1
A amizade mais o amor
cultivar bem que eu tentei.
Mas quanta praga, Senhor,
deu nos jardins que plantei!
2
Aquela? Que bom partido!
Além das rendas que tem,
é boa no bom sentido
e do outro jeito também.
3
As suas cartas, senhora,
releio-as de quando em vez.
Mas nelas só vejo agora
os erros de português...
4
Às vezes fico a pensar
que minha alma ainda é menina.
Uma garota a brincar
num casarão em ruína.
5
Canta um galo. Já distingo
um clarão lá no nascente.
mais um dia... mais um pingo
de tempo a pingar na gente.
6
Com ar assim de quem sonha,
filosofava uma cobra:
- Ah! se eu tivesse a peçonha
que na alma dos homens sobra!
7
Com ares de gozação,
ele à colega dizia:
- Essa tua promoção
foi reza mesmo, Maria?
8
Como funcionária a Elvira
produz pouco, é negligente.
Mas como a esperta se vira,
terminado o expediente!
9
Cuidai dos ricos, Senhor,
protegei-os mais de perto,
que aos pobres a própria dor
ensina o caminho certo!
10
Dizes que sentes por ela
apenas amor carnal.
- Com mulher tão magricela,
melhor dirias - ossal!
11
Do nosso encontro, Tereza,
naquela segunda feira.
Minha alma saiu ilesa,
o estrago foi na carteira.
12
Ela, arrependida, ao cura,
sem outra desculpa, disse:
- Era a noite tão escura,
que eu pensei que Deus não visse!
13
Enquanto o bar está cheio
de risos e alacridades,
eu, sonhando, pastoreio
meu rebanho de saudades.
14
Enquanto o mar lambe a areia
com volúpia, devagar,
de ciúmes a Lua cheia
chora prantos de luar.
15
"Era uma santa!" - dizia
o viúvo, olhando o caixão.
Mas, perto, alguém malicia:
- Agora, sim. Antes, não.
16
Esbelta, leve no andar,
calor mostrando também,
vem ela. E eu fico a pensar:
que puro-sangue ali vem!
17
Escuta, fonte, não sigas
jamais os caminhos meus.
Tuas quedas são cantigas,
as minhas... pergunta a Deus.
18
Esta engrenagem, que é a vida,
esmaga a todos, sem dó.
E a gente, aos poucos, moída,
de novo volta a ser pó.
19
"Fizeram-te mal, Leonor?"
- indaga, atento, o legista.
E ela, com o rosto em rubor:
"Conforme o ponto de vista..."
20
Foi-se a sogra. E o cenário
é bem outro no meu lar.
Até meu velho canário
voltou de novo a cantar.
21
Há dois tipos de mulher
que a nossa vida atormenta.
- Aquela que não nos quer
e aquela que a gente aguenta.
22
Ia triste. De repente,
uns olhos negros, risonhos,
deixaram na minha mente
uma ninhada de sonhos.
23
Infeliz não é o que chora
de inveja ou amargo rancor.
É o que vai por vida a fora
sem uma história de amor.
24
Mais bebo, mais me angustio,
tamanha é a dor que me invade.
- Sou planta de beira-rio,
numa enchente de saudade!
25
Maria, com jeito e graça,
de meu cigarro reclama.
Mas não é pela fumaça,
é pela cinza na cama.
26
Morre um doutor. Cena forte.
Porém, nesse triste instante,
quem mais chora é a própria Morte,
que perdeu seu ajudante...
27
Mulher correta é a Maria.
Correta e boa também.
- Fazendo o que não devia,
ela não deve a ninguém...
28
Mundo de gente que chora...
Mundo de gente sofrida...
E o Tempo fincando a espora
na besta magra da vida...
29
Não queira jamais um caso
resolver lá na Jutiça.
É prazo, prazo e mais prazo;
e, mais que prazo, é preguiça...
Na tarde cinzenta e fria,
quê de tristezas no ar!
Bate um sino... Ave-Maria...
Ah! se eu soubesse rezar!
29
Nesta vida, mar revolto,
onde a carne em ânsias grita,
quando o demônio anda solto,
toda mulher é bonita.
30
Nesta vida que se arrasta,
tão cheia de coisas loucas,
há mulheres de mil castas,
mas castas mesmo, há bem poucas!
31
Nordeste. Vai longo o estio.
Quanta tragédia traduz
o leito seco de um rio
e à beira dele urubus!
32
Nunca vi coisa mais louca
do que os teus olhos, Maria.
Como brilham quando a boca
da noite devora o dia!
33
Os dois brigaram por ela.
E como saiu pancada!
- Por causa de uma costela,
quanta costela quebrada!
34
O sol, ao romper do dia,
olha a Terra em festival,
sem saber que essa alegria
ele a trouxe em seu bornal.
35
Ó tu que vives por baixo,
se subires sê decente.
Não sejas como o riacho
que faz misérias na enchente.
36
Para a minha alma sofrida
quisera apenas um bem:
o de ir brincando com a vida,
enquanto a morte não vem.
37
Pernas tortas, magricela,
e de biquíni na praia!
