sábado, 11 de fevereiro de 2017

Otávio Venturelli


1
Ante os Tratados da guerra,
tantos protestos se faz;
e as pás, tratando da terra,
tem, mais, tratado da paz!
2
Às vezes, na velha idade,
minha infância sobressai,
e eu peço colo à saudade,
fingindo que é o teu, meu pai!
3
Contraste dos mais tristonhos
a noite sempre me traz:
vou procurar-te em meus sonhos,
e é na saudade que estás...
4
Coreto da mocidade
que ainda tem a mesma graça,
pões o amargo da saudade
no algodão-doce da Praça.
5
Criança carente, andante,
mensagem viva que diz
que seu brinquedo constante
é brincar de que é feliz!...
6
Da saudade às vezes farto,
e se a tristeza me invade,
acendo as luzes do quarto
para não ver a saudade.
7
Deixaste a forma torcida
de um beijo no travesseiro:
mensagem de despedida
com teu sabor e teu cheiro...
8
Dentre as flores cultivadas
nos quintais do coração,
só me restaram plantadas
as flores da solidão...
9
De que vale o meu protesto
se manténs em tuas mãos
o poder de, a um simples gesto,
cortar o "til" dos meus nãos...
10
Em nosso adeus, quando eu disse:
"não há dor que não se abrande",
nem pensava que existisse
uma saudade tão grande...
11
Estou velho... mas não minto
quando digo com empenho:
- se tenho a idade que eu sinto,
nem sinto a idade que eu tenho!
12
É um fantasma!... Alguém gritou.
E houve gritos e alarido
quando, de preto, chegou
o gêmeo do falecido...
13
Eu sinto a doce e querida
perpendicularidade
das retas da minha vida
sobre o plano da saudade!
14
Farol velho, não entendes
o contraste que eu te trago:
tu de esperanças te acendes,
eu, de saudades me apago…
15
Fazendo em barro a montagem
da estátua do meu desgosto,
eu vi que o rosto da imagem
era a imagem do teu rosto...
16
Jangadeiro de Iracema,  
meu pescador de alvoradas,
o teu Nordeste é um poema
escrito pelas jangadas!
17
Maria, cheia de Graça,
dai graça para os meus dias,
porque as noites já têm graça
com a graça das marias...
18
Minha alma vagueia pelas
calçadas da meninice
buscando antigas estrelas
para o meu céu da velhice.
19
Na cama desarrumada,
que impulsos do amor viveu,
há uma saudade deitada
no lugar que era só teu....
20
Não diga adeus nem brincando,
o adeus é irmão da saudade
e alguma ausência, escutando,
pode pensar que é verdade...
21
Não me gabo das conquistas,
nem dos troféus que são meus,
porque nas mãos dos artistas
há sempre o dedo de Deus…
22
"Não me esqueça..." e a Eternidade,
travestida de agonia,
me fez cumprir, na saudade,
o que a mensagem pedia...
23
Na velha Estação de Trem,
que a solidão dominava,
eu acenei a ninguém
fingindo que alguém chegava...
24
No conflito de um desgosto,
por saber que não me queres,
vivo em busca do teu rosto
no rosto de outras mulheres…
25
Nossa casa, nossa vida,
nossa esteira em nosso chão,
e, na esteira da partida
a saudade e a solidão.
26
Numa angústia que não finda,
por mais que tu te reveles,
no teu corpo eu sinto ainda
que há vestígio de outras peles!
27
Num esplêndido tesouro
que no espaço se projeta,
o sol é a moeda de ouro
com que Deus paga o Poeta!
28
O beijo, roubado a medo
no portão do teu sobrado,
teve um tanto de segredo,
teve um tanto de sagrado...
29
O lençol todo florido
e de salto alto... e eu notei,
ao me chamar de "querido",
que era um fantasma de um "gay"!
30
O mistério envolve até
a nós Poetas-Trovadores
porque na vida nós é
que somos os sonhadores!!!
31
Para ficar ao meu lado,
durante a noite ela vem.
A saudade do passado
sofre de insônia também...
32
Paredes em desabrigo,
janelas que se quebraram...
mensagem de um tempo antigo
que o tempo e a vida rasgaram!
33
Por entre os vãos dos meus dedos
fugiram meus sonhos vãos,
que foram simples brinquedos
nos dedos das tuas mãos…
34
Por qualquer doença se abala
com o fantasma dos infartos;
passa os seus dias na sala
gemendo de dor nos quartos...
35
Prefira sempre a certeza
de ver que a alegria existe;
quem faz pergunta à tristeza
merece resposta triste.
36
Presente numa saudade
que ficou em seu lugar,
o passado é uma verdade
que nem Deus pode mudar...
37
Quando à noite eu penso nela,
e o sono teima em fugir,
ninando a saudade dela
eu quase chego a dormir...
38
São flores - Rosa e Saudade
com mensagens desiguais;
uma diz: "felicidade!"
e a outra diz: "nunca mais".
39
Saudade, imagem sem vida
da presença que eu reclamo;
essa vontade incontida
de voltar dizendo: "Eu te amo!"
40
Saudade, saudade minha,
quanta saudade restou...
- Saudade é tudo que eu tinha,
saudade é tudo que eu sou.
41
Se a renúncia, em seus degredos,
meus sonhos cobre de pó,
dou-me as mãos... enlaço os dedos,
e finjo não estar só...
42
Se foi presságio, não sei;
mas eu senti, na partida,
que aquele adeus que eu te dei
dava adeus à nossa vida…
43
Sempre existe algum pecado
escondido em nosso enredo,
que a mente finge acabado
mas que a alma guarda em segredo.
44
Se o coração ainda sente
o amor perdido de outrora,
o sonho, na alma da gente,
se abraça a esse amor… e chora!
45
Soltando as cordas da amarra
da barca do meu destino,
cruzei o farol da barra
dos meus sonhos de menino…
46
Sonho um mundo diferente
que as cores todas resuma,
e a cor da pele da gente
não tenha importância alguma.
47
Tuas lembranças, afago-as
como se afaga uma flor;
as saudades não são mágoas,
são flores feitas de amor!
48
Vemos hoje, os dois sozinhos,
na saudade que nos toma,
que, ao somar nossos carinhos
nós dois erramos na soma.
49
Voltei. Meu Deus, que distância
entre a saudade e o passado:
o meu coreto da infância
ainda "me toca dobrado"!

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