sexta-feira, 3 de março de 2017

Hegel Pontes (1932 - 2012)


1
A honra é uma imagem casta
dentro do espelho do Bem:
- Se a gente dele se afasta
ela se afasta também...
2
A lágrima comovida
que vem de dentro de nós,
é uma palavra sofrida
que chega aos olhos sem voz.
3
A quiromante não lia,
ao fazer a predição,
que o destino me daria
justamente a sua mão.
4
A voz dos ventos distantes,
dentro das conchas do mar,
são preces de navegantes,
que não puderam voltar.
5
Cidade Poema, eu queria,
 já que a fonte não se esgota,
 beber o encanto e a poesia
 que até de seu nome brota.
6
Como a gaivota perdida,
que o vento arrasta nos braços,
perdi o rumo da vida,
quando seguia teus passos.
7
Com que ironia o destino
 pode este quadro pintar:
 De um lado, um lar sem menino;
 de outro, um menino sem lar.
8
Conversas de marinheiros
 ouço nas conchas do mar.
 São almas de jangadeiros
 que não puderam voltar.
9
Depois da falsa meiguice
e dos falsos beijos seus,
“Adeus”; sem graça, ela disse,
e eu disse: - Graças a Deus!
10
É noite em nossa favela
e o vento, em leve rumor,
apaga a chama da vela
e acende a chama do amor.
11
Felicidade, és somente
meu horizonte fugaz:
quando dou um passo à frente
dás um passo para trás...
12
Inconstante como o vento,
o tempo não nos perdoa:
Se vamos mal, ele é lento;
se vamos bem, ele voa!
13
Jogou, perdeu, e hoje sabe,
vivendo um natal sombrio,
que a consciência não cabe
num sapatinho vazio.
14
Longe de tudo, sozinho,
após tantos vendavais,
eu sou um velho moinho,
que o vento não move mais…
15
Madrugada… e tens no olhar
estrelas a refulgir.
- Fecha os olhos, devagar…
que elas precisam dormir.
16
Não julgues pelo semblante
A honra alheia, meu filho:
- Na lua, a face brilhante
oculta a face sem brilho!
17
Nesta noite nordestina,
quando o luar me arrebata,
é lindo ver a salina,
toda banhada de prata.
18
No beco dos infelizes,
se houver saída, me aponte:
- quem vive sob as marquises
não vê céu nem horizonte...
19
Noel Rosa, esse talento,
partiu da Vila tão cedo…
Mas, por Noel, canta o vento
e dança até o arvoredo.
20
O cego, na estrada escura,
vai tateando... e sua mão
parece que faz ternura
na face da escuridão!
21
O drama da despedida
foi termos, ambos, notado
tua lágrima fingida
e o meu sorriso forçado...
22
O sino é um ser sem razão,
que não tem razão de ser:
quando pára um coração,
ele começa a bater...
23
Partiste e chovia tanto!…
mas entendi na saudade
que a leve gota de um pranto
molha mais que tempestade.
24
- Pescadores, foi milagre!
E o fanfarrão se gabava:
- Só a foto do meu bagre
mais de dez quilos pesava
25
Quando a vejo sobre o monte,
qual pipa vagando ao léu,
pego a linha do horizonte
e empino a lua no céu!
26
Quando é puro o sentimento,
quem faz o bem, faz de graça
e é discreto como o vento
que move o moinho e passa…
27
Quando sai de madrugada,
sabe o filho a direção,
se o pai deixou pela estrada
suas pegadas, no chão.

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