- Você não sabe, Isabela,
que falta lhe faz a saia!...
38
Por essa vida, aos esbarros,
sigo só por meu caminho.
Sou como um desses cigarros,
que vai queimando sozinho.
39
Por que gargalhas, coruja,
lá nas grimpas do telhado?
Alegra-te a noite suja
de tanto vício e pecado?
40
Qual a sua opinião
sobre a nova professora?
- Pela aparência, um canhão,
pela voz - metralhadora.
41
Quando o sol descamba além
e os sinos soltam lamentos,
intrusa, a saudade vem
despertar meus pensamentos.
42
Quando vinhas caminhando,
disse alguém com grande humor:
"Eis um pecado passando
em busca de um pecador.
43
Que a esmola que dás ao pobre
seja sempre aos olhos teus
apenas um gesto nobre,
nunca um empréstimo a Deus.
44
Que luta quando eu a vejo
tão tentadora e inocente!
Já viu respeito e desejo
brigando dentro da gente?
45
Que mulherzinha apressada!
Outra assim eu não conheço.
Nem espera ser cantada,
vai dando logo o endereço.
46
Quer sejam feias ou belas,
das mulheres fujo sim.
Das feias - de medo delas.
Das belas, medo de mim.
47
Regra, filho, o teu viver
para não teres a mágoa
de ver que o falso prazer
num mar de tédio deságua.
48
Revendo a velha cidade
onde deixei meu umbigo,
qual cicerone, a saudade
é quem passeia comigo.
49
Roteiro duro o da vida!
Tem setas bem indicadas,
mas quanta gente perdida
em suas encruzilhadas!
50
Sempre que o Dr. Clemente
fazia uma operação,
ocoveiro, previdente,
ficava de prontidão!
51
Sem rumo, triste, mofino,
segue o rebanho pastando.
Quem pastoreia é o Destino.
De cima Deus fica olhando.
52
Trovador procuro, aflito,
o belo em temas diversos,
sonhando ver o infinito
amarrado em quatro versos.
53
Tua sorte, companheiro,
à de mais ninguém se iguala:
tens saúde, tens dinheiro...
e uma mulher que não fala!
54
Uma estátua, um monumento
que lembre amor e carinho?
- Uma mulher no momento
de amamentar seu filhinho!
55
Vai o boi, dando de duro,
com o velho carro que chia.
Soubesse de seu futuro,
tanto esforço não faria.
56
Vejo-o sempre em meu caminho
e invejo-lhe a placidez.
- Ensina-me a ver, ceguinho,
a Vida assim como vês!
A amizade mais o amor
cultivar bem que eu tentei.
Mas quanta praga, Senhor,
deu nos jardins que plantei!
2
Aquela? Que bom partido!
Além das rendas que tem,
é boa no bom sentido
e do outro jeito também.
3
As suas cartas, senhora,
releio-as de quando em vez.
Mas nelas só vejo agora
os erros de português...
4
Às vezes fico a pensar
que minha alma ainda é menina.
Uma garota a brincar
num casarão em ruína.
5
Canta um galo. Já distingo
um clarão lá no nascente.
mais um dia... mais um pingo
de tempo a pingar na gente.
6
Com ar assim de quem sonha,
filosofava uma cobra:
- Ah! se eu tivesse a peçonha
que na alma dos homens sobra!
7
Com ares de gozação,
ele à colega dizia:
- Essa tua promoção
foi reza mesmo, Maria?
8
Como funcionária a Elvira
produz pouco, é negligente.
Mas como a esperta se vira,
terminado o expediente!
9
Cuidai dos ricos, Senhor,
protegei-os mais de perto,
que aos pobres a própria dor
ensina o caminho certo!
10
Dizes que sentes por ela
apenas amor carnal.
- Com mulher tão magricela,
melhor dirias - ossal!
11
Do nosso encontro, Tereza,
naquela segunda feira.
Minha alma saiu ilesa,
o estrago foi na carteira.
12
Ela, arrependida, ao cura,
sem outra desculpa, disse:
- Era a noite tão escura,
que eu pensei que Deus não visse!
13
Enquanto o bar está cheio
de risos e alacridades,
eu, sonhando, pastoreio
meu rebanho de saudades.
14
Enquanto o mar lambe a areia
com volúpia, devagar,
de ciúmes a Lua cheia
chora prantos de luar.
15
"Era uma santa!" - dizia
o viúvo, olhando o caixão.
Mas, perto, alguém malicia:
- Agora, sim. Antes, não.
16
Esbelta, leve no andar,
calor mostrando também,
vem ela. E eu fico a pensar:
que puro-sangue ali vem!
17
Escuta, fonte, não sigas
jamais os caminhos meus.
Tuas quedas são cantigas,
as minhas... pergunta a Deus.
18
Esta engrenagem, que é a vida,
esmaga a todos, sem dó.
E a gente, aos poucos, moída,
de novo volta a ser pó.
19
"Fizeram-te mal, Leonor?"
- indaga, atento, o legista.
E ela, com o rosto em rubor:
"Conforme o ponto de vista..."
