quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Aparício Fernandes (Trovadores Indígenas)


É sabido que a Trova já existia em Portugal, na época do descobrimento do Brasil. Vai daí, os portugueses trouxeram-na para nossa terra, onde encontrou um meio fertilíssimo para aprimoramento e expansão. Impõe-se, porém, uma pergunta fascinante: existiria a Trova no Brasil, antes de os portugueses aqui chegarem? Não estaria ela integrada à cultura artística dos nossos indígenas? A ser isto verdade, teríamos uma dupla origem da Trova no Brasil, justificando a inegável tendência do nosso povo pela quadrinha setissilábica. A este respeito, o Professor Faris Antônio S. Michaele, residente em Ponta Grossa, no Paraná, escreveu um interessantíssimo estudo intitulado “O Nosso Primeiro Trovador”‖, que foi publicado no n. 128 da revista santista Centro Português, em setembro de 1968. Eis um trecho do referido artigo, que submetemos à apreciação do leitor, sem maiores comentários:

Os nosso primeiros trovadores foram, de fato, os índios, principalmente os tupis-guaranis. É o que nos informam os cronistas, viajantes e missionários do Século XVI (Gabriel Soares de Souza, Fernão Cardim, Ambrósio F. Brandão, Magalhães Gandavo) e confirmam os estudiosos de séculos posteriores, até os dias atuais (Alexandre Rodrigues Ferreira, Couto de Magalhães, Barbosa Rodrigues, Batista Caetano, Batista Siqueira, Villa-Lobos, José Siqueira, Mário de Andrade, etc.), não excluindo o alemão Von Martius, que tanto viajou e sofreu por este ilimitado continente.

Trovas amorosas, folclóricas e até de fundo animista são facilmente encontradas nas obras desses autores dos séculos XIX e XX. Mas o que nos faz pensar um bocado sobre a vivacidade mental do nosso irmão tupi-guarani é a mordacidade, que nada tem de primitiva, das suas composições referentes às agruras da vida, aos contatos com o português (termo geralmente usado para caracterizar os brancos de todos os tipos), ou às contínuas perseguições, massacres e espoliações injustificáveis, num país tão vasto.

De Von Martius todos já conhecem as duas quadrinhas, adaptadas por Joaquim Norberto do seguinte modo:

Não quero mulher que tenha
as pernas bastante finas,
com medo que em mim se enrosquem
como feras viperinas.

Também não quero que tenha
o cabelo assaz comprido,
que em matos de tiririca
achar-me-ia perdido.


Da boca de dois tupi-guaçus, vindos de Aquidauana, Estado de Mato Grosso, ouvimos, há alguns anos, algumas trovas, que vamos reproduzir no original, com a respectiva adaptação ao português, por nós realizada.

São cantadas em nheengatu, ou tupi moderno:

1
Cariua, puxyuéra oikó,
Anhangá opinima ahé;
Tatá opumun i pó,
Tiputy, i iurú popé.

Tradução:
Português é bicho mau,
foi pelo diabo pintado.
Sua mão vomita fogo,
tem boca em lugar errado.

2
Irara ou iané ira,
Iauraeté, capiuàra;
Ma, Caríua piá-puxy,
I mukáua-iucaçára.

Tradução:
Irara comeu o mel,
onça grande, a capivara;
porém é o branco cruel
que a espingarda nos dispara.

3
Caríua, ndê tinguaçú;
Caríua, macaca sáua.
Andirá ce py opitera:
– Ce manioca ndê reú.

Tradução:
Homem branco, nariz grande,
como o macaco, és peludo;
morcego, chupou meu pé,
comeste mandioca e tudo.

4
Macaca tuiué, paá,
Cuiambuca ahé Okuáu;
Amurupi, iané piá,
Mundé çui, nti oiauáu.

Tradução:
Dizem que macaco velho
nunca se deixa enganar;
ao contrário, o coração
nunca cessa de apanhar.


Como estão vendo os leitores, o indígena brasileiro, que produziu a maravilhosa cerâmica de Marajó; que como ninguém conhecia os astros e coisas do firmamento; e que ao branco ensinou mil e uma experiências úteis, até de fundo medicinal, era, igualmente, e é, ainda hoje, estupendo cultor da poesia e, com especialidade, da Trova.

Por isso, sem nenhuma reserva, merece, com os nossos agradecimentos, o título espetacular de o primeiro ou mais antigo trovador da terra de Santa Cruz.

