sábado, 29 de junho de 2019

Colombina (1882 - 1963)


A palavra que revela
anseio, prazer e dor,
que toda a vida constela,
é sempre a palavra - Amor. 

Adeus - sinal de partida
do trem, do barco, do avião;
sempre carrascos da vida
dos que ficam, dos que vão...

Amar... quem dera eu pudesse
esse verbo definir: 
- É gozo de quem padece,
é uma lágrima a sorrir...

Amar, sendo espinho, é rosa,
é luz, sendo escuridão:
é uma amargura gostosa,
- voluntária escravidão.

Amor de mulher no todo
é um anjo posto de rastros;
desce mais baixo que o lodo
ou sobe acima dos astros.

Amor no amor se resume,
sem pensamento mesquinho,
ódio nasce do ciúme,
como o vinagre do vinho.

A vida pode ser linda
um dia... uma hora, talvez,
mas toda a lindeza finda,
fica sendo: era uma vez…

Da frase que não disseste,
- que tanto tempo esperei -
do beijo que não me deste
eu jamais me esquecerei.

Das rimas revolvo a messe,
do ritmo busco o veludo...
No entanto, se eu te dissesse:
- eu te amo - diria tudo.

É na cartilha da vida 
que a gente aprende de cor
(e depois de tanta lida)
que...não saber é melhor...

"Eu te amo" - frase pequena
que num segundo se diz;
um paraíso ela acena,
faz, quem a escuta, feliz!

Felicidade seria,
para mim (juro por Deus!),
dizer-te sempre "Bom-dia",
e nunca dizer-te "Adeus".

Meu bem comigo zangou-se.
Que motivo eu lhe daria?
Não sei, não. Mas, talvez fosse
por amá-lo em demasia…

Meu bem escuta, em surdina,
a floresta a sussurrar:
- geme ao vento a casuarina,
escutando a voz do luar.

Meu bem, escuta a cigarra
cantando em pleno verão:
às vezes, é uma fanfarra,
muita vez - um cantochão.

Meu bem, escuta a tristeza
do trem, na curva a apitar...
Vai levando, com certeza,
um coração a chorar.

Meu bem, escuta as cantigas
das ondas crespas do mar:
as suas mágoas antigas,
querem, cantando, olvidar...

Mulher perdida na estrada,
que o mundo tange ao relento,
é pérola encarcerada
na concha do sofrimento.

Não adianta nada agora,
eu já não perco a cabeça.
Mas, é bom ires embora,
antes que tal aconteça…

Não te assuste a falsidade,
nem a palavra mentida:
Não estranhes a maldade,
porque são coisas da vida...

Não te odeio nem maldigo.
Por que motivo? Eu bem sei:
se sofrer foi meu castigo,
amar-te foi minha lei!

Quantos anos tem Maria?
- Não perguntes, pois é em vão.
Ela só responderia:
- Que falta de educação!

Quem me dera ter vinte anos,
não ter na alma cicatrizes!
Poder sonhar, fazer planos,
e acreditar no que dizes...

São sete letras, somente,
numa palavra a dizer
a mágoa que toda gente
terá que, um dia, sofrer...

Saudade - é sombra que fica
e tudo a cinzas reduz:
palavra que crucifica
dois entes na mesma cruz.

Saudade, febre que a gente
sem querer pode apanhar.
nunca mata de repente,
vai matando devagar...

Saudade, lâmpada acesa
no altar da recordação,
onde a ternura e a tristeza
rezam a mesma oração!

Se acaso eu fosse rainha,
dava a você meu reinado;
e, se fosse uma andorinha,
- o meu ninho no telhado.

Se é muito o que nós sofremos,
por mais que a vida nos fira,
o que do berço trouxemos,
somente a campa nos tira.

Se é triste sentir saudade,
muita saudade de alguém,
maior infelicidade
é não tê-la de ninguém.

Sentença justa que brilha
entre os avisos da estrada:
qualquer perdão, quando humilha,
é vingança disfarçada.

Trovas... A muitos parece
que são fáceis de compor:
talvez sejam, mas carece
ter alma de trovador.

Trovas... Traços apagados
de uma vida já no fim...
Quando eu me for, namorados,
lembrem-se um pouco de mim!

Um barco à margem de um rio,
abandonado, sem remos...
lembrando todo o vazio
de um sonho que não vivemos…

Ventura - assim eu a traço
com a pena do coração:
o meu braço no teu braço
e na tua a minha mão.

Fonte:
Amaryllis Schloenbach

Nenhum comentário:

Postar um comentário

José Valdez de Castro Moura (Trovas em Preto & Branco)

  por José Feldman Análise das trovas e relação de suas temáticas com literatos brasileiros e estrangeiros de diversas épocas e suas caracte...