sábado, 8 de abril de 2017

Maria da Conceição A. P. Abritta (1941 - 2015)


1
Aarão Reis te fez surgir,
teus filhos te deram glória,
Belo Horizonte, és porvir
dos cem anos de uma história.
2
A brisa passou cantando,
e trouxe, com seus enleios,
teu rosto, em sonho, singrando
as águas dos meus anseios.
3
A cara de Sá Constança
é de osso e pele somente,
mas tem ela uma poupança
tão gorda que assusta a gente.
4
A cortina solta ao vento
dança, insone, o seu bailado:
- revolve o velho aposento
e os segredos do passado.
5
A gata ruiva e bonita
passa toda rebolando;
o garotão logo grita:
- tem "filet mignon" sobrando!...
6
A vida me revigora,
lembranças que tanto amei!
E dos sonhos, junto, agora,
os retalhos que guardei.
7
Belô, mais bela e altaneira,
em teus cem anos de glória,
és raínha e timoneira
de teu povo e de uma história.
8
Canto, alegre, a fortaleza
que sempre cobriu meus passos,
porém escondo a fraqueza
de não contar meus fracassos.
9
Chuva fina nas calçadas
vai regando a minha dor,
que cresce nas madrugadas,
distante do meu amor.
10
Com juras apaixonadas,
compondo sonhos a dois,
brindamos às madrugadas,
num talvez... que vem depois.
11
Em nossos dedos, ternura,
lindo troféu de esplendor;
anel que tem espessura
e o brilho do nosso amor.
12
Entre as dunas da lembrança
a saudade, em fantasias,
deixa areia de esperança
no deserto de meus dias.
13
Entre colinas reinando,
Belô, és sonho encantado:
mulher bonita enfeitando
cem anos de teu passado!
14
Foi tão lindo o sentimento
que nos uniu, sem apelos,
que o luar brindando o evento
prateou nossos cabelos.
15
Hoje a vitória te alcança!
Cuidado, ao virar a mesa,
a vida é imensa cobrança,
num mercado de surpresa.
16
Já nasceste Capital,
traçada em retas iguais;
hoje és linda e magistral,
centenária das Gerais.
17
Lá no alto, bem escondido,
no velho tronco que o enlaça,
um coração esculpido
veste a ramagem da praça.
18
Manhã dourada, sol quente,
nós dois e o sonho que aflora.
Deitados na areia ardente...
Só o amor importa agora!
19
Marido a deixa sozinha...
E, com medo de ladrão,
a beldade da vizinha
chama o gato do patrão.
20
Na balança deste mundo,
pesa mais que seu talento,
ser honesto, ser profundo,
ser direito em pensamento.
21
Na madrugada vazia,
     quando o desprezo me invade,
     teu desprezo me angustia
    num resquício de saudade.
22
Não desanime, trabalhe,
combata o mal, queira o bem...
Pois o bom, mesmo que falhe,
é sempre luz para alguém!
23
Nesta aflição que me cansa,
distante de teu amor,
com timidez, a esperança
tenta acalmar minha dor.
24
Nunca, em tardes de sol-posto,
eu me ponho esmorecida;
rasgo o véu do meu desgosto
e brindo ao sabor da vida!
25
O luar flertando a areia,
cai do céu feliz, por certo,
enamorado vagueia,
cobrindo em prata o deserto.
26
O luar, olhando a areia,
cai do céu, quase desmaia;
em vigília ele vagueia
cobrindo de prata a praia.
27
O tempo não mede espaços,
passa em corrida fatal,
e o trovador, em seus passos,
nunca passa, é um imortal.
28
Passa a noite... raia a aurora...
      Só pensamento enfadonho;
      o teu desprezo se ancora
      na solidão do meu sonho.
29
Recordam tempos passados,
toda magia e ternura,
nossos sonhos enlaçados
no retrato na moldura.
30
Se o seu horizonte brilha,
não se esqueça do irmão pobre,
veja que, na mesma trilha,
passa o humilde e passa o nobre.
31
Sob a névoa, sem ruído,
 juntei meu sonho aos pedaços:
- no véu do tempo, esmaecido,
senti-me presa em teus braços.
32
Tive alegrias e penas,
vi noites e amanhecer,
fui palco de muitas cenas,
na conquista do viver.
33
Transformei em lindo adorno
os ritos do meu sonhar...
Andei, vaguei sem retorno,
me acampei no teu olhar.
34
Um manto em prata orvalhada
acobertou com pudor,
o nascer da madrugada
no seio de nosso amor.

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