terça-feira, 25 de junho de 2019

Marlê Beatriz Jardim Araújo (Viamão/RS)


Acredito que a existência
seja um circo onde ninguém
escapa da experiência
de ser vaiado também...

“Águas de março” fizeram
um temporal de verão,
com mágoas que não couberam
na paz do meu coração.

A imaginação flutua,
dando à vida mais sabor:
– Que a Lua é muito mais lua,
nos versos de um trovador!...

Alegria, se eu te sinto,
não obstante os sermões,
é que em todo o labirinto
Deus me aponta as direções.

Alvorada, se eu pudesse,
faria, em trovas, um hino
pedindo, a Deus, que fizesse
de alvoradas, meu destino!

Ao desviar da espinheira
que, de espinhos transbordava,
caiu na isca certeira
do ouriço que o espreitava!

Ao pensar num bom presente
que leve alegrias novas,
sempre, o que me vem à mente,
é um belo livro de trovas!

Aquela rima que enfeita
e harmoniza os versos meus,
somente, se faz perfeita
quando é soprada por Deus.

Arroubos de juventude,
sonhos, projetos sem fim,
vem da Usina da inquietude
que trago dentro de mim!...

As estrelas se parecem
com vaga-lumes no céu,
ou serão eles que esquecem
que são estrelas ao léu?

As mágoas, os dissabores,
vê se esquece, segue em frente,
e planta, por onde fores,
do amor e paz, a semente.

As poças d’água da rua
brincam de espelho quebrado,
há em cada poça uma lua
e um belo céu estrelado.

Às vezes, por um momento,
sem que eu saiba definir,
me entristece, esse lamento,
que o vento me faz ouvir.

Bateu-me à porta, eu abri,
não sem antes ver quem era...
E, em pleno inverno, caí
nos braços da primavera.

Bendigo essa luz que, um dia,
em minha estrada brilhou,
e resgatou a alegria,
que o tempo quase apagou.

Cai a neve, mansamente,
e, enquanto não se desfaz,
faz-se altar na alma da gente
com flocos brancos de paz.

Com a água não se deu bem,
o clone de peixe-boi:
- Sem saber quem é de quem,
atrás da vaca ele foi!

Das angústias me desfaço,
ante a fé que se renova,
nestas viagens que faço
no belo mundo da trova!

Destino menino arteiro,
enquanto o mundo rodava,
te tornavas timoneiro
de tudo o quanto eu sonhava.

Desviava a todo instante,
da sogra o genro arredio...
E a coroa “itinerante”
o apelidou de "Desvio"!!!

Diferente e brincalhona,
é a chaminé que inventei:
não polui, pois não funciona,
para o que serve... não sei!...

É na ciranda das horas,
que passam todas as juras.
Passam, também, as demoras
e, até mesmo, as amarguras!

Era tão magro o Domingos
que, enquanto a chuva rolava,
ele passava entre os pingos
e nem sequer se molhava!...

És muito mais que um marido,
és um pai, amigo, irmão.
És, para sempre, querido,
dono do meu coração!

Essa agridoce saudade
que faz da gente refém,
maltratada, é a verdade,
mas nos conforta também.

Faço de conta que a vida
vive a sorrir para mim
e ela, então, descontraída,
me abraça a sorrir enfim.

Fez pose no trampolim
mas, distraído, o Janjão,
só dentro d'água é, que, enfim,
viu que estava sem calção!

Há na beleza selvagem,
que a cascata canta em festa,
emocionante mensagem
de quem criou a floresta!

Lembro a cidade natal
e, eis que meu lado criança
se aninha, inteiro, afinal,
na ternura da lembrança!...

Lembro a família reunida
na infância, já bem distante!
E uma saudade atrevida,
abraça-me nesse instante.

Magia é ver, finalmente,
o tempo a concretizar
aquele sonho, que a gente
passou a vida a sonhar.

Meio tristonho e sozinho,
às vezes me sinto assim...
Quando as pedras do caminho
parecem zombar de mim!...

Mundo mágico onde eu vivo!
Teus versos tão desiguais,
são flores, as quais cultivo,
nas trovas, cada vez mais!

Na estrada que coube a mim,
os entraves não são raros:
mas estradas... são assim...
Cabem a nós, os reparos.

Na primavera, até a chuva
é um festival de harmonia,
caindo feito uma luva
na mão radiosa do dia!

Neste dilúvio de sonhos,
neste mar, de quando em vez,
percebo acenos tristonhos
de um sonho, que se desfez.

Ora é médico, ora é louco...
Filósofo, quando a sós...
No ator, há bem mais que o pouco
que existe em cada um de nós!

O tempo passa veloz,
contudo deixa lembrança;
posso até ouvir a voz
do meu tempo de criança.

O tempo, viajor mutante,
nada o prende, nada o solta;
traz saudade e, num instante,
tem-se a ilusão que ele volta.

Paira ternura infinita
na forma de um Beija-flor.
E a flor se faz mais bonita
num intercâmbio de amor.

Para encontrar um desvio,
oscilou, tanto, o bebum
que, depois de um rodopio,
não quis mais desvio algum!

Peço ao vento cirandeiro,
das madrugadas de outono,
que seja o meu seresteiro,
mas que não me roube o sono!

Quando a distância incomoda
parece, que por maldade,
insiste, em brincar de roda,
com a lembrança, com a saudade!

Quando a dúvida persiste,
eu busco a Fé, simplesmente,
e espanto esse canto triste
dos labirintos da mente!

Quando a neblina persiste
e embaça toda a janela,
ao invés de ficar triste,
eu faço trovas a ela.

Quando a sonhar eu me ponho,
sem pressa de despertar,
a paz, que envolve meu sonho,
faz com que eu volte a sonhar!

Quando o grilo atrapalhado
num desvio se embrenhou,
mostrou-se tão desviado
que o cri-cri desafinou!...

Quando pular a fogueira,
não use de indecisão,
que fogo passa a rasteira
e queima até a distração!...

Resgatei, daqui e dali,
lembranças tantas e tais,
que em meu coração, senti
bater saudades demais.

São palhacinhos bisonhos,
num carrossel de ironia,
os retalhos dos meus sonhos,
que guardei dia após dia.

Seduz-me a luz do luar
que, a versejar, me conduz
e até me leva a pensar
que é feiticeira essa luz!...

Sugiro ao tempo, que passa,
que não corra tanto assim!
E o tempo, só por pirraça,
passa voando por mim!

Tanto arrepio sentia
um fantasma diferente,
que, assombrar, não mais queria,
por medo de virar gente!

Toda a florzinha do campo,
despretensiosa, singela,
tem, por perto, um pirilampo,
tem alguém que goste dela.

Todos os anjos que cantam,
no coral do entardecer,
são trovadores que plantam
sementes no alvorecer!

Um arrepio gelado,
diferente dos demais,
deixa, até mal-assombrado
quem não arrepia mais!...

Um trovador é capaz
de harmonizar universos,
pelas propostas de paz
encontradas em seus versos.

Vejo através da vidraça,
na noite morna de outono,
o vento varrendo a praça,
levando junto o meu sono.

Venho de um tempo em que a vida
era tão descomplicada,
que a Lua, mesmo escondida,
brincava com a criançada!

Vestiu de branco a cascata,
fez a mala, a fauna, as flores,
e uma janela de prata,
nos céus, para os trovadores.

Vez em quando, a fantasia,
nessa praia, veraneia
e acende a luz da poesia
em meus castelos de areia!

Vi passar a mocidade
de braços dados ao vento:
Deixou rastros, que a saudade
me traz a cada momento.

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