrina!...
23
Em privação de sentidos,
em teus braços perfumados,
donhei sonhos não vividos...
Vivi sonhos não sonhados...
34
Era uma vez... A saudade
da meiga MÃE que ensinava,
na minha infância, a verdade
nas histórias que contava!…
35
Eterno dominador,
eu me curvo ao teu fascínio.
E, em vez de ser teu senhor,
entrego-me ao teu domínio!...
36
Eu, no rumo das gaivotas
no mar rendado de espumas,
dentre centenas de rotas,
busco o roteiro em que rumas…
37
Foi a escolha mais amarga
que entristeceu os meus feitos,
pondo a saudade tão larga
nos meus ombros tão estreitos...
38
Galera envolta em espumas,
navega a lua, no céu,
num mar de nuvens e brumas,
pescando estrelas ao léu!...
39
Lembrando o triste momento
em que, a chorar, foste embora,
Julgo ouvir na voz do vento
minha própria voz que chora...
40
Livro aberto expande a luz...
Quem ama o bom livro, jura
que a leitura é que conduz
aos caminhos da cultura! 
41
Maravilha em resplendor,
onde Deus sempre é louvado,
o RIO guarda o Senhor
no Cristo do Corcovado!
42
Minha MÃE, frases serenas,
seus conselhos e bondades
tornaram bem mais amenas
minhas sofridas saudades!…
43
Minhas mãos, barcos sem velas,
em carinhosos desvelos,
navegam, quais caravelas
na noite dos teus cabelos!
44
Na distância, ao teu aceno,
Quanta tristeza me invade:
- O trem ficando pequeno
E, em mim, crescendo a saudade!...
45
– Na infância risonha e bela,
fui navegante revel,
na fantasia singela 
de um barquinho de papel...
46
Na linda macarronada
que juntos compartilhamos,
houve um "fio-de-meada"
em que, a sorrir, nos beijamos!...
47
Na luta pela conquista
do melhor que a via encerra,
sou um simples pacifista:
“Faço o amor, não faço a guerra”.
48
Não há na História senão
um poder discricionário
que prende quem rouba um pão
e leva um santo ao Calvário!...
49
Não há rosa sem espinhos…
…e na procura da glória,
são as pedras do caminho
que dão valor à vitória.
50
Não há sonho mais bonito
nem mentira mais falaz
do que o amor infinito
que a vida jamais nos traz!
51
Não julgues a alheia sorte
pelo brilho do brasão:
– A luz que brilha mais forte
tem mais curta duração...
52
Não pode haver igualdade,
nem sonhos sobrevividos,
quando morre a liberdade
no grito dos oprimidos...
53
Não pode haver raciocínio
quando a miséria, sem nome, 
invade qualquer domínio
e o domina pela FOME!...
54
Nas mensagens de prazer,
carteiro, nas tarde mansas,
tens o condão de trazer
o renascer de esperanças...
55
Navegantes de Cabral
deram, num sonho febril,
ao pequeno Portugal
a dimensão do Brasil!...
56
Na vida, eterna procura,
buscando a felicidade.
Faltou-me, sempre, em ventura
o que sobrou em saudade! ...
57
Noel, em tarde tranquila,
compondo um samba sutil,
fez o “Feitiço da Vila”
enfeitiçar o Brasil!...
58
No “grande prêmio” da vida,
é vencedor, sem igual,
quem usa o Bem, sem medida,
desde a largada ao final!...
59
No meu sonho, em bela imagem,
neste meu destino incerto,
seu recado foi miragem
e apagou-se em meu deserto!…
60
No pranto em forma de riso,
disfarcei a minha dor...
Mesmo à sombra de um sorriso,
cabe o ocaso de um amor!..
61
Nos meus dias de criança,
nem sempre pude sorrir...
Mas vive, em mim, a esperança
na luz azul do porvir!…
62
Nossas sombras, abraçadas,
sob a luz do luar risonho,
atravessam madrugadas
em busca do mesmo sonho!
63
Nosso romance é um tesouro
de amor, de luz e carinho,
escrito com letras de ouro
em folhas de pergaminho!...  
64
O grau de felicidade
que tenho e me faz risonho,
resulta da minha idade
ter a idade do meu sonho!
65
O meu sonho é folha morta
que a ventania desfaz,
no inverno, que desconforta,
das minhas noites sem paz!...
66
O que dói em meu desgosto,
que me rouba a paz e a calma,
não são as marcas no rosto,
são as cicatrizes na alma!...
67
O tempo é um Deus invisível,
com poderes infinitos,
que ao passar, irreversível,
destrói quimeras e mitos!...
68
Quando as folhagens de outono
atapetam meus caminhos,
o bucolismo dá sono
e eu sonho com teus carinhos!...
69
Quando o horizonte e o infinito
escondem o teu vulto amante,
eu me pergunto num grito:
- Qual dos dois é mais distante?...
70
Quanta gente de talento
passou a vida e não fez
do amor seu grande momento
por causa da timidez...
71
O triste da caminhada,
na longa estrada da vida,
é ver a fome estampada
em tanta gente excluída!
72
Para espantar minha dor,
eu passo a vida a cantar,
sabendo que mal de amor
ninguém consegue espantar...
73
Rendeira, à luz das candeias,
vai vencendo nostalgias,
sentindo que ficam cheias
as suas noites vazias...
74
Respeitados os anéis
quando beijar for proibido
por avisos ou painéis,
o amor estará perdido!...
75
São Paulo, com amizade,
oferece o que preciso,
pois, se estou na Liberdade,
logo ali é o Paraiso!…
76
Sempre acaba a tirania
- entre firmes desagravos –
na força da rebeldia
e na ousadia dos bravos!
77
Sem preconceito ou pudor,
mas de emoções verdadeiras,
grandes momentos de amor
não delimitam fronteiras!...
78

