segunda-feira, 31 de julho de 2017

Frazão Teixeira (1902 - ????)


1
Aliança de ouro – esperança
de horas risonhas e puras,
se une o casal na bonança
une-o também nas agruras.
2
A minha vida era triste,
da solidão era presa,
mas tu chegaste e sorriste,
e lá se foi a tristeza.
3
A Morte nos leva à porta
do céu, quando Deus nos chama;
se somos maus, não importa,
– no céu entrará quem ama.
4
A razão tem seus ditames
que o coração não compreende;
ela te diz que não ames,
e o coração não atende.
5
A sorte deu-me um tesouro
de inestimável valor;
não foi nem prata, nem ouro,
apenas foi teu amor.
6
A trova é manto que teço
com fios de desenganos;
depois com ela eu aqueço
minha alma ao passar dos anos.
7
A trova é um bem que se almeja
em quatro versos oculto,
mas, para mim, talvez seja
um sonho morto insepulto.
8
Cultivo este gesto lindo
de ser útil por prazer,
pois penso que dar sorrindo
é melhor que receber.
9
É grande espelho este mundo:
– se ris ele também ri,
se odeias, ódio profundo
verás em torno de ti.
10
Eu hoje vivo cantando,
feliz da vida, porque
eu sinto que estou amando,
e meu amor é você.
11
Há ternura em teu olhar
e calor nos lábios teus,
quando vens depositar
teu beijo nos lábios meus.
12
Não espere em alvoroço
para não se lamentar;
“a esperança é bom almoço
mas também um mau jantar.”
13
Não lamente os dissabores;
cicatrizada a ferida,
sempre se aprende nas dores
dos maus embates da vida.
14
Não se faz trova, ela existe
já feita como o carvão;
ser, pois, trovador consiste
em abrir o coração.
15
No outono da vida, o amor,
entre as dádivas divinas,
parece ser como a flor
nascida junto às ruínas.
16
Nuvens são trovas ao léu,
que nos primeiros albores
Deus coloriu lá no céu
em tons de todas as cores.
17
O barco se despedindo
singra no rumo perfeito,
e esta saudade surgindo
também singra no meu peito.
18
Ponha amor no coração
e nos lábios um sorriso;
para ser feliz, então
nada mais será preciso.
19
Tal como uma flor colhida,
cujo aroma nos invade,
emana da despedida
o perfume da saudade.
20
Tudo que nos acontece
uma causa deve ter;
amor enfim me parece
a causa de eu te querer.

domingo, 30 de julho de 2017

Doralice Gomes da Rosa


1
A frágil rosa em seu galho
depois que o vento passou,
desfolhou-se sobre o orvalho
que a madrugada deixou.
2
A franga sente o perigo,
vendo o frango já galeto,
diz a ele: eu vou contigo
pra rodar no mesmo espeto.
3
A mulher grita, se zanga
quando o marido, afobado,
invés de soltar a franga,
solta um frango congelado.
4
Anda estranho meu gatinho,
parece coisa mandada,
na cama nenhum beijinho,
é só rom-rom e mais nada.
5
Ao Patrão Velho e buenacho,
pedindo, tiro o chapéu:
- Olha um pouco aqui pra baixo,
manda uma bênção do céu.
6
Ao ver o broto nadando,
o vovô, já bem caduco,
se joga na água, gritando:
"Tô maluco, tô maluco!"
7
Apeie, peão, se abanque,
venha tomar chimarrão!
Amarre o pingo ao palanque:
- Aqui, ninguém é patrão!
8
Aquela coroa enxuta,
mal anoitece, ela sai,
dizendo que vai à luta
- só Deus sabe onde ela vai!
9
As lembranças e euforia
dos folguedos de criança
gravei no peito em poesia
onde a saudade descansa.
10
Brigamos qual cão e gato
sem razão, sem um motivo.
Ele me arranha, eu lhe bato,
mas sem meu gato não vivo.
11
Cai a chuva e com malícia,
num jeito todo atrevido,
vai moldando com perícia
teu corpo sob o vestido.
12
Chimarrão, tem mais sabor
quando a bomba prateada
volta trazendo o calor
dos lábios da minha amada!
13
Diz, num porre, o coroinha,
na missa, ao Padre Pimenta:
- Eu só tomei umazinha,
o resto foi água-benta!
14
Hoje, nós dois, no abandono;
perdidos, sem mais escolhas:
– dois galhos secos no outono
que o vento varreu as folhas.
15
Já fui frango revoltado,
dono, rei do meu terreiro.
Hoje, velho, aposentado,
nem subo mais no poleiro.
16
Levando um chute o magrinho
ao jogar uma pelada,
o que já era pouquinho
acabou virando nada.
17
Magro dos pés ao pescoço,
feio do fim ao começo,
o Zeca era o próprio esboço
de uma caveira ao avesso.
18
Mais um Natal se anuncia
e em minha mesa hoje tem:
uma cadeira vazia
a esperar por quem não vem.
19
Marujo ao pisar na areia
traz do mar lendas estranhas,
nunca viu uma sereia
mas fisgou muitas piranhas.
20
Marujo velho, o Raimundo
quando em vez dá uma ensaiada,
levanta a vela e vai fundo
mas qual, só nada, mais nada!
21
Meninas, eis um conselho:
vêde bem por onde andais!
A honra é como um espelho,
se quebrar, não cola mais...
22
Minha gata por capricho
ronda o gato do vizinho.
Mas o danado bicho
sai miando e bem fininho.
23
Na ilusão de ser amado,
sonho a grandeza dos sábios,
bebo o licor do pecado
no cálice dos teus lábios.
24
Não quero saber de intriga
pois cheguei à conclusão:
é melhor viver sem briga,
do que brigar com razão!
25
Na solidão do meu rancho,
nossa rede, que ironia,
ainda presa no gancho,
embala a noite vazia.
26
Nesta taça de licor
transbordando de ternura,
brindaremos nosso amor,
nossos sonhos de ventura.
27
Nosso amor é um triste enredo
que o destino emaranhou,
fez de nós dois um brinquedo
que em tuas mãos se quebrou.
28
O bebum, num corrupio,
cheio de pinga e de mágoa,
não percebendo o desvio,
se foi com os burros n’água.
29
O capeta à Terra veio,
fugindo do fogo eterno
e ao ver o mundo tão feio,
voltou correndo pro inferno.
30
O frango muito fuleiro
pula o muro, canta grosso,
vai ciscar noutro terreiro
e acaba virando almoço.
31
Para brindar a partida
de alguém que já não me quer,
bebo o champanha da vida
nos lábios de outra mulher.
32
Pra sorrir não tenho hora...
nas mágoas não me concentro;
mostro um sorriso por fora,
mesmo chorando por dentro.
33
Quando a sogra vem chegando,
com olhar de cobra mansa,
eu corro, me desviando,
mas ela sempre me alcança!
34
Quando eu cruzar a porteira
para o plano do infinito,
levarei minha bandeira
com meu protesto e meu grito!
35
Que o velhinho em seu trenó,
campeando luas e luas,
tenha compaixão e dó
dos piás que vivem nas ruas!
36
Sogra boa - não se iluda!
Se existiu, morreu à míngua.
A não ser que seja muda
e a boca não tenha língua.
37
Teu amor é uma jangada
que aportou com muito jeito
e agora vive ancorada
nas amarras do meu peito.