Fonte:
Aparício Fernandes. A Trova no Brasil: história & antologia. Rio de Janeiro/GB: Artenova, 1972

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Calazans Alves D’Araújo (1902 - 1976)

Ao ver-te colhendo flores,
tive esse desejo vão:
transformar-me numa flor,
para estar em tua mão.
- - - - - –

É meu peito uma gaiola
vazia, sem passarinho.
Ah! Se eu pudesse, menina,
guardar nele o teu carinho!
- - - - - –

Este nosso velho mundo
já não está prestando mais:
rapaz querendo ser moça…
moça a querer ser rapaz...
- - - - - –

Eu sou como aquele ramo
da roseira, que ficou
muito triste, sem a rosa
que mão perversa arrancou.
- - - - - –

Eu sou seu, você é minha,
somos os dois – galho e flor
juntinhos, amando e rindo,
felizes no nosso amor.
- - - - - –

Invejei aquele feio
e miserável mendigo
que te pediu uma esmola…
(e eu nunca falei contigo!)
- - - - - –

Nasci no Brasil: me orgulho
de ser daqui do Nordeste,
onde as mulheres são lindas
e os homens cabras-da-peste.
- - - - - –

O beijo da nossa linda
morena pernambucana,
é gostoso como o mel
feito da cana-caiana.
- - - - - –

O vento desfolha as flores,
jogando-as no pó do chão.
Fez assim com os meus amores
a cruel ingratidão.
- - - - - –

Quando Ziza por mim passa,
eu me ponho a suplicar:
- Nossa Senhora da Graça
não deixe Ziza casar…
- - - - - –

Quanto mais galopa o tempo,
corre veloz, vai-se embora,
mais meu coração te ama,
busca e quer, muito te adora.
- - - - - –

Que desejo extravagante
este do meu coração:
querer ser o travesseiro
onde dorme Conceição!
- - - - - –

Quem fez o céu tão bonito,
a floresta, o campo, o mar,
não devia ter-me feito
para sofrer e chorar.
- - - - - –

Que tenho sido na vida?
No mundo, que tenho sido?
— Um velho barco perdido
numa enseada esquecida...
- - - - - –

São meus olhos dois mendigos,
dois miseráveis plebeus,
pedindo, ao bater-te à porta,
uma esmola aos olhos teus.
- - - - - –

— Tão longe! — disseste olhando
o céu. Eu disse: Tão perto!...
Falei do céu de teus olhos,
alegrando meu deserto...
- - - - - -

Tu gostas de minhas trovas,
eu gosto do teu olhar.
Foi por causa dos teu olhos
que eu aprendi a trovar.
 - - - - - –

Vendo da mulher o riso
Diz a feroz onça preta:
- Não torço esse meu sorriso
por essa horrível careta.

****************************************
Calazans Alves D'Araújo nasceu em 1902 e faleceu em 1976. Residia em Catende/PE. Poeta e trovador. Professor em diversas cidades do Pernambuco. Publicou em 1961 um livro intitulado "Ao Doce Embalo da Rede", trovas e em 1973, “Flauteio do Sabiá”.

Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Ed. Minerva.
– Calazans Alves D’Araújo. Ao doce embalo da rede.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Hermoclydes S. Franco (Oração de São Francisco em Trovas)

Hermoclydes Siqueira Franco
Niterói/RJ, 1929 – 2012, Rio de Janeiro/RJ
_________________
Fazei-me agente Senhor
de Vossa radiosa paz.
Permita que eu leve o AMOR
onde o ÓDIO esteja mais...

Onde estiver a OFENSA
que eu sempre espalhe o PERDÃO...
Onde houver DISCÓRDIA, intensa,
que eu sempre faça a UNIÃO!

Onde DÚVIDA existir,
que eu possa levar a FÉ
e onde o ERRO persistir,
toda a verdade da SÉ...

DESESPERO em ESPERANÇA,
TRISTEZA em pura ALEGRIA,
que eu transforme, com bonança,
as TREVAS em LUZ do dia...

OH! Mestre – Amor Singular –
concedei, seja meu fado
CONSOLO a todos levar,
mais do que ser CONSOLADO!

Que eu consiga COMPREENDER,
mais do que ser COMPREENDIDO.
Possa AMAR, com todo o ser,
muito mais que SER QUERIDO!

Pois DANDO é que se RECEBE
- ao irmão necessitado -
PERDOANDO se percebe
que, também, se é PERDOADO!

