sábado, 18 de fevereiro de 2017

Luiz Otávio


1
Abandonada, esquecida,
sem amor, sem ter ninguém,
vai rolando, até que a vida
não a queira mais também...
2
Acabam-se os meus cansaços
e os dias são mais vividos,
se a música dos teus passos
vem tocar nos meus ouvidos.
3
A estrela d'alva cintila.
pássaros deixam seus ninhos...
E a madrugada, tranquila,
toma conta dos caminhos...
4
Amarga insatisfação
que só desejo nos dá
de ter o que não se tem,
de estar onde não se está...
5
Amor - sentimento forte!
Palavra odiada e querida...
Se é causa de tanta morte,
é a própria razão da Vida!...
6
Ao partir para a outra vida,
aquilo que mais receio,
é deixar nessa partida,
tanta coisa pelo meio ...
7
Ao raiar da madrugada
eu vi o sol desenhar
uma lagoa dourada
na superfície do mar.
8
A sonata do teu beijo
eu toco toda de cor
e, de olhos fechados, vejo
um mundo muito melhor...
9
Às vezes o mar bravio
dá-nos lição engenhosa:
afunda um grande navio,
deixa boiar uma rosa!
10
Às vezes, tenho pensado
que a nostalgia é, somente,
desejo de que o Passado
seja, de novo, Presente...
11
A terra oferece à gente
o exemplo da gratidão:
trata-a bem... dá-lhe a semente...
que os frutos logo virão...
12
A Trova definitiva,
ideal do Trovador,
por mais que eu padeça e viva
eu jamais hei de compor…
13
Bondade!... Bem pouca gente
quer imitar as raízes,
que luta, secretamente,
fazendo as rosas felizes!
14
Brinquedo de porcelana
na mão de criança arteira...
Assim é a ventura humana,
tão frágil... tão passageira...
15
Busquei definir a vida,
não encontrei solução,
pois cada vida vivida
tem uma definição...
16
Como Colombo, singrando
esta vida - incerto mar,
vivo no mundo esperando
um Novo Mundo encontrar...
17
Contradição singular
que angustia o meu viver:
a ventura de te achar
e o medo de te perder.
18
Depois de tão longa ausência,
pelo mundo andando ao léu,
voltando à minha querência
parecia entrar no céu...
19
Desconfio que a saudade
não gosta de ti, meu bem:
quando tu vens, ela vai...
quando tu vais, ela vem!
20
Dizes que és pobre e eu, coitado,
inveja tenho de ti:
-tens tua mãe ao teu lado
e a minha, eu nem conheci!...
21
Duas vidas todos temos,
muitas vezes sem saber:
a vida que nós vivemos
e a que sonhamos viver.
22
Dura menos que um suspiro
ou como a folha que cai…
Mas quando penetra na alma,
a Trova fica… Não sai…
23
 Ele cai... não retrocede!...
Continua... até sozinho...
que a fibra também se mede
pelas quedas no caminho...
24
Enfrentando tantas provas,
ao desenrolar dos anos,
vou tirando da alma Trovas,
e enchendo-a de desenganos…
25
Estas Trovas foram sonhos
que um trovador já sonhou…
São uns farrapos tristonhos
de um grande amor que passou…
26
Este doce e grande amor,
esta saudade indiscreta,
fizeram de um trovador
o mais tristonho poeta…
27
Este lar, humilde e pobre,
tem mais ventura e alegria
que muito palácio nobre,
sem amor, sem harmonia!
28
Estrela do céu que eu fito,
se ela agora te fitar,
fala do amor infinito
que eu lhe mando neste olhar ...
29
É um prazer bem diferente
e de sabor sempre novo,
ouvir a trova da gente
andar na boca do povo!…
30
Eu... você... as confidências...
O amor que, intenso, cresceu...
- O resto são reticências
que a própria Vida escreveu...
31
Fogem as frases que invento...
Friburgo, eu me calo agora...
- Nunca se exalta a contento
aquilo que mais se adora!
32
Há trovas, ricas, sonoras,
tem brilho, cintilação…
Lembram “foguetes de lágrimas”
nas noites de São João…
33
Houve uma bronca bacana
quando viram, certo dia,
que o noivo da Sebastiana
era o esposo da Luzia...
34
Lá no horizonte o barquinho,
mansamente, a velejar,
parece que de mansinho
sobe o céu... e deixa o mar...
35
Lar vazio... o "nada" em tudo...
a vida sem mais porquê...
- E na sala, o piano mudo,
como fala de você!...
36
Longe de ti, triste eu passo,
se vivo mesmo, nem sei…
E, cada trova que faço
um beijo que não te dei…
37
Louvo a Deus por me ter dado
a sorte de trovador,
pois o mal quando é cantado,
diminui o seu rigor…
38
Mediunidade esquisita
de duração muito breve:
– a Trova – é o povo quem dita,