sábado, 29 de julho de 2017

Marina Gomes Valente


1
A flor da fraternidade
floresce no coração
de quem ama de verdade
o próximo como irmão.
2
A mulher traduz ternura,
doação, vida e amor;
colabora com doçura
com a obra do Criador.
3
As árvores são sagradas,
são um milagre da vida;
no entanto, são derrubadas
pela ambição desmedida.
4
As paixões desenfreadas,
excessos de comilança,
mostram vidas desregradas
onde falta temperança.
5
Camélia é flor delicada,
tal qual um floco de neve.
Sentida, fica queimada,
mesmo com um toque leve.
6
Capricho da natureza?!...
Mão humana em gesto arteiro?!...
Cenário de tal beleza,
só se Deus for brasileiro...
7
Com roupagens só de amor
vistamos o coração,
sem ódio e nenhum rancor
para abrigar um irmão.
8
Contemplar o mar infindo,
entender sua poesia,
ver o sol se despedindo
é sentir paz e alegria.
9
Dama da noite, de branco,
com as vestes de cetim,
enfeita à noite o barranco
transformando-o num jardim.
10
De nada vale o rancor
que só deixa cicatrizes;
tecendo laços de amor
seremos bem mais felizes.
11
Engrinaldada de flores,
surge a mais bela estação,
e a alegria chega a cores
a cantar no coração.
12
Família ideal é aquela
onde há paz, docilidade;
por mais que seja singela,
tem um quê de majestade.
13
Gorjeiam os passarinhos
na ramaria orvalhada.
Primavera, nos caminhos,
vai despertando a florada.
14
Não adianta modelar
o corpo com perfeição,
se não soubermos moldar
com amor o coração.
15
Não importa a cor da pele,
o que importa é a inspiração
de uma trova, que revele
o que sente o coração.
16
Nesta era da informática,
computadores de mão,
sugam da família, a prática
da confraternização.
17
Nesta vida o tempo ensina:
quem partilhar seu amor
a paz também dissemina,
exterminando o rancor.
18
O esforço de uma formiga,
mais que exemplo é uma lição:
seu objetivo persiga
com fé e determinação.
19
Ó geração gananciosa,
desperta, presta atenção!
A arara azul, tão graciosa,
corre o risco da extinção!
20
O sonho de uma criança
pode a nós ser aplicado:
à luz da perseverança
poderá ser realizado...
21
Para encantar a velhice,
ser tranquilo, sonhador,
há que, desde a meninice
plantar sementes de amor…
22
Paz nasce do coração
de quem aprendeu a amar
a todos, sem distinção,
porque soube perdoar.
23
Pelas ruas, no passado,
nos realejos risonhos,
um periquito amestrado
passava vendendo sonhos.
24
Plante uma árvore, amigo,
que ela é sinal de esperança.
Se não lhe servir de abrigo,
servirá a uma criança.
25
Porque a “Fé move a montanha”,
não posso deixar de crer
que esta saudade (tamanha!)
vai um dia perecer.
26
Primavera e juventude,
presentes da Providência:
cores, vida em plenitude
que alegram nossa existência!
27
Protegida, a natureza
dará frutos a granel,
flores de rara beleza
e favos prenhes de mel.
28
Quando o amor fala mais alto
o mais prudente é calar;
coração em sobressalto
dá o recado pelo olhar.
29
Quem espalha em seu caminho
a paz, o amor e a alegria,
não caminhará sozinho,
terá Deus por companhia.
30
Rosa é a rainha das flores,
outra mais bela não há;
nem mesmo, com seus primores,
a flor do maracujá.
31
Seja em estrada de ferro,
seja em estrada florida,
posso dizer e não erro:
-assim vai o trem da vida!
32
Será livre de verdade
quem fizer a diferença,
quebrando o elo da maldade
e abraçando a benquerença.
33
Sob os tons crepusculares,
sem ninguém que nos impeça,
nosso barco cruza os mares
sem destino, sem ter pressa...
34
Sobre as vagas do oceano,
voando num céu de anil,
sinto alegria e me ufano
de estar voltando ao Brasil!
35
Sonha o menino acordado
com a bola e pé no chão,
ser um craque consagrado
e integrar a seleção...
36
Sonho um mundo colorido,
flores perfumando a estrada,
sem um ai, sem um gemido
de criança abandonada.
37
Tão humilde, a margarida,
sem perfume, sem magia,
para não ser esquecida,
por entre os ramos, espia.
38
Um casal alicerçado
no amor e na compreensão
deixará grande legado
à futura geração.
39
Um desafio na vida
é vencer tribulações
e a paciência nos convida
a refrear emoções.
40
Um trevo de quatro folhas
nascido no meu jardim,
trouxe entre tantas escolhas,
muita sorte para mim.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Josafá Sobreira da Silva