Dai-me, Senhor, a esperança,
pela maneira mais terna,
pois MORRENDO é que se alcança
a glória da VIDA eterna!…

Fonte:
Trovas enviadas pelo autor.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

A. A. de Assis (Bela alma a do poeta)

  
Bela alma a do poeta
 
Quantos sons você conta aí?…

Suponhamos que sete: Be-la-al-maa-do-po-e-ta.

Mas por certo haverá quem conte seis, ou mesmo cinco, dependendo do ouvido de cada um. Dá-se isso por obra do bendito hiato, o inimigo número um da métrica. Parece que para a maioria dos poetas brasileiros o verso fica mais agradável quando se respeitam os hiatos, porém outros acham mais natural fundir as vogais. E como é que se resolve isso? Sabe-se lá…

O maior drama é nos concursos. Você não sabe se conta poe-ta ou po-e-ta. O jeito é torcer para que os julgadores acatem o sotaque de cada autor. Em regra, não se derruba nenhuma trova em razão desse problema; entretanto, mesmo assim, o concorrente fica de pé atrás, pelo medo de quebrar o cujo…

A tendência, como foi dito, é pronunciar po-e-ta, vi-a-gem, a-in-da, a-al-ma, a-ho-ra, o-homem, o-ou-ro, po-ei-ra, su-a, to-a-da etc.

Mas… e se você não concordar? Tudo bem. Você continuar escrevendo seus versos do modo que mais lhe agrade, e pronto. Afinal de contas, quem manda no texto é o autor. Se bem que alguns, por via das dúvidas, têm feito o seguinte:

Se, por exemplo, mandam a trova para um concurso no Rio de Janeiro, contam "fri-io", em dois sons;

Se o concurso é em São Paulo, contam "friu", num som apenas.

Outros, mais cuidadosos ainda, procuram de toda forma evitar hiatos.

Resolve? Bem… Pelo menos pode livrar a trova do risco de perder pontos por não soar bem no ouvido do julgador. São ossos que o poeta encontra em seu delicioso ofício…

Fonte:
Revista Virtual Trovia – ano 8 – n. 88 – Outubro 2006

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Izo Goldman (Orientação para Participação em Concurso de Trovas) Sistema de Envelopes


1 – Não envie a mesma trova para mais de um concurso.

2 – Nos envelopes (de mais ou menos 7 x 11 cm), não datilografe/digite nada além da trova, a não ser o tema (quando o concurso exigir – e a maioria o faz).

3 – Não datilografe/digite a trova toda em maiúsculas.
 
Nota do blog: Não escreva no envelope com letras manuscritas, mesmo que em letra de forma, serão automaticamente eliminadas.

4 – Não utilize envelopinhos transparentes, nem de outra cor que não seja a branca.

5 – Os concursos apoiados por Seções ou Delegacias da UBT devem seguir a tradição do sistema de envelopes, que consiste em datilografar-se a trova na face externa de envelopinhos, com a identificação, endereço e assinatura do concorrente colocados em seu interior. No envelope que conterá o/s envelopinho/s colocar como remetente: LUIZ OTÁVIO e o endereço do concurso como na face da frente, ou o nome do concurso com o respectivo endereço. Nunca colocar qualquer identificação pessoal do lado externo do envelope.

6 – Ao receber comunicado de classificação e convite para as  festividades de um concurso, não deixe de responder, ainda que sem possibilidade de comparecimento, para que os coordenadores tomem as providências necessárias.

7 – Os concursos geralmente possuem âmbito municipal, âmbito estadual, âmbito nacional e/ou âmbito internacional. O trovador só poderá participar de um deles, aquele determinado pelo seu domicílio.

Caso hajam trovas líricas/ filosóficas e humorísticas, é facultativo ao trovador participar de um deles ou ambos.

8 – Alguns concursos não permitem o uso de derivados ou palavras cognatas. Outros, exigem que a palavra Tema conste da trova.

9 – Observar o número máximo de trovas que pode ser enviado ao concurso.

10 – A Comissão de seleção das trovas do concurso elimina apenas as trovas com erros, fora do tema, sem sentido, etc., não importando a qualidade.

sábado, 16 de janeiro de 2021

Nilton Manoel (Como Fazer Trovas) 3a. Parte, final

www.rainhadapaz.g12.br

TROVAS DEMONSTRATIVAS DA APLICAÇÃO DAS DEZ REGRAS DA METRIFICAÇÃO


Estas trovas foram feitas para demonstrar os diferentes casos de aplicações das dez regras da metrificação. Têm, pois, finalidade didática. Devemos observar em cada uma, pela numeração, aplicação correspondente. O conteúdo não tem relação com as regras, mas tão somente com as formas das trovas.

