quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Santiago Vasques Filho (Teresina/PI, 1921 - 1992, Fortaleza/CE)

1
A chuva traz à lembrança
uma janela quebrada,
a casa humilde e a criança
olhando, triste, a enxurrada.
2
Agora, sem mais nem quando,
sofrendo porque fugiste,
eu sonho que estás voltando,
para eu deixar de ser triste…
3
A jangada, quando alcança
dos mares a imensidade,
leva no bojo a esperança,
deixa na praia a saudade.
4
- Algo impede o casamento?
Se alguém sabe, agora fale!...
- Eu sei, seu padre... - Um momento!
Você é o noivo, e assim não vale!
5
Ao migrante maltrapilho,
que cruza o adusto sertão,
só resta, ao morrer-lhe o filho,
o consolo da oração…
6
Ao te encontrar, sem querer,
tarde linda, sol morrente,
mais triste que te perder
foi te rever novamente.
7
Apregoa o Zé Seráfico,
que a mulher está na dela:
- como um filme fotográfico,
só no escuro se revela…
8
Buscando esperanças vãs
no descompasso dos prazos,
gastei, sem ver, mil manhãs
e não sei quantos ocasos.
9
Cai a chuva fina e mansa,
e, na janela, que graça:
- O nariz de uma criança
achatado na vidraça!…
10
Casa assombrada... sombria...
Portas rangendo... Arrepio...
E o Zé tremia, tremia,
dizendo que era de frio!…
11
Coragem!... Sua mulher
tem poucos dias... Lamento...
- Doutor, se o destino quer,
mais uns dias eu aguento...
12
Da loja um ladrão levou
cristais valiosos ao léu,
e o lojista assim rezou:
- Pai nosso cristais no céu...
13
Das mágoas, dos sacrifícios,
das dores, dos sofrimentos,
fiz enormes edifícios
onde alugo apartamentos.
14
De longe, não desconfias
que, esperando tua volta,
tua ausência de mil dias
traz mil noites de revolta.
15
De repente este conflito,
quando a ausência me revolta,
por tudo que não foi dito
para trazer-te de volta!
16
Desconfio que a velhice
chega sempre bem depressa
quando se faz a tolice
de pensar que ela começa...
17
Descrente, maldigo até
meus atos de contrição,
por não ter, a minha fé,
o tamanho da oração!…
18
De volta à casa paterna,
revejo os vitrais antigos,
por onde a saudade eterna
repassa rostos comigo…
19
Diz, de cabeça enfaixada
- Não brigue, nem se aborreça.
Sua mulher, se é charada,
a minha é quebra-cabeça !...
20
Diz que vai me abandonar,
cai em pranto mas, depois,
perdoa e põe-se a rezar,
pedindo aos céus por nós dois…
21
Eis-me no inverno da vida
velando ocasos tristonhos,
mantendo a mão estendida,
tentando alcançar meus sonhos…
22
Ela se foi manhã cedo,
furtiva, sem que eu a visse,
guardando o rumo em segredo
para que eu não a seguisse.
23
Em passos e contrapassos,
ao som de acordes tristonhos
sempre foges dos meus braços
no bailado dos meus sonhos...
24
Endoidou e, em seus chiliques,
diz que é um relógio em destaque,
por isso vai, com seus tiques,
repetindo - tique-taque…
25
E o marido da Mercedes,
pintor sagaz, com seus trecos,
de dia pinta paredes,
de noite... "pinta os canecos".
26
Eu baterei na janela...
Confia em mim! - prometeu...
Mas foi a saudade dela
quem na vidraça bateu…
27
Grita a mulher do ladrão:
- Por onde andaste, cretino ?...
Não vejo qualquer menção
de assaltos, no matutino!
28
Há muita gente enganosa
qual goiaba sazonada:
- Por fora, a casca sedosa;
por dentro, podre ou bichada!
29
Maria!... grito, encantado,
quando me encontro sozinho.
Mas, quando estou ao seu lado,
só sei dizê-lo baixinho...
30
Não fosse a dor no traseiro,
numa corrida recorde,
diria, ainda, o carteiro,
que "cão que ladra não morde!...’
31
Não quis ver tua partida
nem teus acenos de adeus,
quando, agora, a tua vida
tem rumos que não são meus.
32
Não vivas com tanto orgulho
em razão do teu talento,
o tambor, que faz barulho,
tem, por dentro, apenas vento!
33
Na tua mão estendida
para este aperto de adeus,
vejo que a linha da vida
tem rumos que não são meus.
34
Nestas horas de sol-posto,
na saudade mais atroz,
nas fotos, beijo-te o rosto;
nas cartas, ouço-te a voz.
35
No forró do Zé Pancada,
que acabou no maior pau,
o Chicão desceu a escada
sem pisar nenhum degrau!
36
No peito a amargura cresce,
quando o caboclo, tristonho,
pede o inverno para a messe
e o inverno é apenas um sonho!
37
Numa farmácia, a freguesa
- Tem sal de frutas aí ?
Tem ? Então, por gentileza,
me dá um de abacaxi...
38
Nunca vi almas! - diz rindo.
E um cara na sua frente,
foi sumindo... foi sumindo...
transparente... transparente...
39
Os teus vestidos, Vitória,
e os lindos sapatos altos,
representam promissória
pela qual dou muitos saltos!
40
O velhinho monologa
contra o remédio, no leito:
- De que me adianta esta droga,
se o resto não tem mais jeito?!…
41
O velho galo, à noitinha,
ouviu a franga assanhada
dizendo para a galinha :
- Ele ainda "canta"... e mais nada!
42
Pago as vidraças quebradas,
que quebrei quando menino,
com as violentas pedradas
que hoje levo do destino!
43
Pelo espaço onde flutua,
nas noites claras de estio,
a lua ri de outra lua
que faz caretas no rio.
44
Pintora boa, de fato,
tem talento a Elizabete,
pois pintando o auto-retrato,
pintou-o "pintando o sete".
45
Por ser muito procurada
pra fazer qualquer trabalho,
foi, na loja, apelidada
de "garota quebra-galho"…
46
Promessa, cheia de graça,
de regressar, ela fez...
... Mas quem bateu na vidraça
foi a saudade, outra vez…
47
Quando teus olhos eu fito,
rezo neles a oração
de um monge em transe, contrito,
num ato de adoração!
48
Realismo mesmo mostrou
o pintor sacro Gregório,
que óleo de rícino usou
pra pintar... o purgatório!
49
Sem rival na adulação,
Belarmino Guararapes
chega a usar mata-borrão
no que o chefe escreve a lápis!…
50
Se não tens mais esperanças,
tantos são os teus fracassos,
muda o curso das andanças...
toma o rumo dos meus braços!
51
Se o patrão conta piada,
puxa-saco faz assim:
solta logo a gargalhada,
sem esperar pelo fim.
52
Se o tormento, como dizes,
é a remissão dos pecados,
por te amar - é bom que frises -
eu tenho os meus perdoados.
53
Socialite na butique:
Qual é a moda, seu Andrada?...
Agora, madame, o chique
é pagar conta atrasada...
54
Sofrendo tuas demoras,
com meus sonhos moribundos,
maldigo a fuga das horas
na precisão dos segundos!…
55
Tendo aos braços o serão
de nove meses atrás,
Marília exclamou: Patrão,
fazer serão... nunca mais!
56
Teus olhos nos meus pousados,
em silente confissão,
são dois monges deslumbrados,
rezando a mesma oração!
57
Tua ausência, tão sentida,
seria menor castigo
se eu soubesse repartida
minha saudade contigo.
58
Tu partes... mas, por piedade,
ao me deixares sozinho,
tira o espinho da saudade
do rumo do meu caminho!
59
Vendo o galã na TV
beijar a sua parceira,
grita o garoto: - Mãiêêê,
igual papai e a copeira!…
60
Verdade que se proclama
pelo efeito contraposto:
- quem joga pedra na lama,
recebe lama no rosto.
61
Vê, Rosário, o que me aprontas!
Eu te conheço do berço.
Tens um rosário de contas
do qual não pagaste um terço!...
62
Vive o rio seu conflito
no dolente marulhar,
marulho que é quase um grito
por nunca poder voltar.

