1
Bilhetes de amor... saudade
que a lembrança hoje cultua
onde a tal felicidade
era o carteiro da rua!...
2
Cansado, frágil, tristonho,
quando a fé lhe pede um preço,
o escritor faz de um bom sonho
outro livro, outro começo…
3
Com máscara da ilusão
minha altivez nem percebe
quando a porta da emoção
ergue a tranca e te recebe.
4
De minissaia, a coroa
tenta a sorte... lá na praça.
De longe alguém diz: - É boa...
Mas de perto... assusta a caça.
5
Depois de tantos verões,
talento pouco me importa.
No jardim das ilusões
já sou como folha morta.
6
Deriva meu corpo, enquanto
contra os reveses reluto.
Hoje o tempo usa meu pranto
para cobrar seu tributo.
7
Desato o nó da lembrança
e um facho de luz sem fim
me traz de volta a criança
que o tempo levou de mim!
8
Diz o velho, em maus trejeitos:
- Como o carnaval é ingrato:
com produtos tão perfeitos,
a distância nega o prato!
9
Entre cristais, vinhos nobres,
com saudade, hoje lamento
do campo as canecas pobres
mas tão ricas de alimento!
10
Ergo o cristal, já vencida,
mas a razão me renega,
quando a emoção, iludida,
bebe o vinho e a ti me entrega!
11
Escrevo, reluto... E assim
da tristeza eu vou fugindo.
O escritor que habita em mim
me ensina a sofrer sorrindo.
12
Este espinho que me atira
aos braços da dor sem fim,
é o fruto desta mentira
que você plantou em mim.
13
Faço versos da incerteza,
com talento a dor suplanto.
É bem mais leve a tristeza
dissimulada em meu canto.
14
Lembrança da mocidade,
de um som de lira em seresta...
Ah! como fere a saudade
quando lembrança é o que resta…
15
Levada por fantasia
de um desejo inconsciente,
eu beijo na cama fria
as formas de um corpo ausente!
16
Mesmo ante o furor medonho
de um mar que raivoso freme,
solto a jangada de um sonho
e o sonho conduz meu leme!
17
- Meu filho, veja onde está
o seu querido paizão!...
- Ah! Mamãe, não sejas má,
da outra vez levei "sabão"!
18
Meu salário é duvidoso
qual moça de minissaia.
De longe, acena maldoso,
mas, na mão, foge da raia!
19
Minha jangada à distância,
(velha tábua na enxurrada)
remada por mãos da infância
foi bem mais do que jangada!
20
Na fonte antiga da praça,
que em lembranças recomponho,
a minha ilusão te abraça,
movida por este sonho!…
21
No céu a espalhar magia
com frases mudas, a lua
nas pautas da noite fria
faz versos à minha rua…
22
Nos limites da demência
entre o delírio e a razão
eu beijo um rosto que a ausência
desenha na solidão!
23
Nosso amor meio sem jeito
mas, talentoso e insistente,
vai vencendo o preconceito
que a idade lança entre a gente.
24
No vazio do meu peito,
meu destino de escritor
vai preenchendo, a seu jeito,
velhas lacunas de amor…
25
Perfumada e porte nobre,
na incerteza que a consome,
testou com sabão de pobre
e da rival soube o nome.
26
Pondero... Mas, atrevida,
minha ilusão enche a taça
desta fonte proibida
que à razão condena e embaça!
27
Quando a lua me abre as frestas
das lembranças que são tuas,
de uma lira ouço as serestas
feitas à luz de outras luas!...
28
Quando esta lua indiscreta
me traz lembranças sem fim,
eu choro o velho poeta
que morreu dentro de mim.
29
Relembrando os sons dispersos
das liras da mocidade,
meu sonho acompanha os versos
nas cordas desta saudade!...
30
Ribeirão, cidade nobre,
mas de alma humilde e serena,
és mãe do rico e do pobre,
da pele clara e morena!
31
Ribeirão é terra quente
de clima e de coração.
Qualquer raça, aqui se sente
bem mais gente, mais irmão!
32
Rondando marco após marco,
a minha sorte à deriva,
a ventura é sempre o barco
que do meu porto se esquiva.
33
Sem dinheiro, a pobre Aninha
se refaz em volta e meia:
depois de rodar bolsinha,
tem sempre a panela cheia!
34
Sem lamentar, eu suponho,
ao ver um sonho à deriva:
- mais importante que um sonho
é eu sentir que estou viva!
35
Se o verão tudo arrefece,
talento é inovar quimera;
onde um novo sonho cresce,
sempre existe primavera.
36
Sobras desta trajetória,
os espinhos do desgosto
vão escrevendo outra história
sobre as linhas do meu rosto!
37
Talentoso no passado
mas depois um tanto frio...
e desse amor mal cuidado
restou-me um lar tão vazio!
38
Tiro a máscara... - ouço aflita
de um mar de farsas sem fim
um outro Eu que ainda grita
por vida, dentro de mim!
39
Usou truques à vontade,
tentando a sorte a coroa...
Mas alguém diz: - "Nessa idade,
só gasta cartucho à toa!”
40
Vencendo marco após marco,
alcancei um mar deserto
onde à deriva, meu barco
já não tem mais rumo certo.
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