1
A força de uma nação
começa com a caneta...
Um a mais na educação:
um a menos na sarjeta!
2
Ao deitar na rede, o Guido
morreu de uma forma tétrica,
porque, de tão distraído,
deitara na rede elétrica!
3
Conquistar novos espaços...
eis a semente da guerra.
Tantas vidas em pedaços
por um pedaço de terra!
4
É na busca pela paz
e o conhecimento novo
que tantas vezes se faz
a identidade de um povo!
5
Eu que fui grão escolhido
nos trigais da mocidade,
hoje sou pão ressequido
nas migalhas da saudade…
6
Fraternidade é sentir
uma comunhão tão alta
que nos leva a dividir
até mesmo o que nos falta…
7
Insensatez... Causa? Efeito?
Sentimento ou atitude?
Para quem pensa, é defeito;
para quem sonha, é virtude!
8
Meu verso reflete a dor
de um coração solitário,
que escreve cartas de amor,
sem qualquer destinatário…
9
Na inspiração oportuna
pode o poeta buscar,
mais do que criar fortuna,
a fortuna de criar.
10
O futuro, eu mesmo faço
nas sementes que eu espalho,
transformando meu cansaço
nos frutos do meu trabalho.
11
Para o furacão filmar,
a TV saiu-se bem:
a matéria foi ao ar
e o repórter foi também!
12
Quem dera a justiça cega
pudesse ver, tão somente,
a falsa prova que entrega
e condena um inocente!
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AS TROVAS DE RENATA EM PRETO E BRANCO
por José Feldman
AS TROVAS UMA A UMA
1. A força de uma nação
A primeira trova destaca a educação como um pilar fundamental para o desenvolvimento social. A metáfora da "caneta" sugere que as decisões escritas, como políticas educacionais, moldam o futuro. A frase "um a menos na sarjeta" ressalta a importância de evitar a marginalização social, indicando que a educação pode tirar indivíduos da pobreza.
2. Ao deitar na rede, o Guido
Aqui, a ironia é evidente. O Guido se distrai e acaba morrendo de forma trágica por um acidente com a rede elétrica. Essa imagem provoca uma reflexão sobre a distração na vida cotidiana e a fragilidade da existência, mostrando como um momento de desatenção pode ter consequências fatais.
3. Conquistar novos espaços
Esta trova aborda a relação entre a luta por território e a guerra. A frase "tantas vidas em pedaços" evoca a devastação causada por conflitos motivados por posse de terra. A mensagem sugere que a ambição territorial é muitas vezes fútil, levando a um custo humano elevado.
4. É na busca pela paz
A busca pelo conhecimento e pela paz é apresentada como uma característica definidora de um povo. A trova sugere que a identidade cultural se forma através da educação e da paz, enfatizando a importância de valores coletivos na construção de uma nação.
5. Eu que fui grão escolhido
Esta reflexão aborda a transição da juventude para a velhice, simbolizada pela mudança de "grão escolhido" para "pão ressequido". O contraste entre a vitalidade passada e a saudade presente revela a melancolia da passagem do tempo e a perda de oportunidades.
6. Fraternidade é sentir
A fraternidade é apresentada como uma comunhão profunda que transcende a escassez. A ideia de compartilhar até mesmo o que se carece ressalta a essência da empatia humana e a importância de cuidar uns dos outros em tempos difíceis.
7. Insensatez... Causa? Efeito?
Essa trova explora a dualidade entre razão e sonho. A insensatez é vista de maneiras opostas: como um defeito para os racionais e como uma virtude para os sonhadores. Isso provoca uma reflexão sobre a natureza do pensamento e da ação humana.
8. Meu verso reflete a dor
Aqui, a solidão é capturada através da metáfora de cartas de amor sem destinatário. Isso simboliza a busca por conexão e a dor da ausência, refletindo a luta interna de quem anseia por amor e compreensão.
9. Na inspiração oportuna
A trova destaca o valor da criatividade e da inspiração. O poeta não busca apenas riqueza material, mas a "fortuna de criar", enfatizando que a verdadeira riqueza reside na capacidade de expressar sentimentos e ideias por meio da arte.
10. O futuro, eu mesmo faço
Esta reflexão aborda a responsabilidade individual na construção do futuro. As "sementes" representam ações e esforços que, com o tempo, se transformam em frutos. Essa mensagem é um chamado à proatividade e à determinação.
11. Para o furacão filmar
A crítica à mídia é evidente nesta trova. A superficialidade com que a mídia pode tratar tragédias é ressaltada, mostrando como a busca por audiência pode desumanizar eventos sérios e transformar a dor em espetáculo.
12. Quem dera a justiça cega
A última trova lamenta a cegueira da justiça, que falha em reconhecer a verdade e pode condenar inocentes. Essa reflexão provoca um questionamento profundo sobre a ética e a eficácia dos sistemas judiciais, ressaltando a necessidade de um olhar mais atento e justo.