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Roberto Tchepelentyky



1
A caminho do infinito,
prossigo a minha viagem...
Levo o que é de mais bonito:
O nosso amor na bagagem!
2
A chama já consumia
a casa do seu Arlindo,
quando psiu... ele dizia:
" Minha sogra está dormindo"!...
3
A minha sogra eu veria,
não importa em que planeta,
se pudesse, todo dia...
Claro, por uma luneta!!!
4
Amor, estranha magia,
do coração e da mente.
Com toda sua alquimia,
nos faz um adolescente. 
5
À noite, em frente á TV,
a vovó e o manto dela...
Ela dorme e nada vê,
o manto assiste à novela...
6
A paz que tanto nos falta,
deixando a vida feroz,
é uma criança peralta,
oculta dentro de nós!
7
A vida é um fogo de palha
e o tempo se mostra algoz,
mais parece uma fornalha
onde a palha...  somos nós! …
8
"Bate" a inspiração na gente...
Verso nenhum se aquieta,
quando Deus, onipotente,
nos permite ser poeta!
9
Deixa o que passou "de lado",
a vida é um ensinamento...
Pois lamentar o passado
é correr atrás do vento!...
10
Dentre as forças deste mundo,
procurando paz, eu vim,
encontrá-la aqui no fundo,
de onde crio a força em mim.
11
De político do “avesso”,
a gente já tem calombo...
pois, quando ele dá tropeço,
é o povo que leva o tombo!!!
12
E o velhinho gritou: “Opa!...”
Depois de tanta procura...
no prato de sua sopa,
encontrou a dentadura.
13
Na despedida, o teu lenço
deixou o meu com “revolta”!
Nem viu, num adeus intenso...
que o meu...acenava: Volta!!!
14
Nossos olhares ousados,
já perceberam que são
dois desejos conjugados
num “ jogo de sedução”!…
15
O amargor da despedida
de alguém que amamos demais,
é ter o sabor na vida
do “gosto de nunca mais”!…
16
O "bebum" vai ao velório
e abraça a "booooa” comadre,
dando um pesar vexatório:
"Me solta, que eu sou o Padre!!!”
17
O chão do quarto molhado...
A sogra pagou o mico
após seu grito abafado:
" Meu Deus! Errei o penico"!!!
18
O destino escreve a escolha
do amor de nós dois assim:
Páginas da mesma folha...
Tu... de costas para mim!…
19
O silêncio traz a paz
do universo e se engrandece,
com amor que o homem faz
do silêncio sua prece!
20
O teatro é fantasia,
mas, às vezes, como tal,
ninguém o diferencia
da nossa vida real...
21
O vento faz serenata
e o mar se põe a cantar
versos, em ondas de prata,
de uma poesia... ao luar…
22
Partiste... E a nossa amizade
no infinito se enternece...
Tu me mandas a saudade,
eu te mando a minha prece!…
23
Político que faz "rolo",
bem ou mal ele se arranja,
pois no meio do seu "bolo",
tem recheio de "laranja"!!!
 24
Pra aquela visita chata,
o que me deixa mais louco,
é ouvir a frase insensata:
"Já vai? Fica mais um pouco"!...
25
Pra que a filha não se “perca”,
meu vizinho fica alerta...
De que vale “fazer cerca”
pra quem tem porteira aberta?!
26
Sobre a parreira, o luar
no sereno te retrata…
E os teus olhos a brilhar:
“Duas uvas”… cor de prata… 
27
Ter “gandula bonitinha”,
rebolando, só piora...
O jogo quase não tinha:
- por tantas bolas pra fora! ...
28
Teu abraço me agasalha
com carinho tão profundo...
sinto em volta uma muralha,
separando-nos do mundo!…
29
Teu “jogo de amor” peralta,
por ciúme, nos devora:
- tu cobraste a minha falta,
batendo o “pênalti” fora! …
30
Um amor que já floresce,
escondido, não se assume.
É uma flor que nem parece...
Mas que exala seu perfume!
 31
Um casal tão agitado
no sofá de namorico,
parecia ter tomado
um banho de pó-de-mico!...
           32       
Vive a "página da vida"
nem que seja a "solavanco"!...
Pior é quem na "partida",
carimba a página: "Em branco"!


segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Relva do Egypto Rezende Silveira