20
Foi-se a sogra. E o cenário
é bem outro no meu lar.
Até meu velho canário
voltou de novo a cantar.
21
Há dois tipos de mulher
que a nossa vida atormenta.
- Aquela que não nos quer
e aquela que a gente aguenta.
22
Ia triste. De repente,
uns olhos negros, risonhos,
deixaram na minha mente
uma ninhada de sonhos.
23
Infeliz não é o que chora
de inveja ou amargo rancor.
É o que vai por vida a fora
sem uma história de amor.
24
Mais bebo, mais me angustio,
tamanha é a dor que me invade.
- Sou planta de beira-rio,
numa enchente de saudade!
25
Maria, com jeito e graça,
de meu cigarro reclama.
Mas não é pela fumaça,
é pela cinza na cama.
26
Morre um doutor. Cena forte.
Porém, nesse triste instante,
quem mais chora é a própria Morte,
que perdeu seu ajudante...
27
Mulher correta é a Maria.
Correta e boa também.
- Fazendo o que não devia,
ela não deve a ninguém...
28
Mundo de gente que chora...
Mundo de gente sofrida...
E o Tempo fincando a espora
na besta magra da vida...
29
Não queira jamais um caso
resolver lá na Jutiça.
É prazo, prazo e mais prazo;
e, mais que prazo, é preguiça...
Na tarde cinzenta e fria,
quê de tristezas no ar!
Bate um sino... Ave-Maria...
Ah! se eu soubesse rezar!
29
Nesta vida, mar revolto,
onde a carne em ânsias grita,
quando o demônio anda solto,
toda mulher é bonita.
30
Nesta vida que se arrasta,
tão cheia de coisas loucas,
há mulheres de mil castas,
mas castas mesmo, há bem poucas!
31
Nordeste. Vai longo o estio.
Quanta tragédia traduz
o leito seco de um rio
e à beira dele urubus!
32
Nunca vi coisa mais louca
do que os teus olhos, Maria.
Como brilham quando a boca
da noite devora o dia!
33
Os dois brigaram por ela.
E como saiu pancada!
- Por causa de uma costela,
quanta costela quebrada!
34
O sol, ao romper do dia,
olha a Terra em festival,
sem saber que essa alegria
ele a trouxe em seu bornal.
35
Ó tu que vives por baixo,
se subires sê decente.
Não sejas como o riacho
que faz misérias na enchente.
36
Para a minha alma sofrida
quisera apenas um bem:
o de ir brincando com a vida,
enquanto a morte não vem.
37
Pernas tortas, magricela,
e de biquíni na praia!
- Você não sabe, Isabela,
que falta lhe faz a saia!...
38
Por essa vida, aos esbarros,
sigo só por meu caminho.
Sou como um desses cigarros,
que vai queimando sozinho.
39
Por que gargalhas, coruja,
lá nas grimpas do telhado?
Alegra-te a noite suja
de tanto vício e pecado?
40
Qual a sua opinião
sobre a nova professora?
- Pela aparência, um canhão,
pela voz - metralhadora.
41
Quando o sol descamba além
e os sinos soltam lamentos,
intrusa, a saudade vem
despertar meus pensamentos.
42
Quando vinhas caminhando,
disse alguém com grande humor:
"Eis um pecado passando
em busca de um pecador.
43
Que a esmola que dás ao pobre
seja sempre aos olhos teus
apenas um gesto nobre,
nunca um empréstimo a Deus.
44
Que luta quando eu a vejo
tão tentadora e inocente!
Já viu respeito e desejo
brigando dentro da gente?
45
Que mulherzinha apressada!
Outra assim eu não conheço.
Nem espera ser cantada,
vai dando logo o endereço.
46
Quer sejam feias ou belas,
das mulheres fujo sim.
Das feias - de medo delas.
Das belas, medo de mim.
47
Regra, filho, o teu viver
para não teres a mágoa
de ver que o falso prazer
num mar de tédio deságua.
48
Revendo a velha cidade
onde deixei meu umbigo,
qual cicerone, a saudade
é quem passeia comigo.
49
Roteiro duro o da vida!
Tem setas bem indicadas,
mas quanta gente perdida
em suas encruzilhadas!
50
Sempre que o Dr. Clemente
fazia uma operação,
ocoveiro, previdente,
ficava de prontidão!
51
Sem rumo, triste, mofino,
segue o rebanho pastando.
Quem pastoreia é o Destino.
De cima Deus fica olhando.
52
Trovador procuro, aflito,
o belo em temas diversos,
sonhando ver o infinito
amarrado em quatro versos.
53
Tua sorte, companheiro,
à de mais ninguém se iguala:
tens saúde, tens dinheiro...
e uma mulher que não fala!
54
Uma estátua, um monumento
que lembre amor e carinho?
- Uma mulher no momento
de amamentar seu filhinho!
55
Vai o boi, dando de duro,
com o velho carro que chia.
Soubesse de seu futuro,
tanto esforço não faria.
56
Vejo-o sempre em meu caminho
e invejo-lhe a placidez.
- Ensina-me a ver, ceguinho,
a Vida assim como vês!
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