O fundo está relacionado com as mensagens generalizadas sobre os estudos de Metrificação. Portanto, julguem-nas como utilidade didática e como curiosidade, e não como valor artístico.
(Luiz Otávio - Santos - SP., 26/03/1974).

1ª regra - última tônica

Poderá a força elétrica
de um sábio computador
ensinar contagem métrica
mas não faz um trovador...

2ª regra - pontuação

Pensa em calma! Evita errar,
Injusto é se nos reprovas,
Pois não queremos mudar
o modo de fazer trovas

3ª regra - encontro consonantal

Você pode acreditar
ter a pura convicção
que a ninguém vou obrigar
a ter a minha opinião...

4ª regra - vogal fraca + fraca

Podes crer és muito injusto
e estás longe da verdade:
pois na trova a todo custo
defendo a espontaneidade...

5ª regra - vogal forte + fraca

É uma história bem correta
em tudo o ensino é preciso,
no entanto, só poeta
quer ser gênio de improviso...

6ª regra - junção de três vogais

Esta é uma regra indiscreta,
convenções, mal amparadas,
induzem muito poeta
a convicções enraizados.

7ª regra - ditongos

Para medir nossos versos,
se o ouvido fosse o juiz,
em nossos metros diversos
ninguém poria o nariz...

8ª regra - encontros vocálicos ascendentes

Na trova, soneto ou poema,
em toda parte do mundo
se a Forma é o seu dilema
sua alma é sempre o fundo!

9ª regra - encontros vocálicos descendentes

As dúvidas são pequenas
não sejas tão pessimista,
dá-me a tua ajuda, apenas,
e será bela a conquista

10ª regra - licenças: aféreses, síncopes, apócopes, ectlipses.

É mui// feio criticar(apócope)
/inda que seja um direito (aférese)
pra ser justo, aulas vem dar (síncope)
com o teu plano sem defeito... (ectlípse)

Frase mnemônica para decorar as dez regras de metrificação:
"Tendo paciência e Estudo você versejará tecnicamente direito encontrando estética e lirismo." (T = tônica; p = pontuação; e = encontros consonantais; v = vogal fraca; v = vogal forte; t = três vogais; d = ditongos; e = encontros vocálicos ascendentes; e = encontros vocálicos descendentes; l = licenças poéticas).

Luiz Otávio

Fonte:
http://movimentodasartes.com.br/trovador/pop/pop_01.htm

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Nilton Manoel (Como Fazer Trovas) 2a. Parte


Para melhor compreensão do Decálogo de Metrificação, ele vem seguido de um Glossário, por Ordem Alfabética.

DECÁLOGO DE METRIFICAÇÃO
(autoria de Luiz Otávio, editado em Ribeirão Preto)

1) - As sílabas são contadas até a última tônica do verso.

2) - As pontuações não impedem as junções de sílabas.

3) - Não se deve fazer o aumento de uma sílaba métrica nos encontros consonantais disjuntos, (ou seja: não usar "suarabacti").

4) - Uma vogal fraca faz junção com a vogal fraca ou forte inicial da palavra seguinte.

§ único - Aceitam-se exceções a esta regra no sentido de evitar a formação de sons duros e desagradáveis. Exemplo: "cuja ventura/única consiste".

5) - Uma vogal forte, pode ou não, fazer junção com vogal fraca da palavra seguinte, no entanto jamais deve fazê-la com vogal forte.

§ único - Nos casos em que se prefira a junção "forte + fraca", deve-se ter sempre o cuidado de evitar sons desagradáveis ("mais que tu/ardo") ou formar novas palavras ("via ao invés de "vi a...").

6) - Pode haver a junção de três vogais numa sílaba métrica.

§ 1º - Não deve haver mais de uma vogal forte.

§ 2º - No caso em que a vogal forte não esteja colocada entre as vogais fracas e sim em 1* e 3* lugar, para que seja correta a junção, as duas vogais fracas devem juntar-se por crase ou por elisão, e não por sinalefa (ditongação).

Assim, estará certo:

"é a ambição que nos prende e nos maltrata", e não se pode unir as três vogais de "e a / intima palavra derradeira".

§ 3º - Deve ser usada com cuidado a junção de mais três vogais, embora haja casos corretos de quatro e até de cinco vogais.

7) - Os ditongos aceitam as pré-junções com vogais fracas ("E eu"). As post-junções são aceitas somente nos ditongos crescentes (encontros instáveis) ("a distância infinita") e são repelidas nos ditongos decrescentes. ("Eu sou/a que no mundo anda perdida").