1
A bengala que rastreia
os caminhos, sem cansaços,
é feito a luz que se alteia,
guiando o cego em seus passos.
2
A brisa doce e envolvente
traz seu perfume - que incensa
a saudade - e, novamente,
eu sinto a sua presença!
3
As vagas brancas, rendadas
vêm seu bramido amainar
nas areias nacaradas,
que são molduras do mar.
4
A tempestade de areia
minha trilha não ofusca,
pois fulge a crença e norteia
os meus passos nestas busca.
5
A vigília tem seu jeito
de inquietar meu coração.
Fica ao meu lado no leito,
despertando a solidão.
6
Bendiz a lida na enxada
o lavrador quando sente
cheiro da terra molhada
fertilizando a semente.
7
Cai o idoso num tropeço,
derrubando uma guria,
depois… paga um alto preço
por uma noite de orgia.
8
Criam mentiras e ofensas
um abismo entre nós dois
que vai minar nossas crenças
num romance sem depois.
9
Das mãos de Deus vai caindo,
em forma de chuva mansa,
a bênção da água…e espargindo
as sementes da esperança.
10
Desato os nós do passado
e as tramas de um sonho eu teço:
sonho é tear encantado
que motiva o recomeço.
11
Disse o carteiro, confuso:
- mora aqui o “seu” Leitão?
- Não mais, respondeu o luso:
virou torresmo e sabão.
12
Estás distante... a inquietude
a minha vida consome.
E, na prece, em solitude,
a ladainha é o teu nome.
13
Fecunda o ventre rosado
do amor, a fértil semente
e, a mãe, abriga um legado
que é futuro em seu presente…
14
Feito um luzeiro divino,
o mestre guia o estudante
na conquista de um destino
produtivo e fulgurante.
15
Finda o dia... A noite desce...
Tudo invade sem tardança.
Então, meu sonho adormece
à sombra de uma lembrança.
16
Homem da terra!… No entanto,
 por sua sabedoria,
 meu pai resplendia tanto
 que se fez estrela – guia.
17
Insensatez?! Não! As horas,
no limiar do sol-pôr,
eu eternizo em auroras
nos braços do meu amor.
18
Manda notícia! É o que peço.
Basta dizeres: “Eu te amo”.
E esperarei teu regresso,
saudosa mas sem reclamo.
19
Minha vigília parece
ritual que me consome
na ladainha da prece,
digo, em delírio, teu nome.
20
Mostra o leito em desalinho
   que a indiferença trocamos
   pelas juras e carinho
   quando o amor nós celebramos.
21
Na inspiração… devaneios,
num ritual sem esperas,
dou asas aos meus anseios,
recriando primaveras.
22
Na madrugada, em teus braços,
o nosso amor se faz pleno.
E o desejo, com seus laços,
torna este mundo pequeno.
23
Não rasgue a terra em trincheiras
onde a guerra esconde a dor.
Plante malvas nas floreiras,
componha versos de amor.
24
No alvor, o sol com magia
os véus da noite descerra.
E boceja um novo dia
junto à franja azul da serra.
25
No barco do amor navego,
sem tristezas nem cansaços,
e sou cativa - não nego,
das correntes dos teus braços!
26
No brilho do teu olhar,
a tua alma é refletida.
Nesse encanto, eu vou buscar
o norte da minha vida.
27
No instante da despedida,
o pranto contido... o adeus,
marcando por toda a vida
renúncia dos sonhos meus.
28
No seu talvez reticente,
senti acordes de adeus,
e, em farrapos, de repente,
me despi dos sonhos meus.
29
O meu peito maltratado
por um talvez sem razão
é menino de recado
que a resposta aguarda em vão.
30
Partes com indiferença
   sem adeuses nem sinais
   e crias barreira imensa
   para abafar os meus ais.
31
Passa o tempo... E se renova
toda energia perdida:
a melhor idade prova
que a idade é prova de vida.
32
Pescador, em travessia,
leva a fé como se fosse,
no labor do dia a dia,
o seu cantil de água doce.
33
Professor em sua trilha,
iluminando outro ser,
cultiva o dom da partilha
na partilha do saber.
34
Quando volto à antiga herdade,
ouço do passado o canto...
E, no colo da saudade,
toda notícia é acalanto…
35
Quase seco, em lodo, o rio
segue lento sem cantar:
natureza em desafio
tentando o homem alertar.
36
Receio os falsos anelos
que deixam, sempre, o vazio:
são quais sonhos paralelos,
margens opostas de um rio.
37
Revendo a pesada conta
que a vida me faz pagar,
a prova dos nove aponta
que eu nunca soube "somar"!
38
Roçando da noite o véu,
o tempo, que tudo invade,
desvenda aos círios do céu
mistérios da eternidade.
39
Rompeste um antigo laço
contudo, mantenho aceso
este amor que não desfaço,
mas disfarço com desprezo.
40
Se agora o tempo que resta
é pouco para nós dois,
façamos dele uma festa,
pois nada conta o depois!
41
Se a tempestade de areia
a minha visão embaça,
o lume da fé se alteia
e mostra que tudo passa!
42
Segue o amigo de verdade
ao nosso lado onde for,
ou, em forma de saudade,
no alforje do viajor!
43
Se o desejo me arrebata,
preceitos são esquecidos:
vivo paixão insensata
na linguagem dos sentidos.
44
Se, por receio, o meu sonho
perde a magia ou a cor,
de novo, o torno risonho
por força do nosso amor!
45
Sinto a saudade roçar
o véu do tempo... E, acordado,
em sonho, vou resgatar
todo o encanto do passado.
46
Tu partiste!… E, no abandono,
perdi minha identidade,
pois nem de mim sou mais dono,
sendo escravo da saudade.
47
Véus do tempo, lentamente,
   ganham a bênção contida
   no brinde do sol nascente
   que, em seu bojo, traz a vida.

domingo, 27 de novembro de 2016

Paulo Emílio Pinto (1906 - ????)



1
A amizade mais o amor
cultivar bem que eu tentei.
Mas quanta praga, Senhor,
deu nos jardins que plantei!
2
Aquela?  Que bom partido!
Além das rendas que tem,
é boa no bom sentido
e do outro jeito também.
3
As suas cartas, senhora,
releio-as de quando em vez.
Mas nelas só vejo agora
os erros de português...
4
Às vezes fico a pensar
que minha alma ainda é menina.
Uma garota a brincar
num casarão em ruína.
5
Canta um galo.  Já distingo
um clarão lá no nascente.
mais um dia... mais um pingo
de tempo a pingar na gente.
6
Com ar assim de quem sonha,
filosofava uma cobra:
- Ah! se eu tivesse a peçonha
que na alma dos homens sobra!
7
Com ares de gozação,
ele à colega dizia:
- Essa tua promoção
foi reza mesmo, Maria?
8
Como funcionária a Elvira
produz pouco, é negligente.
Mas como a esperta se vira,
terminado o expediente!
9
Cuidai dos ricos, Senhor,
protegei-os mais de perto,
que aos pobres a própria dor
ensina o caminho certo!
10
Dizes que sentes por ela
apenas amor carnal.
- Com mulher tão magricela,
melhor dirias - ossal!
11
Do nosso encontro, Tereza,
naquela segunda feira.
Minha alma saiu ilesa,
o estrago foi na carteira.
12
Ela, arrependida, ao cura,
sem outra desculpa, disse:
- Era a noite tão escura,
que eu pensei que Deus não visse!
13
Enquanto o bar está cheio
de risos e alacridades,
eu, sonhando, pastoreio
meu rebanho de saudades.
14
Enquanto o mar lambe a areia
com volúpia, devagar,
de ciúmes a Lua cheia
chora prantos de luar.
15
"Era uma santa!" - dizia
o viúvo, olhando o caixão.
Mas, perto, alguém malicia:
- Agora, sim. Antes, não.
16
Esbelta, leve no andar,
calor mostrando também,
vem ela.  E eu fico a pensar:
que puro-sangue ali vem!
17
Escuta, fonte, não sigas
jamais os caminhos meus.
Tuas quedas são cantigas,
as minhas... pergunta a Deus.
18
Esta engrenagem, que é a vida,
esmaga a todos, sem dó.
E a gente, aos poucos, moída,
de novo volta a ser pó.
19
"Fizeram-te mal, Leonor?"
- indaga, atento, o legista.
E ela, com o rosto em rubor:
"Conforme o ponto de vista..."
20
Foi-se a sogra.  E o cenário
é bem outro no meu lar.
Até meu velho canário
voltou de novo a cantar.
21
Há dois tipos de mulher
que a nossa vida atormenta.
- Aquela que não nos quer
e aquela que a gente aguenta.
22
Ia triste.  De repente,
uns olhos negros, risonhos,
deixaram na minha mente
uma ninhada de sonhos.
23
Infeliz não é o que chora
de inveja ou amargo rancor.
É o que vai por vida a fora
sem uma história de amor.
24
Mais bebo, mais me angustio,
tamanha é a dor que me invade.
- Sou planta de beira-rio,
numa enchente de saudade!
25
Maria, com jeito e graça,
de meu cigarro reclama.
Mas não é pela fumaça,
é pela cinza na cama.
26
Morre um doutor. Cena forte.
Porém, nesse triste instante,
quem mais chora é a própria Morte,
que perdeu seu ajudante...
27
Mulher correta é a Maria.
Correta e boa também.
- Fazendo o que não devia,
ela não deve a ninguém...
28
Mundo de gente que chora...
Mundo de gente sofrida...
E o Tempo fincando a espora
na besta magra da vida...
29
Não queira jamais um caso
resolver lá na Jutiça.
É prazo, prazo e mais prazo;
e, mais que prazo, é preguiça...