1
A deturpação dos fatos
é tão comum entre a gente,
que a corrente de boatos
passou a ser voz corrente!
2
Anote e depois confira,
visando seu próprio bem:
meia-verdade é mentira,
verdade-e-meia também!
3
Ao despedir-me de ti,
sujeito a carências novas,
compenso a paz que eu perdi,
buscando alento nas trovas!
4
Ao homem muito ciumento
há um dilema que aperreia:
ou esquece o casamento,
ou casa com mulher feia!
5
A saudade é uma corrente!
Só agora percebi,
livre de ti, finalmente,
e, afinal, mais preso a ti!...
6
Casamento de verdade,
pouca gente ainda procura:
querem ter a propriedade
sem pagar pela escritura!
7
Como trabalha o rapaz!
Mas não invejo esse estilo:
- na cama, tudo o que faz
é só tirar um cochilo…
8
Da chuva não corro mais!
Não pago esse mico, ó gente:
correr dos pingos de trás
pra me molhar nos da frente?
9
Deixaste a casa vazia,
mas há um retrato na sala;
e é dessa fotografia
que o teu silêncio me fala!
10
Deus construiu, no horizonte,
onde ninguém pode ver,
uma belíssima ponte
que a gente cruza... ao morrer.
11
Dúvida é sempre clareza!
E aqui vai a explicação:
- quem duvida tem certeza
de que está em confusão!
12
Essa azul coloração
das araras a voar
coloriu meu coração
e não sei como apagar!...
13
Há um piano na cabana
que espera, de tampo aberto,
expor, à perícia humana,
seu recital encoberto!
14
Meu consolo, na tristeza,
quando, no peito, a agasalho,
é o pranto da natureza,
nas gotas tristes do orvalho.
15
Minha máscara de austero,
que eu usei com tanto gosto,
sabe o quanto eu não a quero,
mas passou a ser meu rosto!
16
Namorar em rua clara?
Nunca fiz essa loucura!
Quem tem vergonha na cara
só namora em rua escura.
17
Numa euforia tremenda,
além de qualquer limite,
ouvi o riso da agenda
ao registrar teu convite!
18
Nunca consigo a proeza
de uma bola no buraco!
Será defeito da mesa
ou defeito do meu taco?
19
O comilão não se esquenta
na fila pra ver seu peso:
ou diz que a balança aumenta,
ou fica atrás de um obeso...
20
O meu prêmio, ao fim do dia,
é um sorriso na janela
de onde os lábios da alegria
beijam os meus, antes dela!
21
Quando vovó faz faxina,
vovô teme o seu capricho,
pois ela tudo examina:
Não tem uso? Vai pro lixo!
22
Quem entra ali pra jogar
ingressa um tanto cabreiro...
Há uma placa no lugar:
“Buraco? Só a dinheiro!”
23
Se, aos gritos, me manifesto,
já perdi a discussão,
pois quem grita num protesto
já mostra não ter razão!
24
Se há barragens no percurso,
aprende a lição do rio
que, em paz, retoma o seu curso
após saudável desvio!
25
Só agora eu percebi
a ganância do coveiro:
tem buraco por aí
que é uma mina de dinheiro!
26
Sobre as águas refletidos,
nuvens...matas...céu de anil...
tudo evoca aos meus sentidos
a bandeira do Brasil!
27
Sou velho metido a moço
e ainda levo à loucura!
Se me diz: 'morda o pescoço!",
cravo nela a dentadura!
28
Surpreso por teu aceno,
com timidez e apetite,
eu, tolo, me achei pequeno
para aceitar teu convite!
29
Traz a injustiça a discórdia,
mas a justiça me assusta:
À luz da misericórdia,
nunca vi justiça justa!