§ único - Há casos de uso facultativo de pré-junção de vogais forte aos ditongos, quando essas vogais são as mesmas dos iniciais dos ditongos e não forem as tônicas das palavras.

(Aceita-se: "Será auspiciosa" e será inaceitável: "Terá/auto nos pontos".

8) - Nos encontros vocálicos ascendentes (formados por vogais os semivogais átonas seguidas de vogais ou semi-vogais tônicas), a sinerese é de uso facultativo. ("ci-ú- me" ou "ciú-me", etc.).

§ único - Há neste grupo, excepcionalmente, encontros vocálicos que não aceitam a sinérese. Geralmente, são formados pela vogal "a" seguida das vogais "a", ou "e" ou "o" (como em: Sa/ara, a/éreo, a/orta, etc.) ou, alguns casos, do mesma vogal "a" seguida das semi-vogais "i" ou "u" tônicas, como em: "Para/íso, "ba/ú", etc.

9) - Nos encontros vocálicos descendentes (formados por vogais ou semivogais tônicas seguidas de vogais ou semi-vogais átonas) não se aceita a sinérese ("tua", "lua", "frio", "rio" etc., sim, "tu/a", "su/a","fri/o", "ri/o", etc.

§ único - Em algumas regiões do Brasil é usada a sinérese nestes encontros vocálicos, com base na fonética local. No entanto, não será aceita na Metrificação, em benefício da uniformidade, uma vez que na maioria dos Estados é feita a separação dessas vogais.

10) - 0 uso da aférese ("inda", etc), síncope ("pra", etc), apócopes ("mui", e de ectilípse ("com a", "o", "as", 'os") é facultativo.

§ 1º - A junção de "com" mais palavras iniciadas com vogais átonas é correta mas pouco usado. Acompanhando a maioria dos poetas, sempre que possível, deve ser evitada. ("com amor") etc.

§ 2º - A junção de "com" mais palavras iniciadas com vogais tônicas não
será aceita. ("com esta" etc.).

§ 3º - A junção de fonemas anasalados "am", "im", etc., com vogais átonas ou tônicas não será aceita. ("formaram" / idéias", "cantaram / hinos" etc.).

§ 4º - E preciso cuidado com o uso de aféreses, síncopes e apócopes que, por estarem em desuso ou por formarem, geralmente, sons desagradáveis, irão ferir a sensibilidade e os ouvidos dos leitores e dos ouvintes.

GLOSSÁRIO (Por ordem alfabética, para melhor compreensão do Decálogo de Metrificação)

Aférese - supressão de sílabas ou fonema inicial ("/inda").

Apócope - supressão de sílaba ou fonema final ("mui"//").

Crase - fusão de duas vogais numa só ("a alma"; "e este" etc.).

Diérese - transformação de um ditongo num hiato ("sa/u-da-de").

Ditongo - fusão de uma vogal + semivogal, ou vice-versa; na mesma sílaba. ("sai", " falei", "Niterói", etc.).

Ditongo crescente - semivogal + vogal (pátria, gênio, diabo, etc.).

Ditongo decrescente - vogal + semivogal (pão,meu, dourado, etc.).

Ectipe - supressão de um fonema nasal final para possibilitar a crase ou ditongação (sinérese) com a vogal inicial da palavra seguinte. ("com o", "com amor", etc.).

Elisão - supressão da vogal átona no final de uma palavra. ("Ela estava" = "Elistava").

Encontros consonantais - duas consoantes unidas:

a. inseparáveis - ("bl" - bloco; "fl" - "flor", etc) ou "grupos consonantais",

b. separáveis - ("gn" - ignóbil; "bs" -Observar) ou "encontros consonantais disjuntos".

Hiato - uma sílaba terminada, por vogal-base seguida de outra iniciada também por vogal-base. ("re/eleger", ca/olho, a/éreo, etc.) (Rocha Lima); é o encontro de duas vogais pronunciadas em dois impulsos distintos, formando sílabas diferentes. (sa/ara, podi/a, sa/úde, etc.) (Cegalla).

Encontros vocálicos ascendentes - designação de Luiz Otávio - é o encontro de duas vogais ou semivogais, pronunciadas separadamente, sendo a primeira fraca e a segunda forte. (ci/ú-me, vi/o-la, po/e-ta, cru- el-da-de, etc.).

