1
Agora, não sei por quê,
meu relógio faz maldades.
Numa hora sem você,
marca sessenta saudades!
2
Águas do lago... tão calmas...
Olhando-as, fico a cismar :
– Por quê, Senhor, há nas almas
essa inquietude do mar ?
3
A nossa alma se reparte
pelos filhos que nos vêm;
temos sempre nossa parte
nos destinos que eles têm.
4
As dores e os desencantos
têm dois destinos diversos:
- ou se dissolvem nos prantos,
- ou se desfazem nos versos.
5
Bem pouca gente procura
aceitar esta verdade:
- antes ser bom sem ventura,
que ser feliz sem bondade.
6
Canta, canta as tuas mágoas,
que a trova nos traz conforto;
quando morre um sonho, a trova
guarda a alma do sonho morto.
7
Céu de azul inexistente,
linda mentira sem par!
Quando o próprio céu nos mente,
em quem posso acreditar?
8
Com que cara fica a gente,
junto à mulher que se adora,
se perguntam, de repente:
- "Como vai sua senhora?”
9
Como dói a gente ver
sem conseguir consolar,
- uma criança a sofrer,
Um velhinha a chorar...
10
Coração, bate baixinho,
pois, a ouvir-te, ó desventura,
conto os passos do caminho
que conduz à sepultura...
11
Creio em alma feminina,
– quem assim pensa, não peca -
quando vejo uma menina
a ninar uma boneca.
12
Das horas sempre ditosas,
muitas o tédio nos furta...
A glória maior das rosas
é terem vida tão curta.
13
Desta feliz ignorância
decorre grande ventura:
- não sabermos que distância
vai do berço à sepultura.
14
Deus, que uniu as nossas almas,
mais bondoso foi depois,
quando, para unir-nos mais,
pôs um filho entre nós dois.
15
Deus te dê vida tão calma,
graças tais que, ao recebê-las,
sintas no céu de tua alma
todo um punhado de estrelas!
16
Dizes que gostas de mim,
se gostas, nunca senti;
teu gosto é outro, isto sim,
gostas que eu goste de ti.
17
Em dons de amor, apesar
de ser pobre como Jó,
prefiro não te beijar
a beijar-te uma vez só!
18
Entre o mar e alma da gente
há relações inegáveis:
- a inquietude permanente
e os mistérios insondáveis.
19
É o amor um milionário,
gaste os beijos que gastar,
tanto mais, o perdulário,
terá sempre para dar !
20
Eu te explico o acontecido:
- se roubei teu beijo, amada,
foi por ter-me parecido
que querias ser roubada...
21
Feliz daquele que alcança
o lenitivo que quer,
- num sorriso de criança
- num carinho de mulher.
22
Graças, pai, meu grande amigo,
pelo bem que me fizeste!
Minha mãe, eu te bendigo
pelo pai que tu me deste!
23
Guardo esta amarga impressão:
depois de tanto viver,
só hoje sinto a extensão
do que deixei de fazer...
24
Há belas trovas... mas creio,
nenhuma pode igualar
às lindas trovas que leio
no fundo do teu olhar !
25
Há no mundo muita gente
que só maldades proclama;
é que os sapos, certamente,
só são felizes na lama.
26
Há saudades que nos falam
de maneiras desiguais:
umas dizem: "pode ser" ..
muitas outras: "nunca mais"
27
Mãe feliz! É tão novinho,
e teu seio já reclama!
Dois corações tens agora:
um que pulsa, outro que mama!
28
Mãe não precisa de rima.
Nome de tal esplendor,
diz tudo, para que exprima,
sozinho, um poema de amor!
29
Mãe... Olhando o teu retrato,
meus olhos fitos nos teus,
penso que estás a meu lado
por uma graça de Deus !
30
Mais do que o próprio desdém,
nada mais deixa tão sós,
como saber que ninguém
sente saudade de nós...
31
Maria dos meus amores,
Maria dos meus pesares,
ai de mim quando te fores,
ai de mim se tu ficares...