Na tarde cinzenta e fria,
quê de tristezas no ar!
Bate um sino... Ave-Maria...
Ah!  se eu soubesse rezar!
29
Nesta vida, mar revolto,
onde a carne em ânsias grita,
quando o demônio anda solto,
toda mulher é bonita.
30
Nesta vida que se arrasta,
tão cheia de coisas loucas,
há mulheres de mil castas,
mas castas mesmo, há bem poucas!
31
Nordeste.  Vai longo o estio.
Quanta tragédia traduz
o leito seco de um rio
e à beira dele urubus!
32
Nunca vi coisa mais louca
do que os teus olhos, Maria.
Como brilham quando a boca
da noite devora o dia!
33
Os dois brigaram por ela.
E como saiu pancada!
- Por causa de uma costela,
quanta costela quebrada!
34
O sol, ao romper do dia,
olha a Terra em festival,
sem saber que essa alegria
ele a trouxe em seu bornal.
35
Ó tu que vives por baixo,
se subires sê decente.
Não sejas como o riacho
que faz misérias na enchente.
36
Para a minha alma sofrida
quisera apenas um bem:
o de ir brincando com a vida,
enquanto a morte não vem.
37
Pernas tortas, magricela,
e de biquíni na praia!
- Você não sabe, Isabela,
que falta lhe faz a saia!...
38
Por essa vida, aos esbarros,
sigo só por meu caminho.
Sou como um desses cigarros,
que vai queimando sozinho.
39
Por que gargalhas, coruja,
lá nas grimpas do telhado?
Alegra-te a noite suja
de tanto vício e pecado?
40
Qual a sua opinião
sobre a nova professora?
- Pela aparência, um canhão,
pela voz - metralhadora.
41
Quando o sol descamba além
e os sinos soltam lamentos,
intrusa, a saudade vem
despertar meus pensamentos.
42
Quando vinhas caminhando,
disse alguém com grande humor:
"Eis um pecado passando
em busca de um pecador.
43
Que a esmola que dás ao pobre
seja sempre aos olhos teus
apenas um gesto nobre,
nunca um empréstimo a Deus.
44
Que luta quando eu a vejo
tão tentadora e inocente!
Já viu respeito e desejo
brigando dentro da gente?
45
Que mulherzinha apressada!
Outra assim eu não conheço.
Nem espera ser cantada,
vai dando logo o endereço.
46
Quer sejam feias ou belas,
das mulheres fujo sim.
Das feias - de medo delas.
Das belas, medo de mim.
47
Regra, filho, o teu viver
para não teres a mágoa
de ver que o falso prazer
num mar de tédio deságua.
48
Revendo a velha cidade
onde deixei meu umbigo,
qual cicerone, a saudade
é quem passeia comigo.
49
Roteiro duro o da vida!
Tem setas bem indicadas,
mas quanta gente perdida
em suas encruzilhadas!
50
Sempre que o Dr. Clemente
fazia uma operação,
ocoveiro, previdente,
ficava de prontidão!
51
Sem rumo, triste, mofino,
segue o rebanho pastando.
Quem pastoreia é o Destino.
De cima Deus fica olhando.
52
Trovador procuro, aflito,
o belo em temas diversos,
sonhando ver o infinito
amarrado em quatro versos.
53
Tua sorte, companheiro,
à de mais ninguém se iguala:
tens saúde, tens dinheiro...
e uma mulher que não fala!
54
Uma estátua, um monumento
que lembre amor e carinho?
- Uma mulher no momento
de amamentar seu filhinho!
55
Vai o boi, dando de duro,
com o velho carro que chia.
Soubesse de seu futuro,
tanto esforço não faria.
56
Vejo-o sempre em meu caminho
e invejo-lhe a placidez.
- Ensina-me a ver, ceguinho,
a Vida assim como vês!