o trovador… só escreve…
39
Meus sentimentos diversos
prendo em poemas tão pequenos.
Quem na vida deixa versos,
parece que morre menos ...
40
Não desejo nem capela
nem mármore em minha cova…
Apenas escrevam nela
pequenina e humilde Trova…
41
Não digo não: “minha” Trova
quando faço um verso novo:
– não é minha e nem é nova
quando cai na alma do povo…
42
Nem sempre nós conseguimos
traduzir as nossas dores…
Quantas trovas ficam mortas
nas almas dos trovadores…
43
Nessas angústias que oprimem,
que trazem o medo e o pranto,
há gritos que nada exprimem,
silêncios que dizem tanto!...
44
Nesta trova pequenina,
quero deixar o sabor,
do beijo que ainda há pouco
eu roubei do meu amor…
45
"O Diabo que tudo logra
- dizem, num tom zombeteiro -
sem coragem de ter sogra
resolveu ficar solteiro...
46
Ó mãe querida – perdoa ! ´
o que sonhaste, não sou ...
- Tua semente era boa !
a terra é que não prestou !
47
Ó trovas — simples quadrinhas
que têm sempre um quê de novo...
— Como podem quatro linhas
trazer toda alma de um povo?!
48
Ó vento que tudo pegas,
que arrancas flores e palmas,
por que também não carregas
as dores de nossas almas?!...
49
Pelo tamanho não deves
medir valor de ninguém.
Sendo quatro versos breves
como a trova nos faz bem.
50
“Pequena” – dizem zangados,
muitas vezes com desdém.
Jamais saberão, coitados,
que grandeza a trova tem!
51
Por estar em solidão
tu de mim não tenhas dó.
Com Trovas no coração,
eu nunca me sinto só!
52
Quando a Trova é mesmo boa,
é sempre assim que acontece:
– o dono fica esquecido,
mas a Trova não se esquece…
53
Quem vive pela saudade,
por longos anos ou meses,
possui a felicidade
de reviver várias vezes.
54
Que sina, que padecer
foi a Sorte aos cegos dar:
— Não ter olhos para ver
e tê-los para chorar...
55
Retrato de tua sorte
podes nisto contemplar:
todo rio, por mais forte,
encontra a morte no mar...
56
Saudade – brisa tristonha…
e o meu coração magoado
desprende Trovas… e sonha…
é um rosal despetalado…
57
Se a saudade fosse fonte
de lágrimas de cristal,
há muito havia uma ponte
do Brasil a Portugal.
58
Se é de amor tua ferida,
não busques remédio, — cala!
— O Tempo, aliado à Vida,
lentamente há de curá-la...
59
Sou devoto, sou um crente!
Não zombes, não rias não…
Trago um rosário de Trovas
no fundo do coração…
60
Tão pequenina... parece
humilde e distante estrela...
porém, como a Trova cresce
quando alguém sabe entende-la!
61
Tirem-me tudo o que tenho
neguem-me todo o valor!
Numa glória só me empenho:
– a de humilde trovador!
62
Toda noite ao me deitar
(por certo você reprova),
eu me esqueço de rezar
e fico fazendo trova.
63
Toda trova herdou o espírito
navegante português…
Nasce…foge… corre o mundo
e abandona quem a fez…
64
Toma cuidado, poeta
com teu sentir mais profundo;
a trova é muito discreta:
– conta tudo a todo mundo…
65
Trovador, grande que seja,
tem esta mágoa a esconder:
a trova que mais deseja
jamais consegue escrever ...
66
Tuas vaidades suplanta!
Não fiques nada a invejar!
- Imita o pássaro e canta
pelo prazer de cantar!
67
Tudo nos une: o amor,
o gênio igual, a constância,
até mesmo a própria dor...
— Só nos separa a Distância...
68
Uma das mais belas cenas
eu lamento não ter visto:
as ondas do mar, serenas,
ao sentir os pés de Cristo...
69
Uma trova pequenina,
tão modesta, tão sem glória,
bem pouca gente imagina,
que também tem sua história.
70
Um trovador veterano
concorre e zomba: - é "barbada"!
Depois de entrar pelo cano,
bronqueia: foi marmelada!...
71
Unamos os corações,
as almas, as próprias vidas,
e, desse modo, as Nações
ficarão também unidas!
72
Vendo inquieto o "costureiro",
tendo a barba bem cerrada,
diz de chacota, o barbeiro:
"chegou a vez da barbada..."
73
Vivia dando risada
e hoje é uma triste figura,
pois um dia a gargalhada
fez pular a dentadura.

Hino dos Trovadores:

Nós, os trovadores,
somos senhores
de sonhos mil !
Somos donos do Universo
através de nosso verso.
E as nossas trovas
são bem a prova
 desse poder :
elas têm o dom fecundo
de agradar a todo mundo ! 

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