terça-feira, 18 de julho de 2017

Newton Vieira


1
A existência – uma jornada...
E eu vejo, desde menino,
mais graça ao longo da estrada
que no lugar de destino…
2
Agora vivemos sós...
e dói, de modo incomum,
saber que o abismo entre nós
não teve motivo algum!
3
A apatia afasta mais
que os longes quilometrados,
pondo abismo entre casais
às vezes de braços dados!...
4
As nossas almas, amigo,
eram tão gêmeas, que, ao fim
da convivência contigo
senti saudades de mim!...
5
A utopia, em minha mente,
traduz-se desta maneira:
– Um lugar inexistente
que existirá, caso eu queira!...
6
Curvem-se todos os sábios
ante o saber infinito
que a mãe derrama dos lábios,
mesmo sem nada ter dito!
7
Dai-me perdão para o amor
contrário ao Vosso preceito.
Sei tantas coisas, Senhor,
menos amar de outro jeito!
8
“Darás à luz” – Anuncia
alguém do Eterno oriundo.
Plena de Graça, Maria
diz “Sim!” e transforma o mundo!
9
É do passado a lição,
mas com valor no presente:
- Só pode ter corpo são
quem tem saúde na mente.
10
Em Friburgo, qual Moisés,
julguei que Deus me dizia:
- "Tira as sandálias dos pés,
que estás no chão da poesia!"
11
Encontrei, como num sonho,
este amor forte e sem fim:
- a ponte na qual transponho
abismos dentro de mim...
12
É pequena, mas se expande
pondo em trovas mil louvores;
Jambeiro - cidade grande
no mapa dos trovadores!
13
É triste ver alguém cheio
deste vazio medonho:
- ter feito apenas rodeio
em torno de um grande sonho!
14
Eu amo... e, de tal maneira
o amor em mim se enclausura,
que sempre estou na fronteira
entre a razão e a loucura!...
15
"Eu volto!" - Falsa promessa
que ela ainda crê verdadeira,
pois, da varanda, não cessa
de contemplar a porteira...
16
Feliz Natal, com certeza,
promoverás, meu irmão,
se o pão que sobra na mesa
chegar às mesas sem pão.
17
Ficou mais lento o meu passo?
Caminharei, mesmo assim!
Só temeria o cansaço
se me cansasse de mim..
18
Mãos calosas... Entretanto,
cingem de amor o filhinho...
Roseira não perde o encanto,
apenas por ter espinho!…
19
Nasceu do acaso este amor...
cresceu...e, agora, acredito,
é bem capaz de transpor
as fronteiras do infinito!…
20
No rodeio do existir,
peço a Deus, a todo instante,
que eu não caia e, se cair,
com mais força me levante.
21
Nos meus braços estarias,
se tu não fosses, querida,
a maior das utopias
que acalentei nesta vida!
22
No Vosso martírio, eu pude
ver quatro quedas, Jesus,
quando um velho, sem saúde,
caiu na fila do SUS!...
23
O amor que escolhi um dia
expõe-me à língua do povo?
Dane-se o povo! Eu faria
a mesma escolha, de novo!
24
O que eu mais quero na vida
é a paz reinando na Terra,
mas não a paz confundida
com mera ausência de guerra...
25
Por mais que sofra, eu espero
ouvir somente a verdade;
é melhor o “não” sincero
do que o “sim” da falsidade.
26
Quando, amigo, nos teus ombros
deitei o rosto tristonho,
tu me ergueste dos escombros
que a vida fez do meu sonho!
27
São tantas encruzilhadas!...
Por isso eu me perco assim,
ao trafegar nas estradas
que existem...dentro de mim!...
28
Se tu te julgas montanha,
convém que então te assinales
pela bondade tamanha
de dar proteção aos vales.
29
Se o nosso amor é pecado,
esconda-o lá nos refolhos...
e só me mande recado
pelas meninas... dos olhos!
30
Sou quase feliz, querida.
Aceita ser minha e faze
que seja, então, destruída
a tal barreira do... quase!
31
Venceste alguém... e sorris
numa explosão de prazeres...
Serás, porém, mais feliz
quando a ti mesmo venceres...

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Ozório Porto


1
A fonte, assim cristalina,
nascente à margem da estrada,
é obra de mão divina
ao sedento em caminhada.
2
A lua fria, indiscreta,
invadiu meu barracão;
veio confortar o poeta
que curtia a solidão.
3
Creio que a felicidade
não convive em poluição;
por isso deixa a cidade
pra viver lá no sertão.
4
De pintor vou dar-te a prova
– e sem gastar muita tinta -
revelando nesta trova
que tens oculta essa pinta.
5
Deus fez tudo tão correto,
tão medido, tão certinho…
Que é feliz o humilde teto
do mais humilde ranchinho.
6
Dormindo sonho contigo.
Acordado penso em ti.
E por isso eu não consigo
esquecer quem já perdi.
7
Essa quadrinha que eu faço,
tão simples, tão inocente,
leva da alma um pedaço,
leva um pedaço da mente.
8
Esse mal que me tortura,
que me aflige e me consome;
esse mal, assim, sem cura,
só eu sei… Tem o teu nome.
9
Eu andei sempre correndo
por este mundo sem fim;
acabei envelhecendo
sem sequer lembrar de mim.
10
Foi-me dado um dia, em sonho,
minha infância reviver:
Brinquei, corri, fui risonho
e fui feliz a valer.
11
Já vi rio em chama ardente,
já senti calor da lua,
mas não vi, até o presente,
falsidade como a tua.
12
Maior que essa deficiência
que limita o que produz,
é o amor, na sua essência,
que compreende e que conduz
13
Meu coração, esse tolo,
que hoje inda espera por ti,
tem tão só, como consolo,
a esperança que eu perdi.
14
Meu coração silenciou
ao estetoscópio, com medo,
e ao doutor não revelou
um nada do seu segredo.
15
Meu pensamento se expande
e o trovador põe à prova:
Criança... Um tema tão grande
nos quatro versos da trova...
16
Minhas trovas têm um quê
que as outras trovas não têm:
Falam sempre de você,
e falam de mim também.
17
Miscigenação bendita,
és a grande responsável
pela beleza infinita
dessa mulata adorável!…
18
Na exiguidade do espaço
que me resta a percorrer,
cada trova é como um passo
no caminho do viver.
19
Nas entrelinhas da trova,
às vezes, paira um lamento
que facilmente comprova
uma dor, um sofrimento.
20
Nas noites de lua-cheia,
contemplo ao longe a cascata;
parece que ela se enleia
num manto feito de prata.
21
Nos rodopios da valsa,
fazendo juras de amor,
não supus que fosse falsa
quem me causa tanta dor.
22
Numa trova eu digo tudo,
tudo, tudo o que eu quiser;
desde que tudo que eu diga
seja tudo da mulher.
23
Percorri árduos caminhos
pra chegar onde cheguei;
guarda marcas, lembro espinhos
das trilhas por onde errei.
24
Pra manter minha alegria
um quase nada é o bastante;
fazer trovas cada dia
e abraçar-te a cada instante.
25
Quando criança eu queria
ser homem, sábio, talvez…
Hoje bem que gostaria
de ser criança outra vez!…
26
Quando eu era pequenino
contava o tempo a cantar…
Hoje lembro do menino
e conto o tempo a chorar.
27
Quem sofre do mal de amor,
sofre, sofre até morrer!…
Não há remédio ou doutor
que possa o mal desfazer.
28
Se à noite a lua opalina
envolve em luz a palhoça;
transforma em tela divina
um quadro humilde da roça.
29
Sem a fonte luminosa
e a retreta domingueira,
ficou triste e até saudosa
nossa Praça da Bandeira.
30
Se você não vai cumprir
o quanto me prometeu;
proponho lhe devolver
os beijos que já me deu.
31
Sonhei que estavas casando
numa igreja da roça,
que ouvia o padre abençoando
essa união que era nossa.
32
Só transportando criança,
velha KOMBI ao trafegar,
guarda um mundo de esperança,
rotulada de ESCOLAR.
33
Talvez, riacho cantante
que se despenha em cascata,
sejas tu um poeta errante
dizendo trovas à mata.
34
Teu beijo tem a doçura
de um doce favo de mel;
mas esperá-lo é tortura
que amarga mais do que o fel.