Sigo a vida, noite e dia,
sem rumo... desencontrado...
Eis que a minha biografia
parece letra de fado!...
79
Sofro tanto a tua ausência
e é tão grande o meu cansaço
que o sonho em minha existência
tem vida e não tem espaço...
80
Sou como um velho veleiro,
velas rotas, mastro torto,
que um destino aventureiro
não deixa parar no porto!...
81
Tenho o meu coração preso,
em gaiola singular:
Teus braços onde, surpreso,
aprendi o verbo amar!
82
Tenho um cão chamado THÉO,
grande amigo, inseparável...
Ao meu lado, está no céu
e eu me sinto invulnerável!
83
Terminado o encantamento,
só restou a indiferença
de um calado sofrimento
marcando sempre presença!
84
Teu amor é o suave açoite
que eu desejo, em calmaria:
– Como o dia busca a noite...
Como a noite busca o dia!
85
Trago tantas emoções
nas minhas canções serenas
que, quando canto as canções,
vivo de emoções, apenas!...
86
Tu foste, na minha vida,
tempestade que passou...
Neblina descolorida
que alguma nuvem deixou!...
87
Vacila o meu coração,
na dúvida mais intensa,
entre seguir a razão
ou fazer o que ele pensa...
88
“Vai ver se estou lá na esquina!”
E o gajo diz “é pra já”...
Vai e volta e, então opina:
- Não estás lá... estás cá!...        
89
Versejando à luz difusa,
se o sentimento me inspira,
eu te elejo a doce musa
que há de tanger minha lira!...
90
ALCATRA: Carne de boi;
boa de panela ou tacho.
ALCATRÃO: Se não é, foi
o conhaque do borracho.

domingo, 11 de dezembro de 2016

Francisco José Pessoa (Fortaleza/CE, 1949 - 2020)

