domingo, 31 de outubro de 2021

Flávio Roberto Stefani (Querência de Trovas) 5

A gatinha, de bom tom,
só quer mesmo, no seu ninho,
em vez de um baita edredom
um musculoso gatinho...
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A gatinha, na balada,
viu seu gato, com um "cacho",
e partiu para a "porrada",
mostrando quem era o macho...
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Ah. se eu pudesse, faria,
tudo de novo outra vez,
estudava economia,
pro salário dar pro mês...
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Á noite, a velha se atiça
e, nesse embalo, se deita,
mas o velho, com preguiça,
dele nada se aproveita...
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Chuta o balde a Dona Mima
porque o marido, Vavá,
em vez de partir pra cima,
vai pra baixo do sofá…
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Da cana vem a caninha
e isso me basta, Senhor;
depois de uma cachacinha,
passa toda e qualquer dor!…
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Deixei o relógio em casa
para ver se a bruxa espanta,
pois ele sempre se atrasa,
e se atrasa, não adianta…
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Desesperado, o ladrão,
vendo que vítima orava,
roubou-lhe a própria oração
só pra dizer que roubava…
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É político de escol,
sabe tudo, até no escuro,
faça chuva ou tenha sol,
não sai de cima do muro...
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Esse inverno tudo arrasa
e a gente agora aconselha
ter sempre guardado em casa
um bom cobertor de orelha...
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Minha herança foi “pobrinha”
pois meu pai, vivendo em rios,
deixou tudo pra vizinha,
e eu fiquei a ver navios…
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Morre a sogra... e no velório,
aparece, no cantinho,
o genro com o foguetório
já prontinho... já prontinho...
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Na jogada de furor,
a galera aperta o passo,
quando o urso driblador
faz o gol e sai pro abraço...
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No desespero, o casal
vestiu a roupa ao contrário,
e o flagrante foi fatal:
"Casal mal vestido e otário..."
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O jogo foi traiçoeiro,
e foi expulso o infeliz,
porque o chute foi certeiro
bem nas partes do juiz...
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O pijama de bolinha,
não anima nada, nada...
e o coronel perde a linha,
a vontade, o jeito, a espada...
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O soldado trapaceiro
vai pra banda, e, como tal,
“tá” treinando o dia inteiro
para ser o general...
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Põe pijama, baixa o som...
E o meu compadre, na cama,
bem na hora do "bem bom"
só quer mostrar o pijama...
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Pra sogra que mora ao lado,
tem um remédio chinfrim:
fazer um muro elevado,
igualzinho ao de Berlim...
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Toda vez que o time afunda,
deixando a torcida à míngua,
a rima, rica e profunda,
está na ponta da língua...

Fontes:
Flávio Roberto Stefani. Novas andanças e outros poemas.
Cachoeirinha/RS: AgênciaTexto Certo, 2013.

UBT Porto Alegre – Planeta Trovador, 2017.

domingo, 24 de outubro de 2021

A. A. de Assis (Saudade em Trovas: Luiz Otávio)

 
 

Prof. Garcia (Caderno de Trovas) 2

 
Com meu cinzel afiado,
e o martelo do desgosto,
esculpi, amargurado,
a solidão do meu rosto!
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Da sorte, nunca lamente.
Ame a vida com seus ais,
que a sorte de muita gente
cresce em falsos pedestais!
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Dizem que a justiça é cega.
Não creio, é falsa premissa;
cega, àquele que se apega,
aos infiéis da justiça!
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Em meio às indiferenças,
dar bons exemplos preciso,
jogando fora as ofensas
dentro da fonte do riso!
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Em silêncio, a tua rede,
com saudade, chora tanto,
que, do armador da parede,
respingam gotas de pranto!
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Enquanto, tu buscas rindo,
a paz do azul desse mar...
Eu busco esse abismo infindo
do verde do teu olhar!
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Eu amo as gotas serenas
do orvalho que beija a flor,
porque sei que são apenas
serenas gotas de amor!
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Eu ouço em tuas demoras,
vozes de outros rituais...
Na ressonância das horas
do martelar dos meus ais!
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Meu sertão não tem floresta,
é pobre o pó deste chão...
Mas esta paz que me empresta
me faz amar meu sertão!
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Não reclamo ante os escolhos,
nas trevas, mantenho a calma...
Quem tirou-me a luz dos olhos,
pôs luz e brilho em minha alma!
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Nesse casebre sem dono.
tive uma infância tão boa;
mãe, foi rainha sem trono,
papai, um rei sem coroa!
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No amor, há tanta afeição,
na família, há tanto bem...
Que os filhos dos filhos, são
netos, e filhos também!
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No mosteiro abandonado,
na solidão da clausura,
o silêncio é tão calado
que à solidão se mistura!
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Nos momentos mais tristonhos,
das ilusões mal sonhadas...
Sou tropeiro dos meus sonhos
tangidos nas madrugadas!
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Nosso amor teve a mistura
na dose certa, e depois...
Fomos viver, na ternura,
do eterno amor de nós dois!
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O mundo inteiro se arrasta,
sofre, lamenta e padece;
mas a crise não se afasta,
e em todo canto ela cresce.
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Pobreza dói mas não mata,
não faz vergonha a ninguém;
pobre, é quem tem ouro e prata,
mas quer ter mais do que tem!
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Por cicatrizes, marcado,
teu rosto guarda a virtude,
de um riso, lindo, poupado,
do tempo da juventude!
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Por longa que seja a espera,
calma, que tudo se alcança!
Enquanto houver primavera
não morre a flor da esperança!
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Quando acenaste, à distância,
vi, no teu gesto tristonho,
que um sonho de nossa infância
foi simplesmente, outro sonho!
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Se a avareza te angustia,
e a humildade te seduz...
Neste Natal que te guia,
tu serás luz de outra Luz!
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Sê feliz na caminhada,
esquece o bem que te fiz...
Nem sempre o fim de uma estrada
é o fim de quem foi feliz!
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Sei que a velhice me alcança;
e, entre uns sins e outros senões...
Enquanto houver esperança
vou cultivando ilusões!
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Toda Trova é linda flor,
flor que perfuma e inebria,
se a Trova é rosa de amor,
sou canteiro de poesia!

Fontes:
Francisco Garcia de Araújo. Cantigas do meu cantar. Natal/RN: CJA Edições, 2017.
Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livros enviados pelo trovador.

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