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Ialmar Pio Schneider



1
A brisa sempre é bem-vinda
nestas tardes de calor,
quando apareces tão linda
para preencher meu amor !
2
Acabou-se da memória
o desejo de te amar,
mas ninguém me rouba a glória
de em meus versos te cantar !…
3
Aceita os versos que faço
com verdadeira emoção,
há de ter o seu espaço
dentro do teu coração !
4
A esperança, nesta vida,
é tudo que nos conduz,
pela estrada florescida
de sonhos de amor e luz !…
5
A felicidade é abstrata,
Não a podemos tocar,
É uma forte candidata
De quem vive para amar.
6
Alguém bate à minha porta,
vou ver quem é, num momento;
há muito tempo está morta
minh´alma gêmea… É o vento !
7
Alguma coisa me diz
Que um dia chegarás,
Só assim serei feliz
E quem sabe viva em paz !
8
A mágoa que em mim existe
é fruto de uma saudade
que me transforma num triste
no seio da sociedade.
9
A manchete de jornal
sempre indica uma notícia,
que a imprensa tradicional,
é a melhor arma patrícia.
10
Amiga de muitos anos,
companheira de verdade,
enfrentando os desenganos,
ela se chama: saudade.
11
A mocidade perdida
passou rápida… nem vi;
mas foi o melhor da vida
que passei junto de ti !
12
A noite chegou depressa,
no inverno trouxe o frio;
vem a tristeza e começa
a encher meu mundo vazio.
13
Anoitece lentamente
quando medito sozinho
e me quedo descontente
distante do teu carinho.
14
A noite desceu aos poucos
e no céu surgiu a lua
para os boêmios e loucos
que vagam a esmo na rua.
15
A saudade que me assalta
E punge meu coração,
É da morena que falta
Nesta minha solidão !
16
As plantinhas que cultivo
em meu jardim pequenino,
estão dizendo que vivo
pelo teu amor divino…
17
Assim como a vida é breve
e os meus sonhos passageiros,
hoje meu ser não se atreve
em lances aventureiros…
18
Às vezes me contradigo
sem querer, naturalmente,
pois corro sempre o perigo
de te amar inutilmente.
19
Às vezes na solidão,
Eu sonho com teus carinhos,
Tento te esquecer em vão,
Pois vives em meus caminhos…
20
À tardinha, junto ao cais
no meu porto de Ilusão,
como dói amar demais
a quem não tem coração !
21
Cada paixão que me invade
surge do amor que não tive;
e representa a saudade
de quem neste mundo vive.
22
Caminhemos pela vida,
qual se fôssemos crianças,
e por mais ríspida a lida,
nunca nos falte esperanças !
23
Canta o poeta tristonho
seus versos desesperados,
pois que alimenta no sonho
sóbrios amores frustrados…
24
Certo dia andava triste
Pelas ruas da cidade,
Foi então que tu surgiste
Pra minha felicidade.
25
Como tarda anoitecer
nestes dias de verão,
quanto é difícil viver
mergulhado em solidão.
26
Consegues viver sozinha,
enfrentando a solidão?!
Recorda que “uma andorinha
sozinha não faz verão…”
27
Contemplando a imensidão
do céu azul e do mar,
minh´alma sente a paixão
de viver para te amar !…
28
Coração sentimental,
a bater desesperado,
ontem teve um ideal,
hoje é brinquedo quebrado !
29
Cresce a planta no jardim
por força da natureza;
e cresce dentro de mim
o amor à tua beleza.
30
Cuidado com a ilusão,
romântico trovador,
pois pelo sim, pelo não,
não creias no falso amor !
31
Das flores todas que planto
em meu modesto jardim,
aquela de mais encanto
vem ser você, meu Jasmim!
32
Depois de tantos caminhos
percorridos nesta vida,
meu troféu são teus carinhos
que tenho em contrapartida.
33
De novo o sol vai se pôr
na colina além do rio,
sinto saudades do amor
que me trouxe tanto brio…
34
Desejo fazer somente
o que deveras me apraz,
levando os sonhos em frente,
deixando as mágoas pra trás.
35
De ti não quero mais nada,
apenas lembrança triste,
pois minh´alma apaixonada
ao teu desdém não resiste !
36
Devo te dizer cantando
para que escutes sorrindo
e assim vás acreditando
que eu não esteja fingindo…
37
Eis que chega a primavera,
trazendo-me novo alento,
vivo o “suspense” da espera
de te encontrar num momento…
38
Enquanto passam as horas,
fico pensando em você,
vencido pelas demoras,
qual alguém que não mais crê.
39
Era jovem e vivia
desfrutando a mocidade…
Por que será que hoje em dia,
vivo agora de saudade?!
40
Era menino… e bem cedo
vivia a brincar sozinho;
o meu primeiro brinquedo
foi só… um caminhãozinho…
41
Eras bonita… Eu tão feio…
mas nos queríamos tanto,
que num mesmo devaneio
nos amamos por encanto…
42
Eras tu, mulher querida,
o meu precioso troféu,
quando encontrei-te na vida,
parece que entrei no céu !
43
És a força que eu preciso
para deixar de sofrer.
Oh! querida, toma juízo
e vem comigo viver !
44
Escrevo trovas sentidas
num desabafo de dor:
são as ilusões perdidas
de certo frustrado amor.
45
Esquecer não é somente,
A força pra não lembrar,
É viver bem o presente
Pra não ter que retornar…
46
Esse amor que tu me deste
foi efêmero, fugaz…
Por isto a tristeza investe,
arrebatando-me a paz.
47
Esta chuva me visita,
vem despertando a saudade,
ao lembrar quanto és bonita,
pois és a felicidade !
48
Estas trovas que hoje canto
com vontade de chorar,
vem do triste desencanto
de nunca mais te encontrar.
49
Eu agora não me espanto
e nem me causa pavor,
o terrível desencanto
que sofri por teu amor.
50
Eu fui ficando distante
e vivendo da saudade,
pois desejo, doravante,
somente a sinceridade…
51
Eu fui te ver certo dia
e apenas me confundiste;
ia cheio de alegria
e voltei magoado e triste.
52
Eu fui vivendo meus dias,
procurando te olvidar,
e quantas horas vazias
se arrastavam devagar…
53
Eu já fiz diversas trovas
e tantas quadras também,
sempre estou compondo novas
destinadas ao meu Bem !
54
Eu não sei porque sorris
Quando me vês sem ninguém,
Teus sorrisos são gentis –
Talvez precises de alguém.
55
Eu não sou navegador,
mas enfrento o mar da vida,
por causa do nosso amor
que não teve despedida.
56
Eu não te quero somente
Pela aparência exterior;
Meu querer é mais ardente,
Mais profundo meu amor.
57
Eu nunca fiquei sabendo,
se tinhas um outro alguém
e por isso não compreendo
o teu silêncio também !
58
Eu serei sempre contente,
se algum dia me quiseres,
és a musa mais ardente,
entre todas as mulheres !
59
Eu te amei intensamente,
mas foram momentos vãos,
pois vejo que fui somente
um brinquedo em tuas mãos…
60
Faça chuva, faça sol,
meu amor é permanente;
desde o surgir do arrebol,
até descer o poente.
61
Faço de conta que penso
e me concentro demais;
todavia me convenço
que não me encontro jamais…
62
Faço versos para alguém
que surgiu em minha vida
e agora com seu desdém
me deixou a alma ferida.
63
Fiquei contente ao saber
que realizaste teu sonho,
pois fazes por merecer
um futuro assaz risonho.
64
Fora bom que tu partisses
para nunca mais voltar;
assim talvez conseguisses
que eu pudesse te olvidar…
65
Foste a morena brejeira
que surgiu em meu amor
como o botão da roseira
que agora não dá mais flor.
66
Foste a musa que escolhi,
desfolhando um bem-me-quer,
mas vejo que me iludi,
pois eras falsa, mulher !
67
Fui feliz antigamente,
quando era um pobre menino;
e só vivia o presente,
sem me importar com o destino.
68
Hoje faço quaisquer trovas
para cantar meu amor;
e por serem sempre novas,
eu lhes dou muito valor !
69
Hoje levantei mais tarde,
tinha pouco o que fazer;
mas, amor, você me aguarde,
que nunca a pude esquecer !…
70
Hoje não tenho alegria
por sentir esta saudade
que nasce de quem fazia
a minha felicidade.
71
Imprensa livre, meu povo,
não deixe nunca acabar;