Encontros vocálicos descendentes - designação de Luiz Otávio - é o encontro de duas vogais ou semivogais, pronunciadas separadamente,

Junção a primeira forte e segunda fraca. ("di/a", "tu/a", "ri/o" , etc.).

Junção - designação de Luiz Otávio - no sentido generalizado para traduzir a união de sílabas métricas, Abrange pois, os diferentes processos de diminuição de sílabas poéticas. (comumente e erradamente empregada pela maioria dos poetas como elisão).

Ver no Glossário, os vários processos ou métodos para diminuir as sílabas métricas ou processos de fazer a junção de sílabas: crase, elisão, sinalefa, sinérese, alferese, síncope, apócope e ectipse.

Postjunção - designação de Luiz Otávio - junção posterior a uma sílaba ou palavra.

Prejunção - designação de Luiz Otávio - junção anterior a uma sílaba ou palavra.

Semivogais - são os fonemas "i" e "u", quando ao lado de uma vogal formam uma sílaba com elo. (Assim em: "pai", "mau", o "i" e o 'u" funcionam com valor de consoante, em "lu-ta", vi-da", funcionam com função de vogal).

Sílaba ou métrica ou poética - são sílabas nos versos, (contagem diferente das sílabas gramaticais).

Sinalefa - fusão ou junção de vogais ou semivogais, entre duas palavras, formando ditongo (Este amor" = "Estiamor").

Síncope - supressão de fonema ou sílaba no meio da palavra ("p/ra").

Sinérese - transformação de um hiato em ditongo, na mesma palavra. ("ci-úme" em ciú-me".

Suarabacti - "aumento de uma sílaba métrica, pela pronúncia das vogais de apoio, nos encontros consonantais disjuntos". (Luiz Otávio) "i-gui-no-rar".

Tônica - sílaba forte, acentuada.

Vogais - "Fonemas sonoros, que se produzem pelo livre escapamento do ar pela boca e se distinguem entre si por seu timbre característico", (Rocha Lima).

Vogal forte ou fraca - a vogal átona ou acentuada (tônica) da palavra ou verso.
* * * * * * * * * * * * * * * *  
continua…
 
Fonte:
http://movimentodasartes.com.br/trovador/pop/pop_01.htm

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Nilton Manoel (Como Fazer Trovas) 1a. Parte


O INSTRUMENTO

Ao estudarmos a Arte de trovar ou a composição da Trova, devemos analisá-la em duas partes: o Corpo e a Alma, ou a Forma e o Fundo.

Na parte correspondente à Forma teríamos o Ritmo - resultante da metrificação e das tônicas; a Melodia - conseguida pelas rimas e pelo emprego harmonioso das vogais e consoantes; e a expressão gramatical e poética.

Na parte correspondente ao Fundo, teríamos: a Mensagem poética, a originalidade (e o "achado"), a comunicabilidade, a simplicidade, a harmonia interna, etc.

A UBT iniciou seus estudos por uma das partes da Forma ligada ao Ritmo, ou seja especificamente - pela metrificação.

Não se pretende ensinar a ninguém a ser trovador, como não se pode fazer um pintor, um músico, um escultor. Todas as Artes têm, no entanto, sua aprendizagem técnica. Além destes conhecimentos é necessário o dom. Se não podemos transmitir este dom, poderemos ensinar a parte formal ou técnica de cada Arte.

Na Música, Pintura, etc., esta aprendizagem é feita rotineiramente.

Na Arte de versejar há uma resistência em fazê-la e mesmo uma tendência para menosprezá-la. E às vezes, esta deficiência aparece camuflada com o pomposo lema de "Liberdade Poética". Mas não se pode torcer os fatos.

Se o músico aprende a tocar o seu instrumento, o poeta também possui um instrumento de comunicação e deve aprendê-lo. E o idioma e o verso são os instrumentos do poeta.

RAZÕES PARA ESTE ESTUDO

Temos recebido, através dos anos, muitas consultas verbais e epistolares, de trovadores que desejam saber como deveriam contar as sílabas dos seus versos. Por outro lado, tomando parte em muitas Comissões Julgadoras de Concursos de Trovas, observamos inúmeras discussões, com perda de tempo de exaltação de ânimos, devido às diferentes interpretações das regras de metrificação. Há, também, em alguns livros especializados, deficiências de explicações e até mesmo alguma obscuridade.

Achamos pois, que deveríamos fazer estes estudos, buscando um "denominador comum" ou uniformização de normas do UBT em seus Concursos de Trovas. Seria uma sistematização útil para concorrentes e juízes, extensiva a outros gêneros e a outras Associações.