TEMAS ABORDADOS PELAS TROVAS DE RENATA E SUA SIMILARIDADE COM POETAS DE DIVERSAS ÉPOCAS
1. Educação e Progresso
A primeira trova destaca a educação como um alicerce da sociedade. Essa ideia ecoa a obra de Paulo Freire, que defendia a educação como um meio de emancipação. Comparando com Mário Quintana, que também valorizava a simplicidade e a importância do conhecimento, podemos ver como a educação é um tema atemporal na poesia. A ênfase na educação como motor de transformação social destaca a consciência crítica que muitos poetas contemporâneos, como Márcia Leite, também abordam. Ambos reconhecem que a educação é uma ferramenta vital para a emancipação e a construção de identidades coletivas, refletindo um desejo comum de um futuro mais justo.
2. Justiça e Injustiça
Paccola critica a cegueira da justiça, uma preocupação que remete a poetas como Camões, que explorou questões de moralidade e justiça em suas obras. Em tempos contemporâneos, Adélia Prado também aborda a injustiça social, refletindo a dor e a luta da vida cotidiana, criando um diálogo entre a tradição e a modernidade. Suas trovas se alinham a Eucanaã Ferraz, que exploram a complexidade das questões sociais e legais. A injustiça, tanto histórica quanto atual, é um tema que atravessa gerações, e a luta pela verdade e pela equidade permanece central na poesia contemporânea.
3. Paz e Conflito
A luta por território e a dor da guerra são temas universais. Cecília Meireles e sua busca pela paz na poesia dialogam com Paccola, enquanto Vinicius de Moraes reflete sobre as consequências emocionais da guerra e do conflito, enfatizando a fragilidade da paz.
4. Solidão e Saudade
A solidão é um tema profundo na obra de Carlos Drummond de Andrade, que frequentemente explorava a condição humana. Paccola, ao falar da saudade, dialoga com Alphonsus de Guimaraens, cuja poesia é permeada por um sentimento de nostalgia e perda, mostrando como a solidão e a saudade são experiências universais. As trovas dela se identificam com a obra de Ana Cristina César, que também explora a subjetividade e a busca por conexão em um mundo muitas vezes isolante.
5. Fraternidade e Empatia
A ideia de compartilhar o que se tem, mesmo na escassez, ressoa com a obra de Guilherme de Almeida, que frequentemente abordava a solidariedade humana. Em tempos mais recentes, poetas como Carolina Maria de Jesus também enfatizavam a importância da empatia em uma sociedade desigual. A noção de compartilhar mesmo nas dificuldades é um eco das vozes contemporâneas de poetas como Bruno Ramos, que falam sobre a vulnerabilidade e a solidariedade humanas. A empatia, como um valor essencial, é um tema que ganha nova vida nas discussões sobre justiça social e direitos humanos, mostrando que a poesia é um campo fértil para a promoção de valores éticos.
6. Inspiração e Criatividade
A busca pela inspiração na criação poética é um tema comum. Fernando Pessoa, com sua multiplicidade de vozes, se assemelha com Paccola ao explorar a complexidade do ser criador. Adélia Prado também fala da criação como uma forma de transcendência, reforçando a importância da arte. Chico Buarque, não apenas compõe, mas também reflete sobre o ato de criar como um ato de resistência e uma forma de reivindicação social. A arte, para ambos, é um espaço de liberdade e expressão.
7. Identidade Cultural
A construção da identidade de um povo por meio da educação e da paz é um tema que remete a Guilherme de Almeida e sua valorização das raízes culturais. Augusto dos Anjos, com sua crítica social, também explora a formação da identidade através da luta e da dor.
8. Ação e Futuro
A ideia de que cada um é responsável por seu futuro se conecta com a obra de Cora Coralina, que falava sobre o poder do trabalho e da determinação. Essa mensagem é reforçada na contemporaneidade por poetas como Rafael Alencar, que também enfatiza a importância da ação individual na construção de um futuro melhor.
9. Mídia e Realidade
A crítica à superficialidade da mídia na cobertura de tragédias lembra a obra de Bertolt Brecht, que discutia a manipulação da informação. Poetas contemporâneos, como Marcio-André, também abordam a relação entre a mídia e a realidade, mostrando como essa discussão é cada vez mais pertinente.
10. Dualidade da Insensatez
A insensatez como virtude ou defeito é uma dicotomia que pode ser vista na obra de Machado de Assis, que frequentemente explorava a ambiguidade da natureza humana. Poetas contemporâneos, como Ruth Rocha, também tocam nessa complexidade, refletindo sobre a dualidade do ser.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A obra de Renata Paccola não só se destaca por sua musicalidade e profundidade, mas também estabelece um diálogo rico e significativo com poetas de diferentes épocas. Seus temas universais e atemporais ressoam em vozes que vão desde a poesia clássica até a contemporânea, refletindo preocupações humanas comuns e a luta por um mundo melhor. Essa intertextualidade enriquece a análise da poesia, mostrando que a busca por compreensão, justiça e expressão artística é uma constante na literatura.
Os temas abordados por Renata Paccola se conectam a um panorama mais amplo da poesia contemporânea. A intersecção entre suas trovas e a obra de poetas atuais revela uma continuidade na busca por compreensão e transformação social.
Assim, a obra de Paccola não só se afirma como um testemunho da experiência humana, mas também como um convite à reflexão e à ação em um mundo que continua a desafiar nossos valores e crenças.
Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. IA Open. vol.1. Maringá/PR: Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.
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