1
A cobiça sendo um vício
e a renúncia salutar,
nosso menor sacrifício
é saber renunciar.
2
Aconteça o que aconteça
eu nunca vou desistir…
por trás da nuvem espessa,
tem sempre um sol a sorrir!
3
À minha mulher confesso:
- Na atual encarnação,
para apressar teu progresso
sou a tua expiação!
4
Aquele pé de carvalho
plantado em minha lembrança,
cintila gotas de orvalho
quando me vejo criança.
5
À tardinha, todo dia,
assisto o chegar do trem,
esperando por Maria
só que Maria não vem.
6
A poça d’água na rua
de repente se prateia…
espelho tosco da lua
em noite de lua cheia.
7
As estrelas não fenecem
perante à luz que encandeia,
mas docemente adormecem
se a noite é de lua cheia.
8
De forma vil, ilusória,
o falaz aos ventos, berra,
cantando sua vitória
sem ter terminado a guerra!
9
Eis o grande desafio
para quem se diz cristão:
ter que dizer, renuncio,
em favor de um outro irmão!
10
É quando a noite se enluta
envolta em intenso véu,
que a estrelinha diminuta
empresta luz para o céu.
11
 Esplendor tens, de tal monta,
quando passeias na praça,
que a lua se esconde, tonta,
atrás da nuvem que passa.
12
Esta vidinha da gente
tal a serra é mesmo assim…
ora subida ou vertente
num sobe e desce sem fim.
13
“Faça-se a luz”! e ao fazê-la
com muito amor e carinho,
Deus colocou uma estrela
a clarear meu caminho.
14
Feliz da vida se logra
o Zeca exibe o caneco,
que ele trocou pela sogra
na feira de cacareco.
15
Homem com muitos trejeitos,
mulher com muita feiúra
para mim são dois defeitos
que nem com reza tem cura!
16
Já que não posso mantê-las
ao alcance do meu braço,
eu canto minhas estrelas
em cada verso que faço.
17
Mãe é palavra seleta
por si só uma obra prima,
pois mesmo o maior poeta
procura e não acha rima!
18
Mesmo que lhe desagrade,
dentre os sabores prefira
o amargo de uma verdade
ao doce de uma mentira.
19
Meus sonhos por si navegam
levando-me ao transcendente,
por mil estradas enxergam
bem mais do que enxerga a gente.
20
Minha mãe, quanta lembrança,
quem me dera tal jaez…
eu voltar a ser criança
começar tudo outra vez.
21
Minhas lágrimas vertidas
por entre dobras de rugas,
são saudades incontidas
do meu passado... são fugas!
22
Na avenida do fracasso
onde a humanidade avança,
em cada esquina que passo
eu planto um pé de esperança.
23
Não há placa de chegada
na minha estrada da vida…
faço de cada parada
novo ponto de partida.
24
Na solidão com frequência
escutamos uma voz…
deve ser nossa consciência
querendo falar por nós!
25
 Nas veredas tortuosas
dessa vida em desalinhos,
nas retas eu colho as rosas
nas curvas tiro os espinhos.
26
Noel Rosa, quem diria,
sem cigarro e sem chapéu,
chegou só, sem parceria,
pra fazer samba no céu.
27
Noitinha volto da roça
e Rosa com seu pudor,
apaga a luz da palhoça
pra gente fazer amor.
28
Nos quatro dias de Momo
ante tanta bebedeira,
eu estarei, não sei como,
quando chegar quarta-feira!
29
Nossas faces, pergaminho,
rastro do tempo que, algoz,
não apagou o carinho
que ainda existe entre nós!
30
Nossa vida não tem prazo
e tal o dia, é assim:
um surgimento, um ocaso,
que por acaso é sem fim!
31
Nos trigais do sentimento
que contra o vento eu transponho,
cozi o pão sem fermento
no forno quente de um sonho.
32
O amor seria fecundo
como tal se espalharia,
se toda mãe que há no mundo
tivesse um nome…Maria!
33
O intenso amor que nos une
e nos completa, querida,
faz a nossa vida imune
às incertezas da vida.
34
O inverno se me avizinha
e, no espelho, a contragosto,
vejo que o tempo caminha
deixando o rastro em meu rosto.
35
O meu amor quis safar-se
de mim, então me escondi;
de rosa era seu disfarce…
fui, sorrateiro, e a colhi!
36
O nosso amor passageiro
tal orvalho evaporou…
nasceu e morreu ligeiro,
que nem saudade deixou.
37
 O pó que emana do giz
e o salário sem valor,
tornam bem mais infeliz
a vida do professor!
38
O sentimento de culpa
se esconde na consciencia
de quem fere e se desculpa
a suplicar inocência.
39
Os gritos de liberdade
abafados por censuras,
viram ecos de piedade
nos porões das ditaduras.
40
O sol, gigante centelha,
torna-se mais colossal,
quando nascendo se espelha
nas águas do pantanal.
41
Por mais que em ti não pensasse
uma lágrima escorria,
irrigando a minha face,
onde eu plantei nostalgia.
42
Por sofrer tantos açoites
nos meus momentos tristonhos,
pus redoma em minhas noites
para prender-te em meus sonhos
43
Quando o sol arquiva o dia
e o expediente se encerra,
ecoa a Ave-Maria
nos escritórios da serra!
44
Quantos banquetes regados
a vinho, trufa e salmão…
quantos irmãos relegados
sem água, sem luz, sem pão!
45
Quem diz ter brilho e alardeia
desdenhando o semelhante,
esquece que a lua cheia
tem seus dias de minguante!
46
Quem faz da vida um disfarce
e finge viver a esmo,
de tudo pode safar-se
mas não engana a si mesmo!
47
 Quem não quer vencer a estrada
como faz o peregrino,
dobra sempre a esquina errada
na contramão do destino.
48
Saudade é o tempo guardado
dentro do peito da gente...
Nó que se dá, no passado,
e se desfaz no presente.
49
Sem usar pincel ou tinta
apenas com seu clarão,
a lua cheia repinta
as veredas do sertão.
50
Soluça vazia, a rede,
o armador emudeceu,
marcas de pé, na parede,
choram tanto quanto eu!…
51
Subo às nuvens… fantasia…
e para o amor espalhar,
solto minha poesia
com rimas soltas ao ar.
52
Todo indivíduo que é tolo
mas que de sábio se arvora,
é tal um pão sem miolo…
só tem a casca por fora!
53
Vai estudante, buscar
conhecimento fecundo
pois, és a pedra angular
na construção do teu mundo!

Adaucto Soares Gondim (Pedra Branca/CE, 1915 - 1980, Fortaleza/CE)

1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono. 2 A dor que minha alma corta de mane...