domingo, 16 de julho de 2017

Rita Marciano Mourão


1
Bilhetes de amor... saudade
que a lembrança hoje cultua
onde a tal felicidade
era o carteiro da rua!...
2
Cansado, frágil, tristonho,
quando a fé lhe pede um preço,
o escritor faz de um bom sonho
outro livro, outro começo…
3
Com máscara da ilusão
minha altivez nem percebe
quando a porta da emoção
ergue a tranca e te recebe.
4
De minissaia, a coroa
tenta a sorte... lá na praça.
De longe alguém diz: - É boa...
Mas de perto... assusta a caça.
5
Depois de tantos verões,
talento pouco me importa.
No jardim das ilusões
já sou como folha morta.
6
Deriva meu corpo, enquanto
contra os reveses reluto.
Hoje o tempo usa meu pranto
para cobrar seu tributo.
7
Desato o nó da lembrança
e um facho de luz sem fim
me traz de volta a criança
que o tempo levou de mim!
8
Diz o velho, em maus trejeitos:
- Como o carnaval é ingrato:
com produtos tão perfeitos,
a distância nega o prato!
9
Entre cristais, vinhos nobres,
com saudade, hoje lamento
do campo as canecas pobres
mas tão ricas de alimento!
10
Ergo o cristal, já vencida,
mas a razão me renega,
quando a emoção, iludida,
bebe o vinho e a ti me entrega!
11
Escrevo, reluto... E assim
da tristeza eu vou fugindo.
O escritor que habita em mim
me ensina a sofrer sorrindo.
12
Este espinho que me atira
aos braços da dor sem fim,
é o fruto desta mentira
que você plantou em mim.
13
Faço versos da incerteza,
com talento a dor suplanto.
É bem mais leve a tristeza
dissimulada em meu canto.
14
Lembrança da mocidade,
de um som de lira em seresta...
Ah! como fere a saudade
quando lembrança é o que resta…
15
Levada por fantasia
de um desejo inconsciente,
eu beijo na cama fria
as formas de um corpo ausente!
16
Mesmo ante o furor medonho
de um mar que raivoso freme,
solto a jangada de um sonho
e o sonho conduz meu leme!
17
- Meu filho, veja onde está
o seu querido paizão!...
- Ah! Mamãe, não sejas má,
da outra vez levei "sabão"!
18
Meu salário é duvidoso
qual moça de minissaia.
De longe, acena maldoso,
mas, na mão, foge da raia!
19
Minha jangada à distância,
(velha tábua na enxurrada)
remada por mãos da infância
foi bem mais do que jangada!
20
Na fonte antiga da praça,
que em lembranças recomponho,
a minha ilusão te abraça,
movida por este sonho!…
21
No céu a espalhar magia
com frases mudas, a lua
nas pautas da noite fria
faz versos à minha rua…
22
Nos limites da demência
entre o delírio e a razão
eu beijo um rosto que a ausência
desenha na solidão!
23
Nosso amor meio sem jeito
mas, talentoso e insistente,
vai vencendo o preconceito
que a idade lança entre a gente.
24
No vazio do meu peito,
meu destino de escritor
vai preenchendo, a seu jeito,
velhas lacunas de amor…
25
Perfumada e porte nobre,
na incerteza que a consome,
testou com sabão de pobre
e da rival soube o nome.
26
Pondero... Mas, atrevida,
minha ilusão enche a taça
desta fonte proibida
que à razão condena e embaça!
27
Quando a lua me abre as frestas
das lembranças que são tuas,
de uma lira ouço as serestas
feitas à luz de outras luas!...
28
Quando esta lua indiscreta
me traz lembranças sem fim,
eu choro o velho poeta
que morreu dentro de mim.
29
Relembrando os sons dispersos
das liras da mocidade,
meu sonho acompanha os versos
nas cordas desta saudade!...
30
Ribeirão, cidade nobre,
mas de alma humilde e serena,
és mãe do rico e do pobre,
da pele clara e morena!
31
Ribeirão é terra quente
de clima e de coração.
Qualquer raça, aqui se sente
bem mais gente, mais irmão!
32
Rondando marco após marco,
a minha sorte à deriva,
a ventura é sempre o barco
que do meu porto se esquiva.
33
Sem dinheiro, a pobre Aninha
se refaz em volta e meia:
depois de rodar bolsinha,
tem sempre a panela cheia!
34
Sem lamentar, eu suponho,
ao ver um sonho à deriva:
- mais importante que um sonho
é eu sentir que estou viva!
35
Se o verão tudo arrefece,
talento é inovar quimera;
onde um novo sonho cresce,
sempre existe primavera.
36
Sobras desta trajetória,
os espinhos do desgosto
vão escrevendo outra história
sobre as linhas do meu rosto!
37
Talentoso no passado
mas depois um tanto frio...
e desse amor mal cuidado
restou-me um lar tão vazio!
38
Tiro a máscara... - ouço aflita
de um mar de farsas sem fim
um outro Eu que ainda grita
por vida, dentro de mim!
39
Usou truques à vontade,
tentando a sorte a coroa...
Mas alguém diz: - "Nessa idade,
só gasta cartucho à toa!”
40
Vencendo marco após marco,
alcancei um mar deserto
onde à deriva, meu barco
já não tem mais rumo certo.