pois consegui-la de novo,
é difícil conquistar !
72
Iremos os dois sozinhos
em meio da multidão,
por diferentes caminhos
que jamais se encontrarão.
73
Já faz tempo, era eu criança,
minha mãe me disse um dia:
– Nunca percas a esperança
pois ela nos alivia !
74
Já fiz trovas de improviso
na distante mocidade,
mas, menestrel sem juízo,
delas só tenho saudade…
75
Já fiz trovas e fiz versos
para a linda namorada,
que depois andam dispersos
no vento da madrugada…
76
Já fui gato abandonado
e vivia ao Deus-dará…
hoje sou gato amarrado
por laços que a vida dá !
77
Já não canto por desgosto
e nem por felicidade,
mas, à tardinha, ao sol-posto,
eu me quedo na saudade…
78
Labutei muito na imprensa,
fui cronista popular,
hoje sei o quanto é tensa,
a notícia divulgar…
79
Lá na praia se encontraram
e viveram na ilusão,
pois apenas se tornaram
namorados de verão.
80
Lobo da Estepe sozinho
ando à procura de alguém,
seguindo pelo caminho
que agora mais me convém.
81
Longe de ti me entristeço
pela falta de carinho
e pago o mais alto preço
nesta vida tão sozinho…
82
Luas cheias e as estrelas
povoam o imaginário,
sonhadores, vinde vê-las,
da noite o lindo cenário !…
83
Luiz Otávio e J. G.,
dois trovadores legais,
criaram para você
os nossos Jogos Florais !
84
Mais um ano se passou
e continua a poesia,
que Quintana dos deixou
para nossa nostalgia…
85
Mergulhado no desejo
de te amar na juventude,
hoje penso de sobejo
que te amei mais do que pude.
86
Mesmo depois de velhinho,
se Deus me der esta graça,
quero sentir o carinho
do amor total que não passa…
87
Meu amor foi o mais louco,
pois nasceu de uma esperança,
que não vingou nem um pouco
e transformou-se em lembrança.
88
Meu amor simples em tudo
não te convenceu bastante,
porque permaneço mudo
ao te ver tão deslumbrante.
89
Meu coração se consterna
olhando a noite estrelada;
no mundo quem me governa
são as carícias da amada.
90
Meu destino é fazer versos
Pra compor as minhas trovas,
Quanto mais sejam diversos
Mais elas hão de ser novas…
91
Meus cantares estão cheios
de paixão e fantasia,
meus queridos devaneios
no Universo da Poesia.
92
Minhas mágoas já são tantas
que não posso descrevê-las;
é como se pelas tantas
fosse contar as estrelas…
93
Na ascensão ou na descida,
tenham fé, queridos filhos;
não se percam pela vida
ao seguirem falsos trilhos !
94
Na breve, efêmera vida,
não saibam, talvez, mas quis,
com a poesia escolhida,
sempre alguém fazer feliz !
95
Nada te digo nem quero
que alguma coisa me digas;
se às vezes me desespero
eu me desfaço em cantigas…
96
Não considero perdida,
aquela ingênua ilusão,
que invadiu a minha vida
num momento de paixão…
97
Não consigo mais te ver
e procuro te encontrar,
para sentir o prazer
de finalmente te amar.
98
Não esperes compreensão
para os poemas que escreves,
é tão longa a ingratidão,
como os momentos são breves.
99
Não estás junto comigo
nestes momentos adversos;
no entanto, pra meu castigo,
vives inteira em meus versos !
100
Não foram horas perdidas
as que passei junto a ti;
são lembranças bem vividas
que nunca mais esqueci…
101
Não há poder que consiga
me demover da vontade,
de tê-la só como amiga
quando me assalta a saudade.
102
Não há renúncia a quem quer
viver feliz nesta vida;
só o amor de uma mulher,
poderá me dar guarida.
103
Não me iludem teus olhares
e nem tampouco teus risos:
são expansões singulares
ou desejos indecisos ?!
104
Não te desprezo, nem quero
o teu desprezo, igualmente;
se o amor não é sincero
procuro esquecer, somente…
105
Não vais chorar, certamente,
ao saberes que te quero
e creias, porém, somente
que tudo… tudo é sincero.
106
Na trova tudo acontece,
que o diga meu coração,
pois amei quem não merece
possuir minha paixão.
107
Na vida dos sonhadores,
existe um sol que fulgura,
para aquecer os amores
que necessitam ternura…
108
Nesta vida surge o amor
Que vem abraçar nós dois;
E no fim do corredor
Vem a saudade depois…
109
No aconchego dos teus braços
busco ternura e carinho,
quando esqueço meus fracassos
e não vivo mais sozinho…
110
No coração de quem ama
sempre haverá um lugar
para alimentar a chama
de uma paixão a queimar.
111
No Dia do Trovador,
escrevo esta simples trova,
para o meu sincero amor
que a minha vida renova…
112
No jardim da minha vida,
quantas flores cultivei;
Mas em cada despedida
muitas delas arranquei…
113
No mundo não há ninguém
mais perfeito que a mulher,
se você souber de alguém,
me conteste, se puder!
114
Nos caminhos da existência,
foram tristes ou risonhos,
os dias de convivência
na imensidão dos meus sonhos…
115
Nunca mais vou projetar
mensagens de amor ardente,
existe um outro lugar
pra quem não gosta da gente.
116
Olhavas triste, indecisa,
no meio da rua, quando
sentes o abraço da brisa
que vai assim te afagando…
117
O amor à primeira vista
visitou meu coração,
mas no instante da conquista
vi que tudo foi em vão.
118
O amor daquele que chora
por ter sido desprezado,
não tem jeito de ir embora,
fica no peito guardado.
119
O calor convida ao mar
aonde o meu desejo vai,
preciso te procurar
quando a tarde aos poucos cai.
120
O menestrel sem juízo
um dia nasceu em mim,
daquele instante, preciso
me comunicar assim…
121
O meu amor tem segredos
que nunca pude externar;
me invadem todos os medos
de a não poder conquistar !
122
Onde habita a majestade
deusa do meu coração?
Ela vive na saudade
dos anos que lá se vão !
123
O pôr-do-sol pede um verso
no fim da tarde que desce,
medito e com Deus converso
nesta trova feita prece.
124
O prazer de amar alguém,
é o mesmo de ser amado;
pois o amor que a gente tem,
deve ser compartilhado.
125
O que me causa tristeza
não é saber que não me amas,
é tão-somente a certeza
que sofres e não reclamas !
126
O respeito é necessário,
faz muito bem, sim senhor;
deve viver num sacrário,
vem a ser irmão do amor !
127
O sol-nascente desperta,
na imensidão do Universo,
o viajor de vida incerta
e o poeta que faz verso.
128
Os poemas que ficaram,
quando ingênuo e sem memória,
na sala em que o assassinaram,
hoje contam sua história.
129
O tempo já nos consome
neste começo de inverno,
nada me lembra teu nome
que risquei do meu caderno…
130
O tempo que tudo apaga
só deixa recordação,
que nem uma viva chaga
sangrando no coração.
131
Outrora fui solitário,
não tinha grande vaidade,
mas, hoje, sou perdulário
de tanto amor e saudade.
132
O vento leva o meu canto
pelos confins do universo;
em vez de chorar, eu canto
através deste meu verso !
133
Outrora fui solitário,
não tinha grande vaidade,
mas, hoje, sou perdulário
de tanto amor e saudade !
134
Para conversar com Deus,
olho os céus e me comovo,
mas lembrando os beijos teus,
retorno à terra de novo !
135
Para escrever estes versos,
procuro ouvir minhas musas;
trazem-me assuntos diversos,
mas não ideias confusas.
136
Para matar o desejo
que sinto com tanto ardor,
quero a delícia de um beijo
dos lábios do meu amor.
137
Para sofrer tanto assim
fora melhor não revê-la;
está tão longe de mim
como se fosse uma estrela.
138
Para te amar me concentro,
esperando chegar a hora;
pois quem não ama por dentro,
não adianta amar por fora.
139
Para tê-la novamente
andei por muitos caminhos
e retornei descontente
sem conseguir seus carinhos…
140
Para viver com carinho
procurei amar alguém;
hoje sinto que sozinho
eu vivia muito bem.
141