32
Meus anseios ... tristes frades,
numa angústia indefinida,
vivem presos entre as grades
das clausuras desta vida ..
33
Minha mágoa, quando é grande,
faz da trova confidente
– Uma angústia que se expande
não sufoca a alma da gente.
34
Mistérios de enternecer
a lei da vida contém:
- quanta vez nosso prazer
não custou a dor de alguém?
35
Muita gente é infeliz
mas será por culpa alheia?
Cada qual, como se diz,
colhe aquilo que semeia.
36
Não sei que mágoa mais funda
destas tristezas decorre:
- se da saudade que vive,
– se da esperança que morre.
37
Na tua face entrevejo
transformação milagrosa:
- da semente do meu beijo,
nasce o rubor de uma rosa!
38
Nem sempre meu mal existe.
Querida, não te desoles,
às vezes finjo de triste
só para me consoles.
39
No início da vida, o mundo
parece um reino encantado!
Não há erro mais profundo,
nem logro mais bem pregado.
40
Olhando a vida vivida,
esta pergunta passou:
- fui eu que fiz minha vida,
ou fez-me a vida o que sou?
41
O mundo é um só, quem duvida?
Mas para as almas, no fundo,
há tantos mundos na vida,
quantas vidas há no mundo.
42
O prazer que a gente goza
guarda, em si, melancolia,
pois a hora que é ditosa,
há de ser saudade um dia.
43
Para evitar, precavida,
qualquer infidelidade
quando ela vai de partida,
deixa comigo a saudade.
44
Peço-lhe um beijo, matreiro,
sei que o pedido não pega;
mas conheço o meu isqueiro,
no princípio, sempre nega...
45
Quando a aurora se incendeia,
toda a passarada, em festa,
ergue um hino à Natureza
na Catedral da floresta !
46
Quando a injustiça te doer,
ou quando alguém te magoar,
esquece, pois esquecer
é bem mais do que perdoar.
47
Quando parte um velho amigo
rumo às paragens sem fim,
sinto que um pouco da vida
morreu, também, dentro em mim
48
Quanto és bela, que grandeza,
cidade vista do alto !
Quanta dor, quanta baixeza,
ao nível do teu asfalto...
49
Quão larga seria a messe
de surpresas, de tormentos,
se o simples olhar pudesse
devassar os pensamentos ..
50
Quem casa não se governa,
tenho, até, vergonha às vezes,
pois quem manda em minha casa
é um pirralho de três meses!
51
Saudade e rio corrente
ligam dois pontos distantes:
- o rio leva à nascente,
a saudade, ao que era dantes...
52
Se uma fada perguntasse
qual a ventura que almejo,
eu diria : - que consiste
em não ter nenhum desejo.
53
Solidão que não tem par,
ausência cruel, atroz,
é viverem dois num lar
como se estivessem sós.
54
Talvez não fosse tolice
pensar num mundo sem mal,
se toda gente sentisse
o que diz pelo Natal...
55
Tens um sinal junto à boca,
fonte de todo o meu mal:
ao beijá-la, fui punido
por "avançar o sinal"...
56
Tesouro que, dividido,
vai crescendo, vai subindo,
- é amor de Mãe, repartido
pelos filhos que vem vindo !
57
Teu amor é tão sincero,
que adivinhas o que almejo
pois nunca te disse "eu quero"
para ter o que desejo.
58
Teu sorriso é uma alvorada
que acende na tua face
o rubor que a madrugada
põe no céu, quando o sol nasce!
59
Vejo na noiva ditosa,
aos pés do altar, a sorrir
uma esperança radiosa
interrogando o porvir...
60
Velhice não é tristeza
quando somos venerados
- o que nos dói é a certeza
de só sermos tolerados.
61
Velhos, distantes, embora,
não nos sentimos tão sós,
quando os amigos de outrora
inda se lembram de nós.
62
Vida... Perene esperança
de quê, não se sabe bem...
Feliz de quem não se cansa
de esperar o que não vem.
63
Viver muito, na verdade,
é irmos ficando sós,
dentro da imensa saudade
dos que vão antes de nós...
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