sábado, 15 de julho de 2017

Rômulo Cavalcante Mota


1
Aprendi muitas lições,
delas não faço mistério:
– “a rua dos valentões,
tem sede no cemitério”.
2
A quem não sabe a lição,
ensino a pequeno custo:
– “entra na casa o ladrão,
do pobre só leva o susto”.
3
De espelho posso afirmar,
de mulher sei repetir:
– “um reflete sem falar
outra diz sem refletir”.
4
De manhã desperta o nobre,
ouvindo seu passarinho,
“mas despertador de pobre
é o galo do seu vizinho”.
5
De mulher não se adivinha
o que ela disse ou pensou:
– “a mulher que andou na linha
o trem que passou, matou”.
6
Ensina um famoso vate
esta verdade tamanha:
– “coração de rico bate,
coração de pobre apanha”.
7
É profunda, é grande dor,
solidão de um passarinho.
Mais triste é sonhar o amor
e cedo acordar sozinho.
8
Eu lhe digo com certeza
aquilo que você quer:
– “do homem a maior riqueza
é ter sincera a mulher”.
9
Há gente que até graceja,
com esta grande verdade:
– “desconhecendo que é a inveja
fruto da incapacidade.”
10
Há muito já se dizia,
esta lição do passado:
– “solteiro, vida vazia,
como enche a de casado.”
11
Merecem rosas e palmas
quem nos ensina a viver,
“ pois somente as grandes almas
silentes sabem sofrer”.
12
Não tens pena, moreninha,
de quem te espera e não cansa?
Sei que a culpa é toda minha,
nunca me deste esperança.
13
Na vida, vou caminhando,
por este caminho infindo:
– “às vezes pago, chorando,
o que prometi sorrindo”.
14
Nem sempre aquilo que é belo,
é, de fato, o mais bacana:
– “para que queres castelo,
se és feliz numa cabana?”.
15
O rosto é que nos retrata
do coração a ferida:
– “sei que a saudade não mata,
mas nos sepulta com vida”.
16
Para que se vai à guerra
para que tanto barulho,
“ se algum dia a mesma terra
cobrirá o teu orgulho”.
17
Para que tanta corrida
se temos a mesma sorte,
corremos atrás da vida
perseguidos pela morte.
18
Procurei a vida inteira
pelo amor que eu mais queria:
– “a saudade é companheira
de quem não tem companhia”.
19
Quanta gente há que procura
encontrar consolação:
– “a medicina não cura
a dor da separação”.
20
Quem tem uma grande culpa
aos outros a culpa atira:
– “Porque, atrás de uma desculpa
sempre se esconde a mentira”.
21
Tenho amigos e bendigo,
quando me presta socorro:
– “mais vale um cachorro amigo
do que um amigo cachorro”.
22
Teu retrato que eu desejo,
é uma desculpa. Afinal,
na saudade em que me vejo,
quero é o teu original.
23
Todo mundo ri e se dobra
por mais que tenha preguiça:
– “o cão mordido por cobra
tem medo até de linguiça”.
24
Viola de trovador
tem cordas bem afinadas
e, se o tema for amor,
toca em todas as toadas.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Sarah Mariani Kanter