Passaram-se tantos dias
que formaram muitos anos,
se colhemos alegrias,
não faltaram desenganos.
142
Pelos caminhos da vida
fui deixando para trás,
como em cada despedida
um sonho que se desfaz.
143
Pelos trilhos da saudade
vai correndo o trem do amor;
e ao lembrar a mocidade,
inda sou um sonhador.
144
Perambulando sozinho
pelas ruas da cidade,
procuro achar o caminho
que leva à felicidade.
145
Perdido em divagações
sento à beira do caminho,
como se as recordações
não me deixassem sozinho.
146
Persegue o lobo que existe
dentro de ti, sonhador,
não sendo alegre nem triste,
fazes só versos de amor…
147
Perto de ti me convenço
que nada posso fazer,
sem empregar o bom senso
para afinal te esquecer.
148
Por mais que tente esquecê-la,
não consigo meu intento,
sempre será qual estrela,
brilhando no firmamento.
149
Por que será que na vida
nós temos contrariedades,
se depois da despedida
vamos lembrar com saudades?!
150
Posso perder-te… que importa
se não queres me aceitar…
Há muito tempo está morta
a vontade de te amar.
151
Proclamas que és minha amiga…
ou foges da realidade ?!
Não te importas que eu te diga
desejar mais que amizade ?!
152
Procurei teu coração
com toda a sinceridade,
mas retorno à solidão
para viver de saudade…
153
Procuro encontrar-te ainda
para saber como vais
e a tarde que agora finda
me responde: “Nunca mais !”
154
Quando a saudade me aperta,
Faço uma trova, somente;
A vida fica deserta
E choro convulsamente…
155
Quando a saudade vier
me visitar, com certeza,
hei de lembrar a mulher
mais linda da natureza !
156
Quando cansado, à tardinha,
meu corpo exausto descansa,
vem a brisa e me acarinha
enchendo-me de esperança…
157
Quando estás à beira-mar,
caminhando sobre a areia,
eu me ponho a meditar
que sejas uma sereia.
158
Quando estas quadras componho,
pensando no meu amor,
a vida parece um sonho,
para eu ser um sonhador.
159
Quando fui apaixonado
por uma estranha mulher,
meu coração era amado
e eu não quis a quem me quer.
160
Quando lembro a mocidade
dos meus verdes madrigais,
sinto que a felicidade
já se foi, pra nunca mais !
161
Quando te vejo e sorris,
não sei que faço, senhora,
para a gente ser feliz
não há dia, nem tem hora!
162
Quando te vejo passar
ao meu lado sorridente,
é difícil renunciar
ao sorriso que não mente…
163
Quantas noites mal dormidas,
Já quase perdendo o juízo,
Ó meu bem, por que duvidas
Que é de ti que eu mais preciso ?
164
Quantas trovas, quantos versos,
me levaram de roldão,
a conhecer universos
existentes na ilusão…
165
Quantos amores têm fim
por falta de persistência,
não concretizando assim
a base da convivência.
166
Quem deseja ser feliz
Deve nutrir a ilusão;
Será sempre um aprendiz
Das coisas do coração.
167
Quem diz que a felicidade
Depende só do dinheiro,
Veja se compra a saudade
Com o ouro do mundo inteiro !
168
Quem fizer a gentileza
de não levar por ofensa,
que me ame até na pobreza
sem esperar recompensa.
169
Quem for amigo de alguém,
precisa ter lealdade;
caso contrário, só tem
traição em vez de amizade…
170
Quem namorou algum dia,
sabe o quanto se requer,
para ter a simpatia
e o coração da mulher.
171
Quem quiser ser trovador,
seja primeiro aprendiz,
mesmo em matéria de amor
se aprende pra ser feliz.
172
Quem tiver devotamento
pra algum amor que vier,
vai viver um bom momento,
sejam homem ou mulher.
173
Queria ter deste mundo
só flores e não espinhos;
mas um triste vagabundo
tem os dois pelos caminhos…
174
Quero o amor que não ilude
e me faz amar alguém,
que tenha paz e virtude
e seja séria e do bem.
175
Quis escrever um soneto,
levando mensagem nova,
mas esbarrei no quarteto,
e então compus esta trova…
176
Recordo a tua beleza
e também o quanto és boa,
me apaixono, com certeza,
e faço versos à-toa !
177
Roubei-lhe um beijo, ao passar
ao meu lado, sorridente;
e lembrando seu olhar,
de noite, dormi contente…
178
São duas jabuticabas,
Teus olhos mirando os meus,
Vou dizer-te, pra que saibas,
Meus tristes olhos são teus.
179
Se amar causa sofrimento;
é preciso suportar…
pois não há pior tormento
do que sofrer sem amar…
180
Se a chuva cai mansamente,
me fazendo meditar,
dá no coração da gente,
louca vontade de amar..
181
Se chorei, também choraste,
naquela tarde vazia,
hoje sou um velho traste,
já sem qualquer serventia.
182
Segue teu rumo que eu sigo
o meu destino também,
se não pude andar contigo
vou procurar outro alguém…
183
Sejam as trovas singelas
como as flores de um jardim,
e assim serão as mais belas
pérolas de um mar sem fim.
184
Seja pobre ou seja rica
a rima é uma canção,
a saudade sempre fica
depois que os versos se vão.
185
Sempre existe na existência
pra nos fazer infeliz,
um amor sem convivência
que a gente esperou e quis.
186
Se pudesses compreender
a paixão que me enlouquece,
nunca mais o teu viver
uma só mágoa tivesse…
187
Ser feliz nesta existência
Talvez apenas consiste
Em demonstrar na aparência
Ser sempre alegre e não triste…
188
Se tens amor e resistes
às ligações perigosas,
teus dias não serão tristes
e viverás entre rosas…
189
Se te querer foi loucura,
eu serei um triste louco,
por te dar tanta fartura
e ter em troca tão pouco.
190
Sócrates assim dizia:
“Eu só sei que nada sei.”
E com tal filosofia
eu também responderei.
191
Sofro por ti, me atormento
a cada instante que passa;
e neste martírio lento
vou vivendo na desgraça…
192
Só não compreende a ventura
de um simples beijo roubado,
uma infeliz criatura
que não foi apaixonado.
193
Sou um simples trovador
que vive cantando ao léu;
e faço apenas do amor
o meu precioso troféu !
194
Tão rápida a vida passa,
nem se chega a perceber,
pois é como uma fumaça
pelo espaço a se perder…
195
Tenho amor e penso nela
toda noite, todo dia,
cada vez está mais bela
no meu céu de fantasia…
196
Tens a beleza estampada
nos olhos, lábios e faces;
a cada nova alvorada
em meu coração renasces.
197
Ter-te comigo sozinha
Numa noite enluarada,
É toda a vontade minha
E nem desejo mais nada.
198
Tinha tudo a meu favor
e não vivia ao relento,
se tu foste meu amor,
passaste assim como o vento…
199
Tinha um sonho benfazejo,
ao raiar da adolescência,
ser um cantor sertanejo
para as prendas da querência.
200
Toda noite durmo e sonho
com os teus olhos brilhantes,
porque teu rosto risonho
nem me deixa por instantes…
201
Trovas de amor e saudade
trazem mil temas diversos,
mas predomina a amizade
nascendo de tantos versos…
202
Tua pele morena clara
Tem um quê de sedutor,
Não sei com que se compara…
Deve ter muito calor.
203
Tudo não passou de um sonho
tão rápido e fugidio;
um pensamento enfadonho
que de nada me serviu.
204
Um casamento perdura
pela amizade e o respeito,
pois quem ama com ternura
só vê amor, não defeito !
205
Vai-se um amor… outro vem…
e assim se passam os dias.
Os nossos sonhos também
são de mágoas e alegrias.
206
Vive de amor, se te apraz,
e nunca percas a calma;
porque a verdadeira paz
só se encontra dentro da alma.
207
Vivemos na contingência
de alimentar a crendice,
que o caminho da existência
vai nos levar à velhice.
208
Vivia fazendo versos,
crendo ser feliz, enfim,
vejo-os agora dispersos
e faço trovas pra mim…
209
Vou reler Mário de Andrade,
os poemas são assim;
falam a realidade:
este, portanto, seu fim.
210
Vou vivendo na incerteza
de assumir o nosso amor;
a renúncia tem tristeza,
da tristeza surge a dor…