Além da utilidade para iniciantes, concorrentes e juízes, estes estudos poderão dar um grande prestígio literário à UBT, pelo seu pioneirismo e pela sua profundidade.

DÚVIDAS E DESCONFIANÇAS

Várias dúvidas e desconfianças poderão surgir no espírito daqueles que não estiverem bem entrosados com as nossas pesquisas ou desconhecerem as finalidades de nossos estudos.

Que não se julgue, por exemplo, que a UBT está exorbitando de suas funções ao fazer um estudo destes. Nenhuma Associação do País, nestes 15 anos tem organizado tantos Concursos de Trovas.

Calculamos que nossas Seções e Delegacias receberam de seiscentas a novecentas mil trovas. Assim pois, mais do que ninguém, sentimos o problema e a necessidade de resolvê-los.

Além de dúvidas sobre métrica, havia dúvidas sobre certas designações. Vamos também tentar desfazê-las.

Não há, como pode parecer, a qualquer crítico mais apressado, um culto exagerado da Forma, em detrimento do Fundo.

Começamos o estudo pela metrificação porque era o ponto que oferecia mais dúvidas e discussões. E também, porque a metrificação é algo de objetivo que poderemos regulamentar e chegar a um acordo. Ao passo que o Fundo (a mensagem) é algo imponderável, subjetivo.

Uma dúvida que a muitos desanima e inquieta é que seja impossível encontrar um "denominador comum" porque os casos de divergências são inúmeros e complexos. Isto é apenas uma impressão inicial. Quando nos aprofundamos nestes estudos vemos que o assunto não é tão complexo e que podemos catalogar os inúmeros casos em poucos grupos e subgrupos.

Foi o que fizemos.

Há desconfianças ingênuas que até nem mereciam comentários. Mas que fique bem claro que não pretendemos fabricar trovadores.

No entanto, poderemos ajudar os iniciantes e talvez mesmo a outros trovadores, a aperfeiçoar a sua parte técnica.

Não pretendemos, também, mudar a maneira de fazer a trova, nem tirar a sua espontaneidade, nem tolher a liberdade poética de ninguém.

Pelo contrário, defendemos a simplicidade da trova e o seu não "aparnasiamento" ou "academização".

Não é por desejarmos melhor aprendizagem do forma da trova, ou o encontro de um "denominador comum" na metrificação que estaremos tirando a sua espontaneidade.

Outras causas que combatemos outros exageros que observamos, estes, sim, "academizam" a trova, como "enjaibements" em excesso; abusos de ordens indiretas; o culto demasiado de rimas ricas ou raras; a exigência de tônicas em sílabas predeterminados; a proibição de rimas homófonas (nos 4 versos) e de rimas oxítonas entre o 1* e 3* versos, etc.

DIFICULDADES

Encontramos algumas dificuldades para realizar nossas tarefas. Mas foram superados.

Ora, aquela tendência para menosprezar a Forma;
ora, a luta contra as convicções enraizadas baseadas em convenções nem sempre lógicas;
ora o pessimismo ou derrotismo de alguns que achavam ser a tarefa difícil demais ser terminada;
ora, velhos tabus aceitos e repetidos sem uma análise mais profunda, e, finalmente, a má vontade de alguns poucos, que além de jamais cooperarem, vivem sempre a criticar negativamente.

Mas o saldo positivo foi bem maior. Além da útil cooperação de muitas Seções, Delegados e Sócios da U.B.T., tivemos também ajuda de alguns que não pertencem à nossa Entidade.

A estes os nossos profundos agradecimentos. Aos outros respondemos o nosso trabalho sério, amplo, profundo e democrático.

O ENSAIO E O RELATÓRIO, DE LUIZ OTÁVIO.

Seis meses antes de receber as respostas dos Consultores e Pesquisadores, da Comissão de Estudos da U.B.T., Luiz Otávio escreveu um Ensaio sobre Metrificação com 21 páginas datilografadas, tamanho ofício, que finalizava com um "Decálogo de Metrificação", (Julho-Agosto de 1973).

Cópia deste Ensaio foi entregue ao trovador Carlos Guimarães - Presidente da U.B.T. Nacional.

Ao ser solicitada pelo Carlos Guimarães para acumular a função de Presidente da Comissão de Estudos com a de Relator, Luiz Otávio aquiesceu. Recebeu então de Carlos Guimarães, em janeiro de 1974, as respostas de 43 consultores e de 10 pesquisadores que leram e anotaram 21 livros de Poesias .