1
A pandorga colorida,
recriando encantamentos,
toca a sonata da vida
na partitura dos ventos.
2
A saudade é luz de vela
iluminando o que eu sou:
descolorida aquarela
que uma renúncia pintou.
3
Cada rio poluído
é uma mensagem de morte,
onde o mundo sem sentido
vai selando a própria sorte!
4
Cada vez o dia-a-dia
faz os dias mais tristonhos,
quando a gente silencia
e sufoca os próprios sonhos…
5
Dos exílios, um existe,
que é pior pois não desterra,
mas faz do exilado um triste
vivendo na própria terra…
6
Eu confesso, estou cansada,
cansada deste brinquedo:
- ser espuma apaixonada
pela sombra de um rochedo...
7
Eu perdi meu coração
entre fantasmas e medos,
no exílio da solidão
de uma infância sem brinquedos..
8
Foste um sonho em meu passado,
e o meu erro mais tristonho
foi deixar de ter lutado
para arrancar-te do sonho…
9
Há nos chás de caridade
muito fausto e ostentação,
e nas ruas da cidade,
crianças sem proteção.
10
Há sempre um circo vazio
e um vazio de esperança,
no coração triste e frio
de quem nunca foi criança…
11
Leva contigo, menino,
este amor dos teus brinquedos,
onde és "rei" e o teu destino
é vencer todos os medos…
12
Mãe preta, meu doce encanto,
que saudade sinto agora,
da tua voz no acalanto
que mandava o medo embora!
13
Meu palhacinho de pano,
quantas vezes te surrei!
Hoje a vida e o desengano
dão-me as surras que eu te dei!
14
Meus ideais em pedaços,
pela vida, destruídos,
foram tristonhos palhaços
de sorrisos não sorridos.
15
Meus sonhos foram ingratos
e sou, de tudo o que resta,
Cinderela sem sapatos,
sem fantasia, sem festa…
16
Minha infância recomponho
nos passos de meu filhinho,
que, refazendo o meu sonho,
também refaz meu caminho!…
17
Na solidão do meu peito,
velho jardim sem amor,
a saudade tem um jeito
de renúncia que deu flor…
18
No infinito o sol flutua
qual rubro barco pirata,
tentando roubar da lua
a sua carga de prata!
19
Nos barquinhos de papel
fui "marinheiro-esperança";
hoje, corsário infiel,
roubo os barcos da lembrança…
20
Nossas ruas de criança
a tão longe nos levavam,
que nem o infinito alcança
o infinito que alcançavam...
21
Numa estranha semelhança
com a caixa de Pandora,
vivo apenas de Esperança,
porque o Sonho foi embora.
22
Olho o mundo... me envergonho
e me tortura dizê-lo:
- hoje a liberdade é um sonho
transformado em pesadelo…
23
O mensageiro fiel
dos sonhos da meninada
é um barquinho de papel
correndo junto à calçada…
24
O meu amor sobrevive
nesta saudade sentida:
o "quase nada' que eu tive
foi "quase tudo" na vida!
25
O que sobra do meu dia,
mal cabe num prato raso:
migalhas de fantasia
que me alimentam no ocaso!
26
Papai Noel, não entendo
o teu serviço postal:
tantas cartas se perdendo!...
Tantos pobres sem Natal!...
27
Pelos caminhos, cansada,
minha esperança perdida,
encontra a porta fechada
no fim da Rua da Vida…
28
Por ser poeta acredito
em dias menos sombrios...
Meu sonho quase infinito
cabe em meus bolsos vazios.
29
Por todo lado cercada
de gente que nem me vê,
eu sou a sombra do nada
que me restou de você.
30
Quando a luz que enche os espaços
espanta a noite do adeus,
vejo a sombra dos meus passos
seguindo a sombra dos teus…
31
Quando às vezes abro a porta
que a renúncia traz fechada,
tua ausência se recorta
na silhueta do nada...
32
Retratando o que hoje somos,
vejo agora que restou
do quase dois que nós fomos
o quase nada que eu sou.
33
Saudade, circo às escuras,
onde um palhaço, a ilusão,
faz trejeitos e mesuras
para o nada e a solidão…
34
Se a vida foi mal vivida,
ao chegar ao fim da estrada
quem foi um 'quase" na vida
é, na morte, um "quase nada"!
35
Separadas as metades,
a realidade provou
que somos as “inverdades”
que uma esperança inventou...
36
Sobre a mesa, a lamparina.
No bercinho, uma criança.
E a luz suave ilumina
a mensagem de esperança!
37
Tão pertinho do infinito
mas, prisioneira do morro,
a favela é quase um grito,
que pede ao mundo: - Socorro!
38
Vão desfilando os Farrapos
ante o Pacificador;
por fora, as roupas em trapos,
por dentro, inteiro, o valor!