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Domitilla Borges Beltrame


 1
A exemplo de um bom peão,
eu já não tenho altivez;
se um amor me joga ao chão
tiro o pó...tento outra vez!
2
A favela à luz da lua
é um presépio em miniatura.
Mas, ante o sol, triste e nua
tem de um calvário a estatura.
3
Agora que tu partiste,
sinto a força da verdade,
do grito de dor que existe
no silêncio da saudade.
4
Além, no horizonte, à borda
de um infinito sem véu
o lindo arco-íris é a corda,
que os anjos pulam, no céu!
5
A mamãe cura o dodói,
afaga, põe atadura…
e o rosto do seu herói
se lambuza de ternura!
6
A nossa fé é a virtude
que nos dá tanto otimismo,
que deixa ver, da altitude,
a flor nas trevas do abismo!
7
Assim banhada de lua,
em um silêncio encantado,
a velha matriz da rua
guarda o perfil do passado!...
8
A Trova, bem trabalhada
e que é feita com ternura,
é como jóia engastada
em nossa literatura!
9
A tua volta eu aguardo
sem censuras, satisfeita,
como quem carrega o fardo
na fartura da colheita.
10
A vovó não tem memória:
perde os óculos… na testa!
Mas jamais esquece a história
da varanda… e uma seresta!…
11
Brigamos, mas a tormenta
em instantes se desfaz...
um grande amor sempre inventa
um arco-íris de paz!
12
Brigamos...o amor se cala...
mas o orgulho não se importa,
pois a saudade se instala,
qual mendiga, à minha porta!...
13
Briguei contigo, é verdade,
peço perdão, volto atrás
e faço desta saudade
bandeira branca de paz!
14
Cavaquinho, violão,
o bandolim e o pandeiro.
Acrescente o coração
e eis o "choro" brasileiro!
15
Colorindo o alvorecer,
a claridade dourada
qual um gari, vem varrer
segredos da madrugada!…
16
Com altivez, disse um dia:
- “Ir procurar-te? Jamais!”
Mas a saudade vadia
não respeita o “nunca mais”…
17
Com as "notas" da alegria,
ou "dissonância" sofrida,
Deus compõe a melodia
da partitura da vida!
18
Cuidado se ao inocente
mostras um caminho escuro;
és passado, no presente,
comprometendo o futuro.
19
Das ofensas de um irmão
não guardes nenhum rancor,
que um minuto de perdão
vale uma vida de amor!
20
Depois do agrado, é verdade,
apressado ele partia...
Mas hoje tenho saudade
da saudade que eu sentia…
21
Diz a garota sapeca
ao seu flerte deputado:
-O que guardas na cueca
é o que tem me conquistado...
22
Em minha terra morena
- meu Brasil de tanta luz –
velando a noite serena,
estrelas brilham em cruz!
23
Em minha varanda, a sós,
vendo os ganchos na parede,
eu choro a falta dos nós
que amarravam nossa rede!
24
Eu ergo a taça a brindar
a noite que o quarto invade
e no cristal do luar
bebo o vinho da saudade!
25
Eu não entendo porque
fica assanhado o meu gato
todas as vezes que vê
o buraquinho do rato...
26
Eu não te esqueço e confesso:
No calvário da lembrança,
teu corpo ficou impresso
no sudário da esperança!... 
27
 Foste embora e, na saudade,
a ofensa se fez lição:
-descobri que o amor-verdade
se alicerça no perdão!
28
Guardando o Sol na algibeira,
o céu, de estrelas brilhantes,
mostra a Lua, alcoviteira
dos segredos dos amantes…
29
Lembro a garoa...a seresta...
minha feliz mocidade
e o que restou desta festa
embala minha saudade!
30
Li teu bilhete: "Lembranças!".
E, na emoção que me invade
um carrilhão de esperanças
desperta minha saudade !
31
Minha mágoa se retrata
neste porto... Junto ao cais,
pois, na espera, me maltrata
o medo do “nunca mais”...
32
Na calmaria aparente,
num silêncio enganador,
saudade dentro da gente,
grita mais alto que a dor...
33
Na alegria de ser mar
o rio atravessa as matas
e na pressa de chegar
se precipita em cascatas!
34
Na tarde macia e doce,
teu retrato à luz dourada,
me sorri como se fosse
a saudade emoldurada!
35
Nesta vida rotineira,
tua saudade em minha alma
é cantiga de goteira
em noite de chuva calma!
36
No alento para viver
mergulhando em teu olhar,
sou como um rio a correr
na eterna busca do mar...
37
No jardim ali da praça,
por entre as flores de lis,
a minha saudade passa
brincando de ser feliz.
38
Nossa união, em verdade,
é assim perfeita, eu suponho:
tu és sol da realidade.
Sou lua, carrego o sonho !
39
Oh! minha mãe, quando eu falho,
tua lágrima rolada,
é qual pérola de orvalho
sobre a rosa machucada!...
40
"Olvidarei !"...E, orgulhosa,
nem chorei na despedida,
mas, a saudade,teimosa,
foi no meu lenço, escondida!
41
O marido agonizante,
insistindo quer saber:
- Fui traído?...E ela hesitante:
- E, se você não morrer?!
42
O meu pranto é só carinho
quando lembro a mocidade...
é garoa, de mansinho
na seresta da saudade!...
43
O nosso amor escondido,
sem promessa de aliança,
tem o sabor proibido
da fruta da vizinhança!...
44
Para o encontro dos amantes,
o dia cerrou o olhar,
mas, indiscreta, em instantes,
a lua veio espiar!
45
Perco todos os cansaços
e minha angústia tem fim,
ao doce som dos teus passos
no cascalho do jardim…
46
Preciso, mesmo a chorar,
de coragem ser vestida,
pois já vejo em teu olhar
a sombra da despedida...
47
Procure espalhar, na vida,
alegria em sua estrada,
que a alegria dividida
é sempre multiplicada! 
48
Quando a lágrima apagou
o meu verso apaixonado,
a despedida ficou
num bilhete inacabado!…
49
Quando a lembrança me invade
no porto da vida – e quanto!
- brilha o farol da saudade
sob a neblina do pranto!
50
Quando a vida, num desmando,
fecha a porta da esperança,
vem a saudade, arrombando,
as janelas da lembrança !…
51
Quando entre estrelas flutua,
qual um brilhante e tão bela,
parece-me um broche, a lua,
que a noite põe na lapela...
52
Que murmurem, não me importa ...
Pecado, nossos abraços?!
Deixo o mundo além da porta ,
faço meu céu em teus braços !
53
Rasgando o ventre da serra,
num parto de luz e cor,
o sol vem brindar a terra
numa oferenda de amor!
54
Revejo o passado e penso,
sem surpresa e sem espanto,
que o tempo, às vezes, é o lenço
com que Deus me enxuga o pranto…
55
São flores, eu penso vê-las
uma azul...outra dourada...
quando o Sol colhe as estrelas
dos canteiros da alvorada!...
56
Sobre a praia, com amor,
em noites de lua cheia,
o mar se faz trovador
e espalha versos na areia!…
57
Sou um pecador confesso.
Do teu castigo a alguns passos,
um só favor eu te peço:
-Crucifica-me em teus braços!...
58
Teu adeus fez dos meus dias
um contraste que tortura,
são tão poucas alegrias
e saudades com fartura…
59
Toma o chá "Mate Leão"
como remédio, o vizinho:
Se mata bicho grandão,
vai matar meu "vermezinho"...
60
Tricotando o sapatinho,
a mamãe para um momento
e acaricia o pezinho
no seu ventre, em movimento.
61
Tua face envelhecida
oh! Mãe, de tanto lutar…
Diz cada ruga, querida,
quanto sofreu por amar!
62
Um aceno...a despedida...
Vou soluçando os meus ais...
E, mais triste que a partida
é prever o"nunca mais"!...
63
Vem a noite e, sem tardança,
esta saudade se espalma
e acorda tua lembrança
adormecida em minha alma !
64
Vendo a descrença ao meu lado
e a esperança por um triz,
eu chego a achar que é pecado
crer na vida e ser feliz!
65
"Voltarei"! Dizes depressa
num agrado à despedida:
-fica comigo a promessa
e em tuas mãos, minha vida.
66
Vou carregar vida afora
esta dor que mortifica,
por eu não ter tido agora
coragem de gritar: Fica!

José Valdez de Castro Moura (Trovas em Preto & Branco)

  por José Feldman Análise das trovas e relação de suas temáticas com literatos brasileiros e estrangeiros de diversas épocas e suas caracte...