Elaborou o Relator, 22 grandes mapas, em dois lados e analisou e escreveu o relatório de 43 páginas. Teve o relator a honra e a satisfação de ver que seu Decálogo de Metrificação tinha sido confirmado, após tantos estudos, pesquisas e respostas de inúmeros trovadores de várias cidades do Brasil.

Houve pequenos ajustes visando a dar maior segurança e clareza ao Decálogo.

A COMISSÃO DE ESTUDOS, ESTRUTURA, AGRADECIMENTOS

Agradecemos a cooperação da:
Comissão Central: Luiz Otávio (Presidente Relator), Carlos Guimarães, Carolina Ramos, Idália Krau, P. de Petrus e Noel Bergaminí.

Consultores: Seções da U.B.T. de Belo Horizonte, Campos, Corumbá, Curitiba, Fortaleza, Guanabara, Magé, Niterói, Petrópolis, Sete Lagoas, Ateneu Literário e Artístico - IDEALEDA-ANGOLA.

Trovadores e Poetas: José Machado Borges, Vicente Viotti, Lúcio Flávio de Miranda - Belo Horizonte; Walter Siqueira Campos; Gabriel Vandoni de Barros, Lécio Gomes de Sousa, Osório Gomes de Barros, Magali de Souza Baruki, Walmir Coelho - de Corumbá; Vera Vargas - de Curitiba; Cesar Coelho, Hidelbardo Sisnando, Vasques Filho - de Fortaleza; P. de Petrus. Iraci do Nascimento e Silva, Guimarães Barreto, Noel Bergamini - Rio de Janeiro; Adolfo Macedo - de Magé; Milton Nunes Loureiro, Sávio Soares de Souza, Maria de Lourdes do Vale Araujo de Barros; Maria do Conceição Pires de Melo (Manita), Raul de Oliveira Rodrigues - de Niterói, Carolina Azevedo de Castro, Hélio Chaves, Farid Félix - de Petrópolis; Judith Coelho Maciel - de Sete Lagoas; Carlos Guimarães - do Rio de Janeiro; Carolina Ramos, David Araújo, Luiz Otávio - de Santos; Dimas Lopes de Almeida de Portugal; Helvécio Barros - de Bauru; Jacy Pacheco - de Niterói; Lilinha Fernandes; Maria Idalina Jacobina, Murilo Araújo, Vasco do Castro Lima - do Rio, Rodolpho Abbud - de Nova Friburgo, Nilton Manoel. - de Ribeirão Preto-SP.

Pesquisadores: Ivo dos Santos Castro, ldália Krau, Lúcia Lobo Fadigas, Micalclas Corrêa, Maria Idalina Jacobina, P. de Petrus, Noel Bergamini, do Rio de Janeiro; Carolina Ramos, Luiz Otávio e Maria Campos da Silva de Santos.

Poetas Pesquisados: Gonçalves Dias, Fagundes Varela, Olavo Bilac, Vicente de Carvalho, Filinto de Almeida, Hermes Fontes, Raul de Leoni, Murilo Araújo, Martins Fontes, Vicentina de Carvalho, Alphonsus de Guimarães, Menoti del Picchia, Manuel Bandeira, Colombina, Florbela Espanca, Eugênio de Castro, J. G. de Araújo Jorge, Paulo Bonfim, Antologia de Osório Duque Estrada.

BIBLIOGRAFIA

Além dos livros de Poesia citados no item anterior, foram consultados outros sobre Arte Poética, como os de Antonio Freire de Carvalho, Costa Lima. Osório Duque Estrada, Olavo Bilac e Guimarães Passos, Murilo Araújo, Geir Campos e os Ensaios inéditos de Luiz Otávio e Micaldas Correa.

Foram consultadas, também, as Gramáticas de Rocha Lima (1a. edição) e de Domingos Paschoal Cegalla (12a. edição).

Neste pequeno resumo não podemos recordar as noções sobre versos e pontos gramaticais a ele relacionados. Sugerimos que as noções básicas do verso, tais como:
sílabas métricas,
ditongos,
hiatos,
processos de diminuição de sílabas métricas (crase, elisão, sinalefa, sinêreses, síncopes, apócopes, elipses, etc.) sejam recordadas e consultados os livros especializados, como os citados na Bibliografia.

continua...

Fonte:
http://movimentodasartes.com.br/trovador/pop/pop_01.htm

José Valdez de Castro Moura (Trovas em Preto & Branco)

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