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Wilma Mello Cavalheiro


1
A festa estava prontinha,
mas tudo às vezes malogra;
pra surpresa da noivinha,
o noivo fugiu com a sogra!
2
"A luz purifica o escuro":
revela a casta Tereza;
e quando o "momento" é impuro,
faz tudo de luz acesa.
3
A minha infância distante
se reflete no meu filho,
por isso, no meu semblante,
o entardecer tem mais brilho.
4
A moça chora num brado
e o padre diz, em voz lenta:
- Pra lavar tanto pecado,
só um tanque de água benta!
5
Anoitece... a paz perdura
no aconchego do galpão;
galopa solta a ternura
em volta do chimarrão.
6
Ante a indecisa galinha,
diz o galo, convincente:
- Não troca o velho, joinha,
por um frango incompetente.
7
Brinquedos da minha infância
que foram meu universo,
hoje, rompendo distância,
são saudades do meu verso.
8
- Chega de versos, de prosa,
diz a garota ao noivinho,
pois tem coisa mais gostosa
pra se fazer no escurinho!
9
Chuta, menina, com jeito,
teu jogo é alegre... peralta.
Depois, apara no peito
porque peito não te falta!
10
Depois do vento ferino,
que me arrancou dos teus braços,
o barco do meu destino
navega roto... em pedaços…
11
Do teu palco iluminado,
ris de mim, sem ter ideia,
do quanto eu sofro calado
na penumbra da plateia.
12
Dulcifico meu sorriso,
louca euforia me invade,
quando chegas, sem aviso,
rompendo o nó da saudade.
13
Ela diz em tom brejeiro:
- Cumpro bem o meu papel.
Quero o amor do marinheiro
e o soldo do coronel.
14
Enfrento o vento malvado,
molhado de chuva e frio,
pois para estar ao teu lado
venço qualquer desafio.
15
Entre dúvidas e medos,
que a distância ocasionou,
fechada, dança em meus dedos
a carta que hoje chegou.
16
Esquece esta vida andeja,
vem tomar um chimarrão,
é cedo, a manhã boceja,
na longa esteira do chão!
17
Esqueço lei, preconceito,
e algum tabu superado,
só para ter o direito
de amanhecer ao teu lado.
18
Esqueço os dias tristonhos,
vou à luta, sem tardança;
ao porto azul dos meus sonhos
regressa a nau da esperança.
19
Esta saudade que é tua
dança no meu pensamento,
como a chuva lá na rua
sob a regência do vento.
20
Este sol fraco, inconstante,
trará luzes de outros sóis,
para amanhã, mais radiante,
te acordar nos meus lençóis.
21
Eu acredito e confesso
que a mais cruel das partidas
é a partida sem regresso,
para o rumo de outras vidas.
22
Feito de fugas e medo,
de regressos e partidas,
nosso amor, mesmo em segredo,
dá mais vida às nossas vidas.
23
Foi preciso muito brio,
quase a coragem faltou,
para enfrentar o vazio
que a tua ausência deixou.
24
Há sempre um rastro de luz
protegendo a caminhada
de quem abriga e conduz
a infância desamparada.
25
Hoje, no ocaso da vida,
tem sabor de eternidade
esta ternura incontida
que floriu na mocidade.
26
Meu chimarrão, tu retratas
meu pampa com perfeição:
por dentro, o verde das matas,
por fora, a cor do meu chão.
27
Minha alma se fortalece,
levo melhor minha cruz,
quando através de uma prece
acho o caminho da luz.
28
“Minuano”, teus intentos
comprovam, em forte estampa,
que és o corsário dos ventos
na imensidão do meu pampa.
29
Na bomba, o beijo deixado,
na entrega, o tremor da mão,
e o meu amor, tão guardado
se traiu no chimarrão!
30
Na lareira um fogo brando
e, entre doses de licor,
nossos corpos desenhando
todas as formas de amor.
31
Não há lei irrevogável,
se amparada na razão;
toda sentença é mutável,
se a luz rasga a escuridão.
32
Não precisa o trovador
ir à lua, ver estrelas,
na noite, em rimas de amor,
ele é capaz de entendê-las.
33
Nesta noite rosicler
a lua, tão feminina,
tem o charme da mulher
e a pureza da menina.
34
O barco da minha infância
cruzou mares... velejou...
chorou saudades... distância...
mas nunca mais regressou.
35
O destino arma ciladas
que só coragem e a fé,
conseguirão, se irmanadas,
manter-nos vivos, de pé.
36
Outrora, a paz benfazeja,
noites de amor sob a lua,
hoje, na noite viceja
o crime, solto, na rua.
37
Peço ao sol, em oração,
e à lua, em seu branco véu,
que não falte um chimarrão
na grande estância do céu!
38
Por tantos textos errados,
somos hoje, sem favor,
dois atores fracassados
no grande palco do amor.
39
Quando a paixão se agiganta,
tão feiticeira e felina,
cala-se a voz na garganta
e só o prazer nos domina.
40
Quando em serena cadência,
na dança que o amor requer,
desnudo sem resistência
meus anseios de mulher.
41
Quando minha alma mentiu,
ao jurar que te esqueceu,
o meu orgulho aplaudiu
a grande atriz que fui eu.
42
Quanto tempo posto fora,
numa procura sem jeito,
sem ver as luzes da aurora,
porque era noite em meu peito.
43
- Que fazias no escurinho,
junto àquele rapagão?
- Não penses mal, papaizinho,
fazia meditação!
44
Quero o torpor, a leveza,
que o licor me propicia,
para acalmar a tristeza
da minha vida vazia.
45
Regressa... tudo te espera...
os teus discos, teu licor,
e uma doce primavera
desfeita em beijos de amor.
46
Roda, criança querida,
teu carrinho... teu pião...
Enquanto a roda da vida
não levar tua ilusão…
47
São brinquedos fulgurantes,
que brilham soltos...ao léu...
as estrelas cintilantes
que a lua joga no céu.
48
Se a Lei Divina se encerra
na paz, no amor, no perdão,
por que rolam pela terra
crianças que não têm pão?
49
Se é feitiço ou se é magia,
não sei, nem quero saber,
só sei que virou mania
este amor que é o meu viver.
50
Sem coragem, dividida,
entre a paixão e a razão,
minha alma é folha caída,
num vendaval de emoção.
51
Sem guerrilha... sem debate...
rola o manto da cobiça,
quando a espada do combate
verga-se à Lei da Justiça!
52
Sem temor e sem ressábios
hoje enfrento o mar fremente,
para no cais dos teus lábios
aportar meu beijo ardente.
53
Se queres manter-te em pé,
ter mais luz em tua andança,
acende o incenso da fé
no castiçal da esperança.
54
Se sofro não perco a calma,
a fé meus passos conduz;
a força que guardo na alma
se renova e acende a luz.
55
Se te esqueceste do texto,
se foste péssimo ator,
não busques nenhum pretexto
para os teus erros no amor.
56
Seu chute ninguém olvida,
atleta bom e sarado,
por isso a “gata” o convida
pra jogar no seu gramado…
57
Tem tanta preguiça, tanta,
e modos tão indolentes,
que quando almoça, não janta,
pra não dar trabalho aos dentes.
58
Tentei fugir de mansinho,
devagar romper os laços;
desisti, qualquer caminho
sempre me leva aos teus braços.
59
Teus cílios, negra cortina,
escondem dos olhos meus,
toda a magia divina
que dança nos olhos teus.
60
Tu és, amor, a alegria,
o meu vinho, o meu licor,
ao raiar de um novo dia,
abrindo as portas do amor.
61
Voltei feliz para vê-la.
Frustração. Não me quis mais.
Somente os olhos da estrela
me viram chorar no cais.

José Valdez de Castro Moura (Trovas em Preto & Branco)

  por José Feldman Análise das trovas e relação de suas temáticas com literatos brasileiros e estrangeiros de diversas épocas e suas caracte...